segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Vida Canhota

Manhã recém-desperta,
Caminho sob o agouro de uma chuva fina,
Chuva de molhar bobo,
Fico encharcado;
O corte triangular semicicatrizado em minha testa
Boceja, tira as remelas e começa a berrar;
As solas gastas e polidas de meus tênis
Ameaçam me jogar ao chão a cada rua de basalto molhad0,
E elas são a maioria no centro da cidade;
Minha canela
Vestida de inchaço e púrpura
Quer me obrigar a mancar,
Não manco.
Combalido, mas altivo
Ainda sei fingir bem;
E por sorte,
Pela mais genuína sorte,
Dessas que a gente não sabe explicar,
A minha mão quebrada
- sinistro que sou -
Não é a canhota.

obs: sinistro, do latim sinistru, significa esquerdo.

domingo, 27 de setembro de 2009

Padre Atropela Jesus

Aconteceu em São José do Rio Preto. Padre bêbado, com dois "rapazes" no carro, atropela Jesus e não presta socorro, vai ver estava com pressa de dar a bunda pros moçoilos.
Parece que Jesus passa bem. Reportagem abaixo, 26/08/2009

"A Polícia Civil de São José do Rio Preto, no interior de São Paulo, deteve na noite desta segunda-feira o padre Donizete Bianchi, acusado de atropelar dois motociclistas e fugir sem socorrer as vítimas.
O padre teria desrespeitado um sinal de "Pare" na avenida Potirendaba, uma das mais movimentadas da cidade, e batido contras as motos dos auxiliares André Luiz de Jesus, 28 anos, e Devair Ribeiro, que voltavam para casa ao deixar o trabalho numa construtora próxima do local.
Jesus não sofreu ferimentos, mas Ribeiro, com fraturas nas pernas e braços, está internado em estado grave no Hospital de Base, onde passa por cirurgia nesta noite.
Segundo Jesus, o padre fugiu após o acidente e foi parado algumas quadras depois por outros motociclistas que presenciaram o acidente e o perseguiram. Testemunhas disseram que o padre estava bêbado. A polícia apreendeu seis latas de cerveja dentro do Golf do padre.
"Ele estava a uns 80 km/h e não respeitou o 'Pare'. Quando o vi, ele não conseguia nem sair do carro de tanto que estava bêbado", disse Jesus. O delegado João Lafayette Sanches Fernandes, do 5º Distrito Policial, onde foi feita a ocorrência, disse que o padre se recusou a passar por exame de dosagem alcoólica.
Segundo o delegado, o padre, que estava acompanhado por dois jovens, disse que não dirigia o carro no momento da batida e que os motociclistas é que atravessaram o sinal amarelo.
"O problema é que não existe semáforo no local", disse o delegado. De acordo com ele, testemunhas confirmaram que o padre não respeitou o sinal e fugiu sem prestar socorro.
A advogada do padre, Carmem Cury, disse que não poderia prestar esclarecimentos hoje. "Ainda estou na delegacia e o clima está tenso aqui", disse ela.
Não é a primeira vez que o padre tem problemas com a polícia e o trânsito. Ele foi pego em dezembro de 2006, supostamente bêbado, ao chegar na Catedral São José de madrugada.
O padre entrou na contramão e foi parado por uma viatura. Segundo o registro, ao ser parado, ele discutiu com policiais e ainda aproveitou o som alto do carro para dançar uma música do grupo É o Tchan para os PMs, que o levaram para o Plantão Policial."

sábado, 26 de setembro de 2009

Pequeno Conto Noturno (2)

