sexta-feira, 31 de dezembro de 2021

Cerveja-Feira (46)

Há cerca de 15 dias, fomos ao casamento de um colega de trabalho da minha esposa. Como os noivos e suas respectivas famílias são naturais da cidade de Araraquara, a uns 100 km de Ribeirão Preto, nela foi realizada a cerimônia do enlace matrimonial. E para lá, nós fomos.
Para bem aproveitar a boca livre, que prometia ser das boas e ir até as altas horas da madruga, os convidados de fora como nós, que eram muitos, combinaram de ficar todos num mesmo hotel, a apenas dois quarteirões do salão de festas, hotel no qual, depois de bem cachaçados e com o bucho cheiro, dormiriam e do qual, no dia seguinte, já sóbrios, partiriam de volta às sua cidades. 
Como todos que leem o Marreta sabem, quando eu viajo, até visito os pontos turísticos, até vejo as belezas naturais do lugar, até provo de suas culinárias típicas. Mas o que mais gosto de fazer é entrar em pequenos mercados, e quanto mais chinfrins, melhor, e pesquisar por boas e baratas de outras regiões.
Nem tinha pensado nisso dessa vez, nem considerei o passeio como uma "viagem". Porém, as Nornes entrelaçaram definitivamente o meu destino às boas e baratas. Se eu não as procuro, elas vêm até a mim.
Assim que nos acomodamos no hotel, vi que eu esquecera de levar umas garrafas de água mineral para consumir durante a estadia, como faço de costume. E, claro, não iria pagar R$ 6,00 por uma garrafinha de água de 300 ml do frigobar do hotel.
Araraquara não me é uma cidade de todo desconhecida e impessoal; pelo contrário até : ela foi o local da épica origem do Azarão, lá pelos idos de 1989, como já relatado aqui em A Origem do Azarão.
Em 32 anos, é claro, a cidade muito mudara, mas notei que o hotel não distava muito da rodoviária da cidade e me lembrei de um mercado que havia próximo a ela. Arrisquei. Falei pra minha esposa que ia comprar água num mercado próximo e já voltava. E o mercado continuava lá.
Entrei, comprei um galão de 4,5 l por R$ 7,99. Quando estava já na fila do caixa, senti um chamado irresistível às minhas costas, uma premonição. Olhei e lá estava ela, geladíssima, dentro de um daqueles refrigeradores verticais.
Lá estava ela : A Outra. Por R$ 1,59 a latinha de 350 ml.
Comprei meia dúzia e já tomei duas no quarto do hotel, nesse copinho vagabundo da foto. Duas latas a título de um "esquenta", para melhor encarar a cerimônia religiosa, a ladainha do padre, os vestidos brilhantes feito embalagens de ovo de páscoa da madrinhas, o choro dos pais, o organista a martelar seu teclado etc.
Se, por um lado, as duas latinhas me tornaram mais paciente e mais tolerante para com o casório no religioso, por outro lado, criaram um problema a ser resolvido, urgentemente. Atacou-me, em plena cerimônia, uma mijaneira desgraçada. Minha velha bexiga, nada católica, enviava sinais de estar em seu limite. Discretamente, dirigi-me a umas das cerimonialistas e perguntei-lhe por um banheiro. Atrás do altar, disse-me ela. De fato, havia dois corredores laterais, um à esquerda e outro à direita, que contornavam o altar e conduziam aos sanitários masculino e feminino atrás dele, atrás de uma grande parede.
Que tipo de padre filho da puta e sacana era aquele que punha os banheiros atrás do altar? Imaginem os noivos fazendo os seus votos de eterna fidelidade e eu passando ao lado pra ir mijar? Não ia rolar. Sem outra opção e já a apertar a cabeça do pau, saí da igreja à procura de um local para o meu alívio.
Por sorte, era noite e a igreja fica encravada bem no meio de uma praça com velhas e frondosas árvores. Fui contornando a igreja e acabei mijando em uma das reentrâncias, em um dos recôncavos de sua arquitetura neogótica.
Aliás, essa ida à Araraquara deve ter me rendido mais uns bons milhares de anos a queimar no inferno. Além da mijada na parede da igreja, no hotel, para calçar o ar-condicionado, que teimava em vibrar e fazer barulho, arranquei e enfiei umas tantas páginas dobradas daquelas bíblias disponíveis nos criados-mudos dos quartos entre o aparelho e a parede.
Mas, enfim, sim, A Outra é boa. Boa e barata. Não fica nada a dever para cervejas mais conhecidas, como a Subzero, Kaiser, Itaipava, Skol. Notei mesmo até um cheiro e um gosto mais intensos de pão, de levedura n' A Outra que nas marcas supracitadas. Não identifiquei também nenhum gosto metálico, flagrantemente presente, por exemplos, na Skol e na Itaipava.
A Outra é fabricada na cidade paulista de Socorro, que vem despontando como um grande polo cervejeiro de boas e baratas, uma espécie de Bélgica brasileira, mas, sobre esse munícipio, pretendo melhor pesquisar e dedicar-lhe uma postagem futura.
Abaixo, A Outra, já em casa, já devidamente acondicionada em um dos meus poderosos canecões. Pronta para o abate. Essa, eu recomendo. Ganhou o selo ISO-Azarão das boas e baratas.

