sábado, 28 de junho de 2014

Mimetismos (9)

Bela foto! Quem emula quem? A borboleta camaleoneia o camaleão, ou o camaleão, em posição de casulo, pretende emergir lepidóptero, dragão?
Lembrou-me o célebre O Conto do Sábio Chinês, magistralmente adaptado - mimetizado - em canção por Raul Seixas, um dos grandes camaleões da música brasileira.
O Conto do Sábio Chinês
(Raul Seixas)
Era uma vez
Um sábio chinês
Que um dia sonhou
Que era uma borboleta
Voando nos campos
Pousando nas flores
Vivendo assim
Um lindo sonho...


Até que um dia acordou
E pro resto da vida
Uma dúvida
Lhe acompanhou...


Se ele era
Um sábio chinês
Que sonhou
Que era uma borboleta
Ou se era uma borboleta
Sonhando que era
Um sábio chinês...

sexta-feira, 27 de junho de 2014

Pequeno Conto Noturno (42)

É vodka o que rola hoje. Vodka e gelo siberianos com coca-cola ianque. A esta mistura, a este drink, como diriam os mais viadinhos, Rubens batizou de "Guerra Fria", o melhor tratado de paz que dois mundos, depois de décadas de litígio e delicado equilíbrio de poder, puderam estabelecer, a maior herança que puderam legar : álcool de cereais e propaganda de falsa felicidade engarrafada ou enlatada, embotamento e um iluso modo de vida como meta da existência. Pouco mais que isso é necessário para manter o domínio do planeta.
Rubens vem com dois Guerras Frias da cozinha : bem fraco o destinado a Isadora, praticamente fogos de artifício, não a quer ainda fora de combate; quase nuclear o seu, um megaton, que Rubens sempre achou mais bonito o brega Kremlin que a clean e impessoal Casa Branca.
- Esta deve ser o quê, a nossa terceira ou quarta ... - começa Isadora
- A quarta. Nossa quarta vez - Rubens ajudando-a em sua contabilidade.
- E isso num tempo de o quê, dois ou...
- Três. Praticamente três meses.
- E acha isso normal?
- Para mim, sim. Vejo pouco meus amigos.
- Amigos ?!?! Então, é isso que eu sou, uma amiga com quem você trepa, às vezes?
- Não sei porque você coloca a situação de forma tão depreciativa.
- Não? Nem desconfia, mesmo?
- Dá aqui seu copo, esse já era, vou reabastecer.
E Rubens caminha para a cozinha. Não para ganhar tempo e pensar no que responderá à Isadora, mas para respirar fundo, ganhar paciência para lhe explicar, o que nenhuma delas entende. Pelo canto do olho, percebe que Isadora, antes totalmente nua, exposta e largada na cama, sentou-se e puxou o lençol à cintura. Decide "carregar" um pouco mais na Guerra Fria de Isadora desta vez, ela estava se tornando indócil.
- Olha - começa Rubens, tomando um bom gole - quando eu quero, por exemplo, relembrar velhas músicas, filmes, livros e gibis, percorrer uns sebos da cidade, ligo pro Marcão, que lembra tudo do entretenimento das décadas de 80 e 90, mas que, por outro lado, não põe uma gota de álcool na boca, o Marcão; se eu quero sentar na mesa de um boteco, encher a cara, falar um monte de besteiras, ligo pro Hamilton, que não sabe a diferença entre o Arqueiro Verde e o Gavião Arqueiro, que acha que o Namor e o Aquaman moram na mesma cidade, mas que é um bom e firme copo, um fiel companheiro de ressacas, de festas e funerais. Quando eu vou a um sebo de livros antigos com um, o outro não se ofende, não fica com ciúmes; quando vou ao buteco com o outro, o um também não está nem aí, não fica com cobranças.
- E eu sou a amiga que você chama quando quer trepar, quando só uma punheta não resolve - e Isadora dá uma emborcada maior que a de Rubens, praticamente liquida o copo numa única talagada. De raiva.
- Continua colocando a coisa de uma forma torpe e distorcida.
- Torpe é a puta que te pariu! E pega outra dessa merda pra mim. Sem gelo.
Outra dose, muito mais cossaco que confederados, chega às mãos de Isadora, que entorna.
- Então, tá combinado, é quase nada, é tudo somente sexo e amizade? De quem é mesmo esta merda?
- Do Ritchie. Dele, gosto mais de "A vida tem dessas coisas", perdi a hora, mas encontrei você aqui. E como assim, somente sexo e amizade? Há algo que melhor se completem e justifiquem? Esferas que melhor se interseccionem?
- Me parece que você não pretende mudar essa situação, né? - Isadora, notando a potência da nova bebida e indo mais devagar; pretende abrir as pernas pra Rubens mais uma vez, ainda hoje,  mas não ainda, não vencida.
- Olha - prossegue Rubens em sua peroração -, eu sou capaz de manter uma amizade por décadas, já um namoro... e eu quero que você fique por um bom tempo.
- Sei, é melhor pra mim, né? Tá me cheirando ao típico canalha bonzinho.
- Posso ser o bonzinho canalha. Prefere?
- E é só o que você tem a oferecer no seu menu?
- Sou homem de precários dotes culinários.
Isadora ri, a bomba A foi desarmada; não obstante, seu poderio permanece incubado. Rubens ri também, vai na onda de Isadora, aproveita para aproximar-se
- Rubens... por acaso você vai me comer de novo agora?
- Acho que ainda preciso de uns minutos.
- Então para de brincar com meus mamilos.
- Me empolguei, me distrai...
- Sei... pega outra dose pra mim...
- A vodka já era - grita Rubens da cozinha -, vai de rum?
- Até querosene, se for só o que tiver. - E Isadora volta a se descobrir, a embriaguez lhe afogueia as faces, o peito, a bacurinha.
- E você não acredita mesmo em amizade sem sexo entre um homem e uma mulher?
- Só se um for gay. E se a amiga é que for sapata, o cara vai continuar pensando que um dia ainda come.
- Eu tô falando sério...
- Acredito, acredito sim. Com aquelas amigas que não me atraem sexualmente, ou com aquelas a quem eu não atraio da mesma forma, ou quando os dois têm interesses em trepar, mas imperativos ainda maiores se interpõem entre os dois nada pequenos querer e poder.
- E o que pode ser mais imperativo que o querer e o poder?
- O dever.
- E já aconteceu de? Uma amiga se sentir atraída por você e você não?
- Sim, poucas vezes, mas sim.
- E?
- Ela sofria.
- E de você querer transar com uma amiga e ela não?
- Sim, várias vezes.
- E?
- Eu sofria.
- E algum caso do dever empatando a foda do querer e poder?
- Sim.
- Aí os dois sofriam?
- Resignavam-se. Que é uma forma covarde de sofrimento.
- E quando tudo era recíproco? Os dois tinham tesão um no outro e o querer desembocava no poder? Se eu estou aqui...
- Íamos pra cama, durante um tempo. Depois, sofríamos.
- Do jeito como fala, parece que as relações entre as pessoas, seja a amizade, os amores, o sexo, são só protelações para o sofrimento, que, inevitável, virá.
Os dois calam instantes. Fazem escorrer pelo esôfago mais um licencioso e quente trago de rum e Isadora é que traz as palavras de volta.
- Acha mesmo que tudo deságua e acaba em sofrimento?
- E não é precisamente disso que estamos aqui a falar, o tempo todo?