Rubens senta no banco da praça a olhar a padaria defronte e apalpa as moedas em seu bolso, tentando lhes adivinhar o valor e calcular se a somatória chega para uma última cerveja, sabe que tem pouco mais de uma hora até o sol surgir, e o montante parece-lhe o suficiente, desde que a padaria não esteja cobrando bandeira 2 da cerveja, uma prática a se tornar corriqueira nessa maldita cidade de onde ninguém consegue escapar, que é aumentar o preço da bebida da meia-noite às seis da manhã.
E daí voltar ao seu reduzido apartamento; nem sabe como irá achá-lo, nem lembra de como o deixou, somente sabe que encontrará o lençol amarfanhado, o copo sujo na pia ao lado da talha, umas duas ou três contas de luz (senão a energia elétrica já cortada) e um número igual de "recados" de mesma natureza do síndico. Nem sabe se a chave em seu bolso e a fechadura da porta se reconhecerão depois desses três meses.
Dos três meses em que esteve cativo na casa de Marisa.
Fodendo-a incessantemente, fazendo valer cada taça de vinho e copo de cerveja com os quais ela lhe cevava.
E agora Marisa o havia posto fora. Puta injustiça.
Marisa não gozava com o marido e - dizia - gozava de montão com Rubens.
Mas mulher não quer gozar. Isso é mentira!
Mulher quer é exclusividade. E Rubens é um cara até bem exclusivo, em 95% do tempo, digamos.
E de mais a mais quem não cederia àquilo? À vizinha da frente que coincidentemente saía a pôr o lixo sempre que Rubens tinha a mesma ideia? Só de delgada camiseta branca de algodão e calcinha, a vizinha. Quem não capitularia àqueles mamilos em ângulo de 45 graus e aos lanosos pelos pubianos a se esgueirarem delicadamente pelas margens da calcinha? Quem resistiria? Rubens é que não.
Rubens junta as moedas na palma da mão e se levanta. E tudo o que ele mais quer, tudo o que mais deseja fervorosamente nesse momento é que a padaria não esteja cobrando bandeira 2 da cerveja.
Rubens terá de pagar pela sua bebida daqui por diante.
Será uma vida bem mais dura.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

La Luna En Botella

Sempre me pareceu curiosa a relação do ser humano com o objeto garrafa, uma relação de emergência que assume diversos matizes: de esperança (falsa), de salvação (ilusória), de alento (vazio) e outras tantas.
O alcoólatra;
O naufrágo que nela deposita sua mensagem de socorro;
o gênio preso na garrafa cujo destampar premiaria o libertador com três desejos, essa, inclusive, com uma versão tupiniquim, a do saci cativo em uma garrafa depois de colhido de seu redemoinho a golpe de peneira e privado de seu barrete vermelho e encantado, o saci também realizaria tarefas a seu aprisionador em troca de reaver seu barrete;
as lendárias garrafadas medicinais à base das mais variadas e miraculosas ervas, que prometem resolver desde unha encravada até a temida paumolescência.
Vinícius de Moraes já não disse, em alusão ao predicado canino de melhor amigo do homem, que o whisky é o cachorro engarrafado?
Pois então.
Há conteúdos e continentes para todos os gostos, necessidades e perversões.
Madrugada dessas, eu estava a olhar a noite - que poderia estar mais escura não fossem as luzes dos prédios e que poderia estar mais radiante não fosse a falta de um elemento precioso das horas de breu, a Lua.
A danada devia estar em sua fase de Nova, que acho que é a TPM da Lua, período em que ela se resguarda dos olhares das gentes e dos lobos e dos cães.
Foi aí, eu já havia esvaziado algumas garrafas, que me surgiu a ideia. Estapafúrdia. Maravilhosa possível fosse : engarrafar a Lua.
Pô-la a meu dispor em um belo garrafão âmbar, para degustar licorosas doses dela nas noites sem Lua, nos dias sem Lua, nas vidas sem Lua.
A Lua, escrava branca de formas túrgidas, para os olhos de mais ninguém.
Uma Lua portátil de uso particular, impetraria ordem de despejo a São Jorge.
Crueldade? Egoísmo?
Não, nada disso, nada tão dramático assim.
Apenas parte do instinto colecionador do homem, que aprisiona para seu deleite exclusivo tudo o que considera belo, obras de arte em galerias pessoais, livros raros em estantes no porão, pássaros em gaiolas, peixes em aquários, cônjuges em alianças...
E a Lua.
A minha Lua na garrafa, por meu abajur e farol.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Superfícies, Nada Mais

Caras como eu,
Somos empedernidos,
Ressequidos, rochosos.
Não contamos com a possibilidade
De uma remoldagem redentora.

"Mas você mudou", dizem alguns.