quinta-feira, 30 de dezembro de 2021

Previsões do Horóscopo Chinês Para 2022

As manchetes abaixo foram colhidas no portal UOL de notícias, entre os dias 25, a festa cristã, e 30 de dezembro, o famoso hoje.
 
- China registra maior número de casos em quatro meses (25/12/21);
- Itália passa de 50 mil casos de Covid pela segunda vez (25/12);
- Com ômicron, 4 países da Europa ultrapassam 50 mil novos casos de covid/dia (25/12);
- 23 funcionários de empresa de MG se infectam com ômicron após festa em SP (25/12);
- França bate novo recorde ao ultrapassar 100 mil casos de covid-19 em 24 horas (26/12);
- Ômicron traz recorde de novos casos de covid e provoca caos em aeroportos (27/12);
- SP : com confusão de sintomas, casos de influenza e covid sobem em dezembro (28/12);
- OMS prevê "grande número" de internações pela variante ômicron da covid-19 (28/12);
- Mundo tem pela primeira vez mais de um milhão de casos de covid em um dia (28/12);
- Brasil volta a ter média de mortes por covid-19 acima de 100 (28/12);
- França tem novo recorde diário de mais de 200 mil casos de covid-19 (29/12);
- Ômicron : OMS alerta para risco "muito elevado" (29/12);
- Casos de covid-19 aumentaram 50% nas Américas, diz Opas (30/12);
- Covid : EUA e Reino Unido atingem contágio recorde e promovem dose de reforço (30/12);
- Hospitalização de crianças dispara nos EUA e cria novos temores da ômicron (30/12).
 