Se Correr, o Bicho Pega... (Ou : Oroboros; Ou : a Síndrome de Kekulé)

- Como vai a vida, meu caro?

- Como vai a morte?, seria a pergunta mais oportuna e adequada.
Se não a morte clínica, oficial
A que enche de burocracia o legista,
Ao menos
A morte que é a do olhar que só olha
A da inércia dos gases nobres
A da indiferença dos cistos
Dos hibernantes.
Se não a morte da foice
-Vestida de cetim -,
A subexistência dos bonecos de cera.

- Deixa de viadagem, que você tá precisando é de tomar umas, vamos lá.

Brindam.

- E então, meu caro, como vai a morte?

- Um arremedo mal cerzido da vida.

segunda-feira, 23 de junho de 2014

Bíblia, o Livro da Família

Aí estão, mãe e filha, provavelmente, em sua prosaica leitura dominical, louvando o nome de Deus, nutrindo e restaurando seus espíritos conturbados com a palavra Dele, embevecidas e extasiadas diante de tanto conhecimento e bons valores.
"Lá ela cobiçou seus amantes, cujos órgãos genitais eram como os de jumentos e cuja ejaculação era como a de cavalos."

domingo, 22 de junho de 2014

Maradona, El Dedo de Dios

Estádio Azteca, Copa do Mundo FIFA de 1986 : após o zagueiro inglês Steve Hodge chutar a bola para o alto, Maradona correu na direção do goleiro Peter Shilton, pulou e jogou a bola por cima do adversário, vinte centímetros mais alto que ele. Com a mão, com o punho cerrado. O árbitro tunisiano Ali bin Nasser validou o gol , revoltando todo o time inglês.
Ao final do jogo, questionado sobre se tinha feito o gol com a mão, Maradona assim respondeu: “Lo marqué un poco con la cabeza y un poco con la mano de Dios”.
Foi o que bastou : o gol histórico de Maradona - e por que não dizer a façanha do argentino - recebeu um nome próprio e assim consta até hoje nos anais das Copas do Mundo : La Mano de Dios.
E a justa e implacável La Mano de Dios interveio em outras ocasiões em prol de Dieguito : no campeonato italiano de 1984-85, contra o Udinese de Zico, Maradona também já validara um gol dessa forma; na Copa do Mundo de 1990, na Itália, Maradona não marcou um gol, mas impediu, com La Mano de Dios, um gol da extinta União Soviética, e o árbitro sueco Erik Fredriksson também não viu nada.
Agora, mais de duas décadas depois, Don Diego Maradona volta a se valer de La Mano de Dios, ou, ao menos, de uma parte dela, de um certo dedo específico, o do meio.
Provocado por Humberto Grondona, filho do presidente da AFA (Associação de Futebol Argentino), que trouxe à baila a fama de pé-frio atribuída a Maradona, o craque ficou fulo da vida e, filho da puta como só ele, um filho da puta no melhor dos sentidos, um filho da puta genial, mostrou o dedo médio para as câmeras da tv.
É El Dedo de Dios!!!
Humberto Grondona, em seu twitter, disse que o gol de Messi só aconteceu porque, alguns minutos antes, Maradona havia se retirado do estádio. Grondona disse ainda que Maradona torce contra a Argentina. 
"Pobres estúpidos. O gol foi mérito de Messi, não tem nada a ver comigo", reclamou o ex-jogador, em seu programa deste sábado, 21/0.
E antes do gesto que só fará aumentar ainda mais a sua lenda, Maradona mandou um recado ao seu detrator : "o que eu estou usando, paguei com meu dinheiro. A Fifa não me deu nada". E na sequência, tão rápido quanto um pistoleiro do velho oeste, sacou de seu dedo médio e o disparou, rápido e certeiro.
Romário, craque brasileiro das antigas, daqueles que coçavam o saco em campo e cuspiam no chão, tão modesto quanto Maradona, proferiu certa vez : ''É o que eu sempre digo, Deus apontou um dedo para mim e disse: Esse é o cara'' 
Barack Obama, durante um aperto de mãos com o ex-presidente Lula, olhou para o primeiro-ministro da Austrália, Kevin Rudd, e disse, apontando para Lula: "Esse é o cara! Eu adoro esse cara!".
Tanto Romário quanto Obama estão equivocadíssimos!!!
Maradona é o cara!!!
A Romário, Deus pode até ter apontado um dedo - e decepado um de Lula -, mas foi para Maradona que Deus cedeu a própria mão.