Não, não mudei
- Penso comigo, mudo, sem dar trela a maiores delongas -,
Não mudei,
Apenas fui derrotado.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Bertolt Brecht

A TROCA DA RODA 
Estou sentado à beira do caminho.
O condutor troca a roda.
Não gosto de estar lá de onde venho.
Não gosto de estar lá para onde vou.
Por que olho a troca da roda
Com impaciência?

A Arquitetura Da Flor

Tenho recebido, nos últimos tempos, vários e-mails com fotos de Dubai, a exaltar as maravilhas arquitetônicas e urbanísticas da cidade.
Sinceramente, eu acho até bonito e coisa e tal, mas não fico embevecido, embasbacado por tais construções, como fica a maioria das pessoas.
Essa exaltação toda faz parte de um ritual masturbatório intraespecífico, ou seja, é o cara que toca uma punheta em homenagem a ele mesmo, em frente ao espelho e com o dedo enfiado no cu. É a espécie humana glorificando a si própria.
Prédios em feitio de veleiro, ilhas artificiais a imitar coqueiros, montanhas de gelo para a prática de esqui em pleno deserto... nenhum desses prodígios me impressiona ou comove.
Nada supera nem sequer iguala a arquitetura da flor.
E não me refiro ao atributo romântico dado pelo ser humano à flor, presentear com flores na intenção de conseguir outra flor, de aroma menos delicado e néctar menos doce.
Digo do aspecto geométrico e exato da flor, milhões e milhões de anos de evolução criaram o mais perfeito equilíbrio de formas, arcos, ângulos, circunferências e elipses; isso sem dizer - e já dizendo - das infinitas e muito bem dosadas paletas de cores e cheiros.
Dubai é porra nenhuma perto disso, nem dá pra considerar.
A propósito, "Arquitetura da Flor" é o nome do CD mais recente de Francis Hime, parceiro de Chico Buarque nas décadas de 70 e 80. É deles a clássica "Trocando em miúdos".
Se quiser ouvi-la, interpretada pelo Chico, é só dar uma clicadinha aqui, na minha poderosa MARRETA

domingo, 20 de setembro de 2009

Pequeno Conto Noturno

Madrugada, Rubens andava pelas ruas, 3 e meia da manhã, sem rumo. Sem rumo, mas sempre pelo mesmo caminho de quando se punha a andar, a espairecer.
"Ei, rapaz! Dou cinquenta reais pra chupar teu pau."
Rubens olha em direção à voz e a identifica saída de um carro parado ao meio-fio, vermelho, vidros escuros baixados até a metade.
"Olha minha senhora" - uma dona de seus 50 anos, ainda bem garbosa, maquiagem pesada, perfume doce e peitos inflados - "eu só saí para dar uma volta, não quero confusão..."
"DOU CINQUENTA REAIS PRA CHUPAR TEU PAU", a dona elevando a voz.
"Deixa disso, dona. Garanto que meu pau nem vale tanto."
"DOU CINQUENTA REAIS PRA CHUPAR TEU PAU", ainda mais alto, beirando ao escândalo.
Rubens entra no carro, temendo que algum morador próximo resolvesse chamar a polícia.
A dona põe a nota de cinquenta no painel, abre a braguilha de Rubens e abocanha.
Abocanha uma massa mole, borrachenta, que no mesmo estado permanece, alheia à dedicação da dona, que sabia muito bem do ofício.
"Essa porra não sobe ?!?!?!?!?!", fala com metade do pau na boca e torna a engolir tudo, com gana.
Rubens sente os dentes da dona a lacerar seu pau e lhe dá um tapão.
"ENFIM UMA ATITUDE DE MACHO!", urra a dona, transverberada de excitação e com o sangue do pau de Rubens a escorrer dos lábios.
Faz menção de abocanhar de novo. Rubens desfere outro tapa, outro, mais outro e um soco de mão fechada.
Nocauteia a dona.
Ele avisou que o pau dele não valia aquela grana.
Mesmo assim, pega a nota de cinquenta sobre o painel, guarda o pau ensanguentado e sai.
Os cinquenta reais cobrirão os gastos com mercurocromo e nebacetin.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Salvem O Planeta, Mas Não Encham O Meu Sacolão