 
Quando é que o gado humano vai perceber que ele nunca será 100% imune ao vírus chinês, não importando quantas doses tenha recebido e nem a marca da vacina com que foi inoculado?
Quando é que o gado humano vai entender que não haverá o normal de novo, que ele não mais poderá voltar a se aglutinar em bandos a dançar e a celebrar em torno das fogueiras de sua miséria existencial, não sem a grande probabilidade de ser infectado pelo próprio ar que inala, de ser envenenado pelo próprio hálito e pelo próprio bafio da manada que compõe?
Quando é que o gado humano vai se dar conta (ou, o que me parece impossível, aceitar) que as vacinas, embora sejam a melhor arma de prevenção e, sim, devam ser tomadas, não tem 100% de eficácia contra a Peste Chinesa? As próprias taxas de imunização divulgadas pelos fabricantes são, nesse caso, na melhor das hipóteses, aproximações, projeções, "chutes" com o máximo de embasamento científico que lhes pode ser atribuído.
As vacinas contra a gripe amarela - todas elas - ainda estão em fase de testes, de ajustes. Uma vacina, seja ela qual e contra o que for, despende uma média de dez anos para ser desenvolvida, segundo o site da Fiocruz : "Tentativas e erros são comuns nas etapas de pesquisa em laboratório e nos testes em modelos celulares e animais até chegar às três fases dos ensaios clínicos — quando a vacina finalmente é aplicada em seres humanos, para verificar segurança e eficácia. O tempo médio de desenvolvimento de um novo produto é de cerca de 10 anos. Ainda há o risco de décadas de pesquisa não resultarem em nenhum imunizante eficaz".
A vacina contra o vírus chinês ficou "pronta" em um ano, um ano e pouco. Ou seja, não ficou pronta. Ainda está a ser testada, em fase de tentativas, erros e consertos. Testada em quem, caras-pálidas? Em nós, ora porra! Ao invés de em pequenos grupos bem monitorados, supervisionados e assistidos, a vacina contra o vírus chinês está a ser testada em bilhões de pessoas, sem nenhuma supervisão, a não ser a coleta dos resultados.
Admito, tristemente, que, nesse caso, não havia alternativa melhor, a espécie humana não dispunha do luxo de aguardar por 10 anos. Era ou nos deixarmos usar como cobaias interessadas ou nos deixar infectar naturalmente pelo vírus de Wuhan.
Eu próprio, mesmo sabendo de tudo isso, deixei-me vacinar. Tomei já três doses. Apostei no meno male. Apostei na vacina como uma proteção a mais. Não como a única; muito menos como infalível.
A comparar mal e porcamente, vacinar a população contra o vírus chinês com vacinas ainda em desenvolvimento é como dar a cada cidadão um revólver calibre 38, sem saber com o que ele está carregado, ou se está carregado. O trabuco, na certa, pode nos tornar menos vulneráveis a certas situações, mas pode nos livrar por inteiro do Crime?
Levar um treisoitão na cintura pode nos proteger de ladrõezinhos pés de chinelo, de punguistazinhos rastaqueras, de moleques drogados armados de facas e estiletes. Porém, se com esse mesmo .38 quisermos invadir e desmontar, a exemplos, um covil do cartel de drogas mexicano, uma base de operações do PCC ou um diretório do PT, ele de nada nos valerá. Seremos fulminados.
A retomada do turismo, dos bares e restaurantes, as festividades de fim e começo de ano e, logo, logo, o carnaval são os covis de drogas mexicanos, as bases do PCC e os diretórios do PT em que a população vacinada está adentrando com o treisoitão dado pela vacina ao seu sistema imunológico.
E como as pessoas adoram viajar, comer em bares e restaurantes. E como adoram o Natal, o Ano-Novo e o Carnaval. Pois o vírus chinês os adora ainda mais.
Arma boa é aquela que não precisamos usar. Arma boa é aquela com a qual nunca precisaremos atirar. É bom e recomendável portá-la; mais recomendável ainda é evitar situações que nos forcem a sacá-la do coldre.
No caso da violência e do crime urbanos, evitar vizinhanças perigosas, horários de ruas ermas, não andar a exibir objetos que possam atrair a ganância da bandidagem etc.
No caso do vírus chinês, manter o uso de máscaras, o distanciamento, a higiene das mãos; e se as celebrações forem inevitáveis, que sejam organizadas com pequenos grupos e realizadas em ambientes abertos.
Melhor nunca topar com o bandido do que ter que trocar tiros com ele. Melhor nunca topar com o vírus chinês do que ter que duelar com ele. Até porque, como já dito, nem temos a certeza da real letalidade das balas com que a vacina municiou nosso revólver. Não sabemos se o que temos em nossos .38 imunológicos é de fato chumbo grosso contra o vírus chinês ou apenas balas de borracha, ou de festim.
Para sair do terreno das estatísticas invisíveis, cito dois famosos que morreram da peste chinesa mesmo tendo sido vacinados : Tarcísio Meira e Aguinaldo Timóteo.
Mas vá o gado humano controlar o fogo no cu que tem para se aglomerar, vá o gado humano se dispor a entender que a vacina é apenas uma defesa a mais? A isso, junte-se uma imprensa mal-intencionada e desinformativa e o resultado é o relaxamento das normas sanitárias de segurança, é o arrefecimento da pouca disciplina que o gado humano conseguiu adquirir em quase dois anos.
O resultado são as manchetes que exibi no começo da postagem, o recrudescimento da peste chinesa, a volta da que não foi.
Nem porco nem cavalo nem macaco nem dragão.
Segundo o horóscopo chinês, o ano de 2022 será regido, de novo, pelo vírus chinês. 
China registra maior número de casos de covid-19 em quatro meses ... - Veja mais em https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/afp/2021/12/25/china-registra-maior-numero-de-casos-de-covid-em-quatro-meses.htm?cmpid=copiaecola
China registra maior número de casos de covid-19 em quatro meses ... - Veja mais em https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/afp/2021/12/25/china-registra-maior-numero-de-casos-de-covid-em-quatro-meses.htm?cmpid=copiaecola

sábado, 25 de dezembro de 2021

Vocês Decidiram Por Mim, Seus Filhos das Putas

Vocês decidiram por mim, seus filhos das putas.
Vocês, na alternativa "e", não me deram a opção n.d.a (nenhuma das anteriores).
Vocês me tiraram toda e qualquer possibilidade de livre-arbítrio.
Vocês decidiram por mim, seus filhos das putas: vou votar no Bolsonaro!!!!!

sexta-feira, 24 de dezembro de 2021

Canções de Ninar de Laboratório

Quem é que,
Além de mim,
Ainda fica,
A uma hora dessas,
A buscar palavras
Para vestir pijamas de flanela
Em seus sentimentos?
 