Cepas Mutantes

A poesia
Em mim
Ataca em períodos curtos
Em surtos.
De malária
De dengue
Em pandemia de peste.

A poesia
Em mim
Musa a saquear-me
A deixar-me anêmico
De sangue e sêmen
Nômade a levantar acampamento
Quando minhas palavras descarnadas
Não conseguem pantografar
Sua vaidosa autoimagem.
Quando eu
Mero espelho
Me confundo
Me embaralho em meus pixels
E não produzo a imagem que lhe apraz.

A poesia
Em mim
Aconchega-se em minha cama
Em minhas cobertas
Em meu pau
Quando gordo antepasto lhe pareço.
Vai-se embora de madrugada
Sem recado nem bilhete
Quando lhe apresento
Minhas famélicas mandíbulas
Meu príapo sequioso de suas entranhas
De seus esgotos.

A poesia
Em mim
Chega em recidivas
Diva cheia de quereres
Infecta
Rói, corrói
Debelo-a
E ela se vai.

A poesia
Em mim
Volta
Madalena arrependida
Puta desvalida
Smpre disfarçada
Diferente de dantes
Chega-me em recaídas
Em cepas de vírus mutantes
Infecta
Rói, corrói
Debelo-a
E ela se vai

E volta
E se vai
E volta
E se vai.

A mim
Só resta manter a paciência
Só resta manter minha porta destrancada.
A mim
Só resta conservar-me vivo
(À espera dela)
Enquanto estiver saudável.

Células Obedientes

Tive que matar meu desejo
Pelo proibido
Pelo inalcançável.
O pelo convencionado, pelo acessível
Perdeu-se também.
Como célula saudável
Que támbém é desintegrada
Pelo bombardeio de cobalto radioativo
Despejado sobre as cancerosas.

Mortas as duas
Compreendemos
Tardia e irreversivelmente
Que o verdadeiro cancro
Eram as células que bem se dividiam
Que obedeciam cordeiras
Às fascistas leis da mitose.

Qual a Palavra Que Se Escreve Com a Pena Emprestada?

Ela era estrume úmido e quente
Para o besouro que ele sempre fora:
Encouraçado, criptografado.

Ela era manteiga de cacau
Para as rachaduras dolentes
Para as fissuras uivantes
Que ele,
Com eterna alma invernal,
Cuidara sempre de cultivar.

Ela era.
Desistiu-se.

Ele continuou-se.
Lábios fendidos
E perene nevasca íntima.

quinta-feira, 19 de junho de 2014

A Argentina é Campeã !!!

E vocês ainda vão torcer pra quem mesmo? Pro Neymar?
"Pra beijar a menina e levar a saudade
Na camisa toda suja de batom..."

Carta de Bukowski Aos Seus Detratores

Em 1985, após a reclamação de um leitor, a Biblioteca Pública de Nijimegen retirou de suas prateleiras o livro de contos de Bukowski intitulado Fabulário Geral do Delírio Cotidiano (em inglês, Tales of Ordinary Madness), sob a declaração de a obra ser “sádica, frequentemente fascista e discriminatória contra certos grupos (incluindo homossexuais).”.
Perguntado pelo jornalista Hans van der Broek sobre a censura de sua obra, o velho Buk lhe remeteu uma carta a respeito. A carta, ao contrário do esperado, não é um soco de um boxeador peso-pesado, não é aquele direto de direita que arranca do adversário sangue, dentes e a consciência; a carta é um tapa com luva de pelica, um primor de sobriedade, sobriedade que só os verdadeiros bêbados possuem, uma aula de esgrima verbal, com um sublime e indefensável touché no coração dos idiotas hipócritas, dos politicamente corretos.
Faço minhas palavra por palavra, vírgula por vírgula de Bukowski e as lanço feito lança a todos idiotas politicamente corretos metidos a censores. O polticamente correto é aquele sujeito totalmente desprovido de criatividade ou de qualquer outro talento, incapaz de escrever uma linha sequer de pensamento próprio, é aquele cara que, na época da escola, fazia parágrafo de três dedos e aumentava o tamanho da letra para conseguir preencher as 20 linhas mínimas da redação, é aquele cara que nunca conseguia acompanhar o ditado da professora, é o cara que carregava o material da "tia", que levava maçã para ela, que se oferecia para apagar o quadro-negro, é o cara que dedurava o coleguinha que estava a conversar ou a colar na prova.
O politicamente correto não só não sabe escrever - e por isso odeia os que, bem ou mal, o fazem -, ele também não sabe ler. E nem digo dele saber ler um jornal ou uma revista que não sejam sobre futebol ou fofocas da tv, digo dele não saber ler o mundo ao seu redor. Um analfabeto olha para um texto e nada entende, precisa de alguém que leia para ele, e vai acreditar no que lhe disserem; mais que isso, vai comprar e passar a defender, daí em diante, igualmente às palavras que lhes foram lidas, a interpretação dada ao texto por quem o leu. 
O politicamente correto olha para o mundo, para a realidade a lhe feder nas fuças e nada entende dele e, portanto, não o percebe, precisa de alguém que leia o mundo para ele, que lhe diga como as coisas funcionam e devem ser, e vai acreditar no que lhe disserem, vai comprar e passar a defender, daí em diante, igualmente às palavras que lhes foram ditas, a interpretação de mundo de quem o leu para ele.
E muitos são os que "leem" o mundo para o politicamente correto : a Bíblia e todas as religiões, os livros de História, Sociologia, Educação Moral e Cívica etc do ensino fundamental, a grande mídia de massa, os conglomerados televisivos e seus telejornais tendenciosos, suas telenovelas, seus sabadões e domingões.
Tudo o que o politicamente correto "sabe" já lhe chegou pronto, adquirido em embalagem colorida e brilhante na prateleira de um supermercado : "saber" solúvel, desidratado e de fácil digestão, ao qual basta acrescer água e aquecer.
Por isso, quando algo diferente do que "sabe" cai à sua frente, o politicamente correto fica puto, possesso. Não porque concorde ou não com o diferente, na verdade, ele nem chegou a pensar sobre, e nem chegará a, faltam-lhe algumas dezenas de pontos em seu Q.I. para tal, ele só sabe que é diferente e, então, esse reprovado na cartilha Caminho Suave do mundo reage à estranheza com a única arma que tem : a censura, o mandar calar a boca.
O politicamente correto não quer um debate de ideias, ele não está nem aí para as ideias dos outros, só não quer que elas apareçam à sua frente, ele só não quer se sentir incomodado em suas certezas, só não quer ter que processar novas informações, ele só quer continuar a ver o mundo de uma única maneira, quando múltiplas existem. Chamem o politicamente correto ao pensamento e ele os processará, os mandará para a fogueira.
Os politicamente corretos, como diz Buk em sua carta, "são pessoas pequenas, amargas, os caçadores de bruxas e os que pregam contra a realidade”
São caçadores de bruxas motivados pela inveja de não serem bruxas, por não serem possuidores de seus encantos, sortilégios e poções, por não saberem o que é voar em uma vassoura, madrugada afora, com a Lua cheia ao fundo.
Abaixo, a carta do velho Buk :