O mercado onde me abasteço - mantenho meu equilíbrio hídrico, por assim dizer - embarcou também na tal "onda verde", adquiriu consciência ecológica, o mercado.
Passou a comercializar uns sacolões em lona, ou coisa parecida, com o intento de reduzir o consumo daquelas sacolas plásticas usadas para carregar as compras, e anuncia sua "preocupação ecológica" em cartazes gigantes (de matéria plástica) espalhados pelos corredores, com ilustrações de um mundo mais colorido e cheio de borboletinhas. Só ficou faltando o sol sorrindo de óculos ray-ban.
Balela. Patifaria ecológica.
Patifaria de ambos os lados.
De quem vende os tais sacolões - há descontos polpudos nos impostos das empresas que incluem a preocupação ecológica em suas pautas - e de quem os compram, o indivíduo continua jogando lixo nas ruas e passeando com seus automóveis fumadores, mas comprou o sacolão verde, então está contribuindo, então está tudo certo, junto com o sacolão o cara recebe um apaziguador de consciência.
O mesmo mercado, preocupado com o impacto ambiental causado pelas sacolas de plástico, despeja diariamente toneladas de papel nas ruas e nas portas das residências, milhares de panfletos com anúncios de suas ofertas.
E ninguém parece se dar conta dessa brutal contradição. E seguem comprando seus sacolões.
Quer reduzir verdadeiramente o uso das sacolas plásticas?
Fácil, óbvio: deixem de fornecê-las aos clientes às saídas dos caixas.
Eu não tenho nada contra as sacolinhas plásticas, nada mesmo.
Faço bom uso delas, duas por dia para recolher os excrementos das minhas duas gatinhas e mais uma para receptar meu lixo doméstico.
Lixo que, a propósito, não separo para a coleta seletiva, não reciclo, nada disso, ponho tudo num só balaio. E nem quero saber onde isso tudo será jogado.
Assumo minha natureza humana, assumo a índole predadora e parasita intrínseca à minha espécie, estamos aqui para aniquilar, ponto pacífico.
Não tenho preocupação ecológica nenhuma!
Aliás, ninguém a tem.
Eu só não finjo, eu tão-somente admito, não fico por aí comprando produtos "verdes" para aplacar sentimentos de culpa nem tentando lucrar com o remorso alheio.
Em tempo: quero que o Greenpeace, WWF, S.O.S. Mata Atlântica e assemelhados (não esquecendo do mercado onde me abasteço) vão todos às respectivas putas que os pariram.

sábado, 12 de setembro de 2009

Mais Uma Noite Dos Demônios

Hoje, a noite está indócil, barulhenta, desacomodada;
há nódulos nos músculos, há eletricidade estática pelo ar,
dessa que atrai nossos pelos quando aproximamos o braço da tela da tv;
há zumbidos de pernilongos (ou da consciência) que não conseguimos matar,
há o sono que não conseguimos pôr em arapuca,
e, logo, o nascer do sol que não conseguiremos abortar;
essa será mais uma noite dos demônios,
dessas onde a saída é caminhar, caminhar
e caminhar...
todavia a saída está fechada,
me embebedo,
deito,
e torço pro demônio não me achar.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Gosto Muito De Te Ver, Leãozinho

Não acredito nessas coisas de vidas passadas.
Mas fiz, dia desses, a título de curiosidade, uma regressão hipnótica.
Descobri que eu já vivi na Roma Antiga, no auge do gládio, do Coliseu.
E não vou mentir aqui que tenha sido algum imperador, senador, conselheiro, gladiador laureado ou centurião de mil conquistas.
Fui um cidadão dos mais comuns, meu nome não figura em nenhum registro da época, mas eu era um cidadão extremamente feliz com minha humilde profissão, anonimamente feliz.
Eu fui um criador de animais e os fornecia diretamente ao Império.
Eu fui um criador de leões, criava leões para que cristãos fossem jogados a eles, fui o abastecedor oficial de leões do Coliseu, criava panteras e tigres também, mas os leões sempre foram meus prediletos.
Alugava-os para cada espetáculo, um gigolô de leões, ganhava uns bons denários e sestércios com isso. Tinha uma dedicação sacerdotal ao meu ofício. Mantinha os bichinhos sempre muito bem escovados, sem carrapatos, jubas de brônzea cintilância, e famintos, famélicos.
E como descrever a cara de satisfação dos bichinhos quando retornavam a mim, narizes e bigodes rubros e doce-ferruginosos de sangue cristão? Vinham-me dóceis e gratos gatinhos e eu os abraçava quase a chorar de orgulho, orgulho pelos meus meninos.
Esmerava-me em meu labor.
Contudo já viram, né?
Entra vida, sai vida, vai encarnação, vem reencarnação, e uma coisa não muda em mim : sou de uma incompetência profissional absoluta, minha dedicação nunca supriu minha falta de talento.
Não veem nesse caso? Que, inclusive, foi um dos motivos da queda do Império Romano?
Faltaram leões.
Não dei conta do recado, não dei conta da demanda.
Não consegui - desgraçadamente - criar leões em quantidade suficiente, não consegui criar leões na justa medida.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Dia Nacional Da Marcha Para Jesus

Primeiro e antes de tudo, quero que Cristo se foda.
Aliás, ele já se fodeu. Mas não tanto quanto quem nasceu depois dele ao lado ocidental desse mundo desgraçado.
Cristo foi nada mais que um bêbado esperto, cheio de chinfra, cheio de balacobaco, que chegava nas tavernas e contava umas historinhas pro povo, que estava sempre disposto a pagar suas despesas; o povo sempre está disposto a pagar as despesas de quem pensa mais que eles (de onde vocês acham que nasceram os políticos?).
Bêbado tão esperto que até água em vinho ele transformou. Será?
Porra nenhuma! Outro 171 do barbudo.
Ele pegou uns barris velhos, abandonados, cheios de mosto ressecado, pôs água e sacudiu, só isso (se você não sabe o que é mosto, que se foda, pesquise).
O cara - Cristo - não era muito chegado ao batente, tanto que fugiu de casa quando José quis lhe impôr o ofício de carpinteiro. Eu também teria fugido, José é o santo padroeiro dos cornos, chato como todo corno.
Cristo foi brilhante em sua fuga: peregrinar pelo mundo atendendo ao chamado do Pai. Brilhante, esse menino Cristo.
O meu "céu" seria um bar, e eu tomando todas com Raul, Bukowski e Cristo. Os quatro rindo da humanidade. O garçon bem que podia ser Lúcifer.
O foda nem foi o que Cristo disse por aí em troca de bebida e antepasto, o foda foi o que o filho da puta do Pedro fez com isso.
Cristo fazia pra si mesmo e seus chegados, coisa pequena. Pedro mercantilizou. Grande filho da puta, esse Pedro.
E agora reservam um dia para marchar por Cristo.
E vejam quem: "bispo" Crivella, casal Hernandes da Igreja Renascer, regresso ao Brasil após cumprir sentença por entrar nos EUA com 56 mil dólares não declarados, acusados lavagem de dinheiro, estelionato e formação de quadrilha (detalhe: parte do dinheiro contrabandeado estava no fundo falso de uma bíblia) e Lula a dar sua chancela.
Tudo gente boa. Todos preocupados com a espiritualidade da população.
Mefistófeles e Paulo Maluf devem estar deprimidos, acabrunhados, morrendo de inveja.
Se ao final da tal marcha para Cristo haver um gólgota para pregar cada cristão e deixá-lo lá a desidratar feito charque, vou mudar de profissão: passarei o ano todo a fabricar cruzes para pregar esses filhos das putas.
E, para não dizerem que não tenho espírito caridoso e cristão, só cobrarei a cruz.
Os pregos e as marretadas sairão de graça.