“22-07-85

Caro Hans van der Broek: 
Obrigado pela sua carta me contando que um de meus livros foi tirado da livraria de Nijimegen. E que ele é acusado de discriminação contra negros, homossexuais e mulheres. E que ele é sádico por causa do sadismo. 

As coisas cuja discriminação eu temo são humor e verdade. 

Se eu escrevo coisas ruins sobre negros, homossexuais e mulheres é porque aqueles que conheci eram assim. Há muitos ‘maus’ – maus cachorros, má censura; há até ‘maus’ homens brancos. Apenas quando você escreve sobre “maus” homens brancos eles não reclamam a respeito. E eu preciso dizer que há ‘bons’ negros, ‘bons’ homossexuais e ‘boas’ mulheres? 

Em meu trabalho, como escritor, eu apenas fotografo, em palavras, o que vejo. Se eu escrevo sobre ‘sadismo’ é porque ele existe, eu não o inventei, e se algo hediondo ocorre em meu trabalho é porque tais coisas acontecem em nossas vidas. Não estou do lado do mal, uma vez que algo como o mal existe em abundância. Em minha escrita eu nem sempre concordo com o que acontece, muito menos me arrasto na lama puramente por sua causa. Também, é curioso que as pessoas que fazem críticas a meu trabalho parecem ignorar seus trechos que falam de alegria e amor e esperança, e tais trechos existem. Meus dias, meus anos, minha vida tem visto altos e baixos, luz e escuridão. Se eu escrevesse só e continuamente sobre a ‘luz’ e nunca mencionasse os outros, então como artista eu seria um mentiroso.

A censura é a ferramenta daqueles que precisam esconder realidades de si próprios e dos outros. Seu medo é apenas sua incapacidade de encarar o que é real, e eu não posso descarregar ódio nenhum sobre eles. Eu apenas sinto essa tristeza aterradora. Em algum lugar, em sua criação, eles foram protegidos contra os fatos totais de nossa existência. Eles foram ensinados a olhar de apenas uma maneira, quando muitas maneiras existem.

Eu não fico alarmado que um de meus livros tenha sido caçado e desalojado das prateleiras de uma biblioteca local. De certa forma, estou honrado por ter escrito algo que tenha acordado essas pessoas de suas profundezas inertes. Mas me machuca, sim, quando o livro de alguma outra pessoa é censurado, pois aquele livro geralmente é um grande livro e há poucos como aquele, e através dos tempos aquele tipo de livro frequentemente se tornou um clássico, e o que uma vez foi chamado de chocante e imoral é agora uma leitura obrigatória em muitas de nossas universidades. 

Não estou dizendo que meu livro seja um desses, mas estou dizendo que, em nosso tempo, nesta época, quando qualquer momento pode ser o último para muitos de nós, é irritante e absurdamente triste que ainda tenhamos entre nós as pessoas pequenas, amargas, os caçadores de bruxas e os que pregam contra a realidade. Ainda assim, eles também estão conosco, eles são parte do todo, e se eu não escrevi sobre eles, eu deveria, talvez o tenha feito aqui, e isso basta. 

Que todos nós fiquemos melhores juntos,

seu,

(Assinatura)

Charles Bukowski”

quarta-feira, 18 de junho de 2014

A Insônia é Uma Camponesa de Tetas Grandes

A insônia não é má
Não é vilã
Não é malsã.
A insônia é um alerta
Contra a pouca vida desperta
Contra a aridez
Contra a miragem deserta.
A insônia é uma camponesa suíça
De faces coradas
De tetas grandes
A oferecer sua buceta de quatro num monte de feno.

Mas preferimos o sono irrefreável
O calmante, a tarja preta, o álcool
O fim de noite em frente à TV
A broxidão.

O sono irrefreável é a sentença de prisão perpétua
É a pena de morte
A injeção letal
A bala na nuca
A guilhotina no pau.

O sono irrefreável é o cansaço e a capitulação da insônia
(tantas você fez que ela cansou, porque você, rapaz, abusou da regra três)
É a bengala do cego
É o desenganar do médico.
O sono irrefreável
É a eutanásia do ego.

terça-feira, 17 de junho de 2014

Verde-Amarelo Bissexto

Bandeiras nos carros
Nos postes
No asfalto 
Nas vitrines das lojas
Nas crianças :
Estrelas sob o maleitoso e lombriguento sol tropical.
A baderna, a falsa cordialidade
O caos analfabeto
Pardo e desdentado
A escarrar na Ordem e no Progresso.
Bandeiras nas bundas
- alguns cus até que bem traçáveis -,
Nos peitos
- alguns até que suculentos, balouçantes, até que bem mamáveis -,
Mas o verde-amarelo quadrienal é que fode tudo,
É o patriotismo de quatro em quatro anos,
O patriotismo dos que andam de quatro é que me derruba :
O verde-amarelo bissexto é que me broxa.

O Verdadeiro Efeito Dominó

domingo, 15 de junho de 2014

Pequeno Conto Noturno (41)

Algumas dezenas de bucetas,
Um ou outro mais descuidado cu.

Seis ou sete paixões atrozes,
Duas paixões algozes,
Apenas uma albatroz : Ela.

Com Ela
A Lua
(ainda que tímida)
Nunca se esvaziaria
A noite
(ainda que acordada)
Nunca seria em claro
A folha
(ainda que sem pauta)
Nunca ficaria em branco.

A tristeza nunca mais teria alegria
O repetido seria raro
A ressaca jogaria no time reserva, só esquentaria o banco.

Com Ela
- Rubens tem certeza -
Tudo poderia ter dado certo...

Por isso, não deu.

sábado, 14 de junho de 2014

Homens São de Ma(o)rte

E não é que faz sentido?

A Pitty Sempre me Deixa de Boca Aberta

Pitty faz um rock básico, direto, honesto. E isso é tudo o que o rock tem que ser, é tudo ao que ele sempre se pretendeu : básico, direto, honesto.
Rock progressivo, sinfônico... Merda, tudo merda. Ou, se não merda, também não rock, pura enganação.
Pitty goza de prestígio entre os rockeiros da velha guarda, já ouvi Marcelo Nova e Roberto Frejat - que não são bobos nem nada, que além de rockeiros também são machos das antigas - tecerem grandes elogios à arretada Pitty.
Não bastasse, Pitty é gostosa, gostosíssima!!!! Pitty é para ver e ouvir!
Ela lança agora seu novo CD, Sete Vidas, o quarto de sua carreira solo, em cujas faixas mantém a mesma linha, a mesma qualidade de sempre. A canção carro-chefe é a que dá o título ao CD e que, como sempre acontece, não é a melhor do disco, é legalzinha, mas longe de ser a melhor. Muito superiores à Sete Vidas são as Pequena Morte, A Massa e Boca Aberta, sobretudo esta última, cuja letra reproduzo a seguir. Essa é a Pitty, sempre  me deixando de boca aberta. Você também não fica? Rock é isso : guitarras sujas, voz rouca de travesseiro, pernas e roupas de couro.
Boca Aberta
(Pitty)
Êta alma, buraco sem fundo
Que se vive tentando preencher
Com deuses, com terapia
Cartão de crédito, academia
Um trago, carros velozes
Carinhos fugazes, manhãs atrozes
Em incríveis e intermináveis noites
Da mais besta e vã alegria

E é sempre essa boca aberta
Tragando tudo pelo caminho

De tudo que se aproveita
De tudo só quero o agora
Amanhã acordo e resmungo
Eu quero minha vida de volta

Êta alma, buraco sem fundo
Que se vive tentando preencher
Com corpos, com copos, com credos
Amigos ternos, amores cegos
Com beleza ou poesia
Aquela penumbra que anuncia o dia
E faz o ontem deixar de ser

E é sempre essa boca aberta
Tragando tudo pelo caminho

De tudo que se aproveita
De tudo só quero o agora
Amanhã acordo e resmungo
Eu quero minha vida de volta

De tudo que se aproveita
De tudo só quero o agora
Amanhã acordo e resmungo
Eu quero minha vida de volta

Minha vida de volta
Minha vida de volta
Minha vida de volta

E é sempre essa boca aberta
Tragando tudo pelo caminho

quinta-feira, 12 de junho de 2014

Onde o Brasileiro Gosta de Sentar o Seu Cu?

Trecho da famosa carta deixada pelo imperador Vespasiano (41 dC) a seu filho Tito (79 dC), na qual, mais que um império, lega a Tito dicas valiosíssimas de como governar as massas.
22 de junho de 79 d.C.
"Tito, meu filho, estou morrendo. Logo eu serei pó e tu, imperador. Espero que os deuses te ajudem nesta árdua tarefa, afastando as tempestades e os inimigos, acalmando os vulcões e os jornalistas. De minha parte, só o que posso fazer é dar-te um conselho: não pare a construção do Colosseum. Em menos de um ano ele ficará pronto, dando-te muitas alegrias e infinita memória.
Alguns senadores o criticam, dizendo que deveríamos investir em esgotos e escolas. Não dê ouvidos a esses poucos. Pensa: onde o povo prefere pousar seu clunis: numa privada, num banco de escola ou num estádio? Num estádio, é claro." 
(clunis significa nádegas, o famoso bundão)
 À esquerda, um homem cagando na lixeira da recepção de um posto de saúde público, em Garanhuns (PE); o homem, com múltiplos ferimentos, foi obrigado a se aliviar ali, às vistas de todos, porque o banheiro do posto estava interditado, sem condições de uso; ao fundo, uma mulher observa, jogada à uma maca no corredor. À direita, os 12 estádios-sede da Copa 2014.
Mas não tenham dúvidas nem nutram muita pena, se ainda vivos hoje - a foto é de junho de 2013 -, tanto o cagão quanto a convalescente mulher estão a torcer fervorosamente pela seleção brasileira de futebol.
Não dê ouvidos a esses poucos [que prefeririam leitos decentes em hospitais e mais bancos escolares], o povo quer mesmo sentar seu bundão numa arquibancada de futebol. Para cagar ou estudar, qualquer lixeira lhe serve.

Para ler a carta a Tito na íntegra, é só clicar aqui, no meu poderoso MARRETÃO.

A Ditadura das Bandeiras

Republico o texto "A Ditadura das Bandeiras", escrito em 25 de junho de 2010, por ocasião da Copa do Mundo de 2010. Republico porque perdi a paciência de ficar chovendo no  molhado, republico porque não estou com ânimo para ficar escrevendo mais do mesmo, republico porque nada mudou, porque nada mudará, republico porque a republicarei em 2018, 2022, 2026...
A burrice continua, companheiros, ou, melhor, o falso patriotismo, a hipocrisia, o fingimento, a falta de vergonha na cara.