domingo, 6 de setembro de 2009

Síndrome de Belchior

Acredito que todos - ou quase - tem uma estratégia de fuga guardada em algum lugar, uma fantasia de sumir no mundo, e do mundo, quando as agruras pesarem sem remédio.
Eu - e nisso sou como a maioria - também tenho a minha, que nem é das mais originais.
Vejo-me evadido do mundo no cimo de uma serra gelada, numa casa de toras de madeira à Daniel Boone (alguém lembra?), tosca e rústica, mas sem que isso impeça uma calafetação, água encanada, energia elétrica. Até porque não estaria fugindo de um certo conforto e comodidade, estaria fugindo da humanidade, pura e simplesmente.
Exoneraria-me do meu cargo, encerraria contas em bancos, tiraria o nome dos talões de água, luz, IPTU, cartões e documentos dos mais variados, órfão do mundo.
E viveria de produzir vinhos, pães e queijos, para consumo próprio e para pequenos escambos com outros víveres, realizados na cidadezinha ao pé da serra, distante, muito distante, eu a avistando por entre brumas e ela nem desconfiando da minha existência.
Receberia escassas visitas, poucos e seletos amigos e poucas e seletíssimas amigas, que nem só de vinho, pão e queijo vive o homem.
Tenho esse plano de escape há muito tempo, acho que desde os meus vinte e poucos anos.
Claro que nunca se tornará real, mas pensar em sua possibilidade quando o dia se mostra mais carrancudo, dá um certo alento.
Mas até isso - a possibilidade de uma ilusão -, essa sociedade globalizada, esse mundo Orwelliano está nos tirando.
Vejamos o caso desse rapaz, o Belchior.
Músico, pintor e, principalmente, poeta. Dos bons, dos verdadeiros.
O cara resolveu sumir, deixar o mundo para trás, escondeu-se lá numa cidadezinha uruguaia de pouco mais de 2 mil habitantes. E não foi, como pensam os mais rasos de alma, das dívidas que ele fugiu. Tenho plena certeza de que não. Belchior fugiu da civilização, e de todos os seus danosos efeitos colaterais.
Fugiu? Fugiu porra nenhuma.
Armaram um esquema de busca, mobilizaram o país para acabar com o sossego do cara.
Torci fervorosamente para que não o encontrassem, mas, já viram, né?, sempre fui um puta dum pé-frio.
A TV Globo achou o cara, eu não vi a reportagem, mas quem viu me disse que ele não estava com semblante dos mais animados. Também pudera. Primeiro porque ele nunca foi das pessoas mais otimistas, basta ouvir algumas de suas letras (sugiro "A palo seco"), e nem é pra menos, ele é pensante, isso tira qualquer chance de otimismo; e segundo, quem poderia ficar animado ao estar lá tranquilo e sossegado e, de repente, ver irromper a bichona do Zeca Camargo pela sua porta?
Não poder nem mais encetar um tentativa de fuga...
Comecei a me sentir mal, ficar ruim, a me dar uma ansiedade, uma falta de ar, um peso nos pés, na cabeça, um travar de mãos, uma claustrofobia ainda que em espaços abertos.
Estamos diante do advento de um novo transtorno psicossomático.
Requeiro desde já o seu batismo, esse ninguém tasca: Síndrome de Belchior.

*se quiserem ouvir Belchior em "A palo seco" é só dar uma clicadinha na minha Marreta

Mais Bukowski

uma palavrinha sobre os fazedores de poemas rápidos e modernos


é muito fácil parecer moderno

enquanto se é o maior idiota jamais nascido;

eu sei; eu joguei fora um material horrível

mas não tão horrível como o que leio nas revistas;

eu tenho uma honestidade interior nascida de putas e hospitais

que não me deixará fingir que sou

uma coisa que não sou-

o que seria um duplo fracasso: o fracasso de uma pessoa

na poesia

e o fracasso de uma pessoa

na vida.

e quando você falha na poesia

você erra a vida,

e quando você falha na vida

você nunca nasceu

não importa o nome que sua mãe lhe deu.

as arquibancadas estão cheias de mortos

aclamando um vencedor

esperando um número que os carregue de volta

para a vida,

mas não é tão fácil assim-

tal como no poema

se você está morto

você podia também ser enterrado

e jogar fora a máquina de escrever

e parar de se enganar com

poemas cavalos mulheres a vida:

você está entulhando a saída- portanto saia logo

e desista das

poucas preciosas

páginas.