"Está tudo embandeirado. As ruas, as portas dos estabelecimentos comerciais, os postos de gasolina, as janelas dos apartamentos, os supermercados, os bares, as escolas; as pessoas estão embandeiradas, as bundas, os cachorros de madame (é sério que vi um poodle com o pelo tingido de verde e amarelo) e os carros.
Sobretudo os carros, a mais evidente extensão do pau do dono do veículo, portanto há paus embandeirados por aí, também. Há bandeiras cobrindo os capôs dos carros feito caixão de herói de guerra, há bandeiras obstruindo a visão da janela traseira e, em muito maior número, bandeiras pequenas, em nylon ou matéria plástica, hasteadas nas antenas ou em varetas adaptáveis ao espaço entre os vidros laterais e a capota.
Antes que alguém coloque a bandeira nacional na enorme lista das coisas de que não gosto, devo dizer que nada tenho contra a bandeira : se sua ostentação fosse de uso costumeiro, se a figura de lema positivista fosse presença rotineira na vida das pessoas. Abrindo um parênteses, a única coisa que me desagrada no nosso "lindo pendão da esperança" é justamente o "ordem e progresso", o tal positivismo me parece coisa de autoajuda.
O estadunidense age assim, a bandeira americana é onipresente em seu dia-a-dia, para onde se olhe, a bandeira lá está. Também não simpatizo com esse patriotismo quase fanático, mercadológico, inclusive, mas ao menos é coerente.
No Brasil, não. Aqui o nosso "símbolo augusto da paz" só é desfraldado na copa do mundo de futebol. A bandeira, aqui, não é símbolo da nação, é símbolo do futebol.
Aí eu fico puto, mesmo. Por que não fazer tremular "o lábaro que ostentas estrelado" em outras situações que não o futebol? Foi promovido no emprego? Tremule a bandeira, merda! O filho tirou notas melhores na escola? Tremule a bandeira, caralho! Um político foi exonerado a bem do serviço público? Tremule a bandeira, porra! A mulher não teve TPM esse mês? Tremule a bandeira, ora essa! O intestino e o pau andam a bem funcionar? Tremule a bandeira, tremule e tremule.
Mas não! É só na bosta do futebol.
Então sou tomado por ganas de me lançar numa ação subversiva contra esse patriotismo da bola. Tem me dado vontade de encher a cara e sair à rua, de madrugada, com meu passo de gato manco, carregando um isqueiro BIC no bolso - eu que piromaníaco fui na infância e desenvolvi várias técnicas de atear fogo em terrenos baldios.
Eu percorreria as ruas e iria ateando fogo em cada bandeira que eu encontrasse acoplada a um carro. Fico me imaginando como uma resistência solitária a essa ditadura das bandeiras. Em meu delírio justiceiro (e justo), vejo ruas e avenidas se estendendo por quarteirões e mais quarteirões de bandeiras a crepitar e derreter, uma trilha flamejante na brenha da noite sem lua, aberta a golpes de isqueiro; eu, o portador da chama.
Claro que - infelizmente - não sairei pela madrugada a brincar com pirotecnias. Na verdade, não vou nem mesmo encher a cara.
Contudo fica registrado meu desejo e, quem sabe?, lançada uma ideia. Para os mais corajosos que eu, para os que ainda são do fogo."

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Vaselina Pacu

Uma farmácia, em uma pequena cidade encravada em algum rincão esquecido do vasto interior do país. Antiga, a farmácia; tanto que mais fidedigno seria lhe designar por botica.
Arandelas com lâmpadas de vapor de sódio à entrada, piso quadriculado de preto-e-branco, balcão de maciça, grossa, pesada e aromática madeira de lei com ornatos entalhados à mão e fileiras de pequenas gavetas a conter as mais variadas ervas, unguentos e elixires, paredes de pé-direito altíssimo, forradas do rés do chão ao forro com coloridas embalagens e cujas prateleiras superiores só podem ser alcançadas através de uma longa escada que corre por trilhos horizontais.
Uma farmácia com "ph", um daqueles locais onde o tempo encosta para descansar, onde o tempo pára para dar um tempo, tomar um café, prosear um pouco, ler uns almanaques Biotônico Fontoura velhos, onde o tempo para por passatempo, para matar um pouco de tempo.
Um rapaz, visivelmente um forasteiro, adentra a botica. Sua estrangeirice é evidenciada por suas roupas, seu corte de cabelo, sua postura e jeito de andar, seus aparatos eletrônicos, sua idiotice, enfim. Dirige-se ao velho boticário.
- E aí, meu tio, o senhor tem aí vaselina, daquela boa, de qualidade mesmo, preço não é problema, sabe como é, né? - e se curva um pouco sobre o balcão, fala mais próximo ao boticário, adotando um tom de confidencialidade - hoje é uma ocasião especial, hoje eu vou comer um cu.
O boticário vai até os fundos da loja, em seu estoque, e volta com o pedido do rapaz, que abre o pote, toma uma porção da pasta entre os dedos polegar e indicador e começa a testar suas propriedades :
- Huumm... tem uma boa oleosidade, uma boa viscosidade, mas - e levando os dedos ao nariz - não tem um cheiro muito bom... por acaso, o senhor não tem aí uma mais cheirosa? Sabe como é, né? Hoje eu vou comer um cu.
O boticário retorna ao seu estoque e entrega outro pote de vaselina ao exigente rapaz.
- Huuumm... cheiro bom... framboesa, né? Mas - friccionando a nova vaselina entre os dedos - essa é um pouca áspera, abrasiva. Será que o senhor não tem uma com uma boa lubrificância e um cheiro agradável? Sabe como é, né? Hoje eu vou comer um cu.
O boticário responde afirmativamente à pergunta do rapaz, mas alerta-o de que é um produto importado, mais expensivo.
- Não tem erro, meu tio, já falei que hoje não vou ficar com miserê, não. Sabe como é, né? Hoje eu vou comer um cu.
O boticário, mais uma vez, vai aos fundos da loja e passa um novo pote às mãos do criterioso rapaz.
- Hummm... oleosidade excelente, bem escorregadia, cheiro suave e agradável, sabendo à lavanda e calêndula... pode embrulhar, meu tio.
Assim que o rapaz sai, um velhinho, desses que ficam sempre sentados aos cantos, só picando seu fuminho de corda, só pitando seu cigarrinho de palha de milho, começa a rir com gosto, desbragadamente.
- O que foi? - pergunta-lhe o boticário - Do que tanto ri, seo Antenor?
- Esse rapaz... - começa o velhinho, entre risos represados, puxadas de pigarro e tosse (velhinho já tosse pelas duas bocas) - esse rapaz não vai comer um cu coisa nenhuma, ele vai é dar o cu!
- Que é isso, seo Antenor? Deixe de ser maldoso, o senhor nem conhece o rapaz e fica aí falando que ele vai dar o rabo.
- Pois eu garanto, meu filho. Esse rapaz, hoje, vai é dar! Por acaso, você já viu alguém se preocupar tanto com o cu dos outros?
Todas as idas e vindas do boticário aos fundos da loja, todas as explicações e especificações do rapaz e, principalmente, a revelação, aos olhos argutos do seo Antenor, da sexualidade enrustida do forasteiro, poderiam ter sido evitadas, no mínimo abreviadas, se tanto o boticário quanto o rapaz conhecessem a Vaselina Pacu, Especial Para Profissionais.
Vaselina Pacu!!! Pãããããta que o pariu!!! É como diz o Zé Simão : o brasileiro é lúdico!!!

O nome do produto é mais que autoexplicativo quanto aos seus usos e utilidades. Um primor de síntese.
E não se deixem enganar pelas indicações explícitas no verso do produto, são só para disfarçar e evitar problemas com os órgãos de defesa do consumidor e reguladores de publicidade, a vaselina Pacu se presta exatamente ao que o nome diz : lubrifica e protege vários tipos de rosca, a frouxa, a espanada, a queimada, também dá um trato especial no anel de couro e azeita a argola.
Se conhecessem a vaselina Pacu, o boticário e/ou o rapaz, tudo teria sido mais simples, todo o constrangimento poderia ter sido evitado.
Quando o assunto é sacanagem, o brasileiro é genial, insuperável.

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Guaraná Jesus, A Salvação Também Na Versão Zero Caloria

O messiânico refrigerante pertence à The Coca-Cola Company e é fabricado e distribuído exclusivamente no estado do Maranhão. Segundo pesquisas da própria companhia detentora da marca, Jesus vende mais que a própria Coca-Cola. Pode ser que Jesus não seja mais famoso que os Beatles, porém, mais que a Coca-Cola, ele o é, o que não é pouca coisa, ainda que seja na capitania hereditária do Sarney.
Oposto ao óbvio, a bebida não foi batizada em louvor a Jesus, o Cristo, por um fiel mais grato e aguerrido, tampouco por João Batista. O Jesus do guaraná vem de Jesus Norberto Gomes, farmacêutico e ateu, um autobatismo e uma autoidolatria, portanto. Irônico e espirituoso pra caralho, o criador da fórmula nada secreta do guaraná Jesus. E herético. Uma profanação do sagrado que, em 1920, data da criação do guaraná, não passou, lógico, despercebida pela Igreja Católica : Jesus Norberto Gomes foi excomungado. Que sorte!
Será que a Igreja, à época, pediu-lhe participação nos lucros, afinal, Jesus Cristo é uma patente da igreja, uma das marcas comerciais mais rentáveis do planeta, e Jesus, o do guaraná, como bom ateu, deixou o clero local ao deus-dará, daí a sua excomunhão?
A exemplo da Coca-Cola, o guaraná Jesus nasceu de um fracasso, de uma malfadada tentativa de formulação de um novo xarope, mas a beberagem caiu no gosto dos netos do farmacêutico e assim nascia uma das bebidas mais populares do Maranhão.
A família de Jesus manteve fábrica própria até 1960, depois o guaraná Jesus foi vendido à Cervejaria Antartica Paulista, passou para a Companhia Maranhense de Refrigerantes e, finalmente, em 2001, foi comprado pela The Coca-Cola Company.
O refrigerante conta com 17 ingredientes em sua composição, entre eles, extrato de guaraná, cafeína, cravo, canela, teofilina e teobromina. Além disso, chama a atenção por sua peculiar coloração, cor-de-rosa, creio que única entre os refrigerantes do mundo.
E tem até Jesus com zero caloria. É o cristianismo diet. O que seria isso, afinal? O cristianismo sem o sofrimento, o calvário, a paixão? Sem culpa e sem o flagelo como único caminho para a redenção? Porra, aí perde a graça. Aí nem é mais cristianismo.

Lua Quase Cheia

Hoje
A Lua está quase cheia
Quase plena
Quase Luna
Quase túrgida
Quase prenhe.
Feito mulher peituda
Que cansada de ser estrela alfa no firmamento
E se rendendo aos lamentos
Das hérnias de disco de sua coluna-via-láctea
Resolve colapsar o universo
Resolve fazer cirurgia de redução das mamas.

domingo, 8 de junho de 2014

Instantâneos de um Saudoso e Remoto Passado (6)

Entre as décadas de 1920 e 1960, a cerveja Malzbier, da Brahma, era anunciada como um tônico fortificante, um complemento alimentar para refeições pouco balanceadas e até como paregórico contra anemia e palidez, a cerveja doce para senhoras e crianças. Muitos anúncios recomendavam seu consumo no horário de almoço, como forma de repor a energia gasta na labuta e de adquirir nova disposição para a segunda parte do expediente. Era também indicada às gestantes, para que lhes aumentasse a lactação.
Bons tempos... Que o canalha do politicamente correto matou e que, pelo visto hoje, não voltam mais.
P.S : os cartazes acima são, respectivamente, dos anos de 1925 e 1942.

sábado, 7 de junho de 2014

Lena, Como Foi Que Aconteceu? Tanto Tempo Já Passou...

"Lena, você ainda se impressiona
Com aqueles carros antigos, vermelhos, sem capota,
Com discos de Bob Dylan 
E madames com cara de idiotas?
Lena, onde estão aquelas fotos 
Com você posando nua?
E que livravam a minha cara
Quando você estava na rua..."
(Lena, Camisa de Vênus)

Lombriga Sem Asas

Sou uma lombriga-periscópio.
Elevo, equilibro meu pescoço desvertebrado,
Oscilo feito boneco inflável de posto de combustível,
Feito cobra indiana 
Que nunca morde a flauta que a escraviza.
Ponho a cabeça para fora da merda
E tenho um vislumbre ainda maior
Da merda que a merda é,
Mas não tenho asas 
Para safar-me desse poço de piche
- eu e todos os fósseis do Jurássico a dançar suas danças de ossos -,
Tampouco poderes de metamorfose.
Sou o pior - para mim mesmo -
Tipo de homem que há,
O homem-intermédio.
O que tem discernimento o bastante para enxergar a merda
Porém, insuficiente talento para se despregar dela,
O homem-meia-bomba.
Aos outros,
Aos mais agraciados,
A natureza concedeu olhos imunes à luz
E olfato blindado contra o mefítico.

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Mijaram na Nossa Senhora

O padre Querino Pedro, da paróquia Santo Afonso, em Cajazeiras (PB), acusa os evangélicos da cidade, comandados pelo pastor Poroca, de vandalismo contra uma imagem de Nossa Senhora. Os evangélicos, segundo Querino, quebraram a imagem, atearam-lhe fogo usando gasolina e, por fim, mijaram na santa.
“Mijaram em cima da imagem”, disse o padre.
Pelo visto, o que mais doeu no padre nem foi a demolição ou o churrasquinho da santa, sim a mijadinha para fechar com chave de ouro. A mijadinha é que chocou. A mijadinha foi o requinte de crueldade, a total humilhação imposta ao inimigo já caído.
Essa situação me lembrou de uma velha piada :
"Contam que Paulo Maluf, então governador de São Paulo, passeando por Roma, foi recebido pelo papa João Paulo II em uma audiência particular, um bate-papo informal entre amigos com interesses comuns. Conversam lá sobre coisas cotidianas e triviais, como os desígnios de deus e da fé e contas secretas no Banco do Vaticano, quando uma imperativa necessidade de esvaziar a bexiga acometeu Paulo Maluf. 
O Papa lhe disse que não havia nenhum banheiro nas proximidades, mas que ele não se apertasse nem se fizesse de rogado, que se aliviasse ali mesmo, atrás de uma grande estátua de São Pedro, que depois um serviçal limparia a sujeira.
Chocado, Paulo Maluf disse : - mas na estátua de São Pedro? Não me parece muito respeitoso, Sua Santidade.
- Deixa disso, menino - retrucou o Papa -, pode mijar à vontade, sem constrangimento. 
-Mas, Sua Santidade - insistiu Paulo Maluf - mijar em São Pedro, o primeiro Papa da Igreja, praticamente o seu fundador, não é heresia em demasiado?
- O que é isso, meu filho - tranquilizou-lhe de uma vez por todas o Papa -, deixe de melindres, depois de tanta cagada em São Paulo, o que é uma mijadinha em São Pedro?"
Faço minhas as palavras do Santo Padre e as dirijo ao Pe. Querino, de Cajazeiras : o que é isso, padre, depois de tanta cagada que a Igreja Católica já fez com a humanidade, o que é uma mijadinha na Nossa Senhora?
E parece que o pastor Poroca bate pesado, não está para brincadeiras. Nas escolas, as crianças evangélicas fazem terrorismo cristão com as católicas, ficam dizendo que elas vão para inferno. Pichações pela cidade chamam os católicos de "baratas pretas", em alusão à cor da batina dos padres.
“Estão fazendo a cabeça das crianças para repudiarem Nossa Senhora”, disse o padre, que acusa o pastor Poroca de promover a intolerância religiosa.
Bom, se um padre acusa àlguém de intolerância, é altíssima a probabilidade dele estar correto, afinal, fala um representante de uma instituição que torturou e matou mais de 9 milhões em sua Santa Inquisição; quando o assunto é intolerância, não tenham dúvidas, a palavra de um padre é inquestionável, ninguém tem maior conhecimento de causa.
Um padre da igreja católica reclamando de intolerância só porque uma imagem foi vandalizada? Uma porra duma estátua de barro, gesso, louça ou sei lá o quê? Se não é intolerância, que nome, então, esse padre dá a milhões de pessoas queimadas, estripadas, com aparelhos perfurocortantes introduzidos no cu, só porque não professavam da fé católica? Do que ele chamaria isso, de estar a serviço da obra de deus?
Obviamente, é mais que condenável incitar o ódio e a intolerância, mas e a adoração e a idolatria ensinadas nas igrejas, não são a mesma coisa? Ou, no mínimo, não são o reverso da medalha? Pregar a adoração cega, seja ao que for, seja a uma  imagem palpável, seja aos imateriais deus e Cristo, é também pregar o ódio e a intolerância contra todos os que não partilham dessa idolatria.
Pois é, Pe. Querino, foram-se os tempos em que só vocês podiam praticar a intolerância. Chumbo trocado não dói, Pe. Querino. Amor cristão com amor cristão se paga. Mas resta-lhe ainda um recurso, uma das especialidades de sua congregação, rogue uma praga das boas, daquelas do Velho Testamento, no mijão profanador. Peça a seu deus que contemple o herege incontinente com um câncer de próstata, com uma caxumba nas bolas ou com uma brochura daquelas que nem prótese no pau resolve.
Tá lá a santa, estendida no chão
Fonte : Paulopes