Por que,
Simplesmente,
Não embalo minhas angústias,
Meus nós no peito,
Com canções de ninar
De rivotril
E de lexotan,
Com acalantos 
De diazepam
E de zolpidem,
E vou dormir
Quase em paz?

sábado, 18 de dezembro de 2021

Pode Ser Numa Canção, Pode Ser no Coração, Eu Só Quero Ter Você Por Perto (17)

Por aí
(Bárbara Eugênia)
 
Eu vou ficar na saída da escola
Na saída da casa
Eu vou ficar por aí

Vou ficar na saída da escola
Na saída da casa
Eu vou ficar te esperando

Fumando mil cigarros
Bebendo coca-cola

Esperando você sair
Esperando você chegar

Fumando mil cigarros
Na saída da escola
Na saída de casa
Bebendo coca-cola

Vou ficar por aí
Por aí
E você
Não vem, não chega
Bebendo coca-cola

Você não diz 'oi'
Você não diz 'tchau'

Fumando mil cigarros
Bebendo coca-cola

Por aí
Por aí

Por que você não passa por aqui
Pra gente fumar mil cigarros
Pra gente beber coca-cola
Pra gente papear um pouco
Pra gente ficar por aí?

sexta-feira, 17 de dezembro de 2021

Teus Olhos

Por que não despisto os teus olhos?
(sou bom em não deixar rastros).
Por que não fujo,
Por que não os furo com duas estilingadas de mamonas?
(sou bom em acertar cocorutos de pardais e de rolinhas).
 
Por que finjo que não os vejo
Que não os sei
A me vigiar
Em cada farol de carro,
Em cada lâmpada de poste,
Em cada sinal vermelho de semáforo,
Em cada câmera de loja,
Em cada olho vesgo de gato siamês,
Em cada útero licoroso de dama-da-noite? 
 
Porque eles são o lago mais gelado
Que já me espelharam.
Porque são as canvas
Que mais bem me expressaram e me abstraíram.
Porque são os Carraras
Que melhor consolidaram o meu Renascimento.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2021

Ciro Gomes : na Mira de Bolsonaro?

Terá o intrépido e desesperado Bolsonaro começado a soltar os seus cachorros para cima de seus opositores no pleito presidencial de 2022? A literalmente soltar seus cachorros? 
Terá atiçado a Polícia Federal na garganta de Ciro Gomes, o maior mamador de onça do sertão, e de Cid Gomes, irmão do presidenciável?
A operação da PF irá investigar irregularidades e um suposto esquema de desvios nas obras de ampliação da Arena Castelão, principal estádio do Ceará, para a Copa do Mundo de 2014. Ciro, é claro, nega as supostas maracutaias. Segundo a PF, há indícios de propinas, pagas entre os anos de 2012 e 2013, que podem ultrapassar a cifra dos dez milhões de reais. Os pixulecos de Ciro Gomes eram pagos em dinheiro vivo, ou disfarçados de doações eleitorais, com emissões de notas fiscais fraudadas por empresas fantasmas.
Será que é um "golpe" de Bolsonaro para cima de Ciro Gomes? Estará o Cavalão a usar a máquina governamental a seu dispor de modo a caluniar Ciro Gomes? Espero que sim, que seja apenas um golpe sujo e baixo de Bolsonaro, pois votei em Ciro Gomes nas últimas três eleições e pretendo(ia) votar nele pela quarta vez.  
Mas parece que não. Parece que, embora seja muito conveniente aos planos de Bolsonaro, Ciro e Cid Gomes podem mesmo ter culpa no cartório. Parece que Bolsonaro não exerceu mesmo nenhuma interferência nessa operação da PF.
Delegados experientes e, inclusive, críticos de Bolsonaro dizem que as chances de uma ingerência do Mito na operação que investiga os irmãos Gomes, ou mesmo alguma solicitação dele nesse sentido, são praticamente zero. A investigação começou em 2017 (portanto, antes da eleição de Bolsonaro) e é conduzida por um delegado cearense cabra da peste, com autonomia para traçar sua linha de investigação.
Além disso, os próprios aliados de Ciro Gomes, após a ação da PF, aumentaram a pressão para que ele desista de concorrer à Presidência em 2022. Ou seja, nesse mato deve ter mesmo cachorro.
Será uma pena se o envolvimento de Ciro no caso da arena Castelão for de fato provado. Terei que anular meu voto já no primeiro turno. Ou... e pensamentos tenebrosos já me assaltam a mente.
Terá a PF, talvez com Bolsonaro por trás de tudo, posto um derradeiro alvo na testa de Ciro Gomes?
Será o canto do cisne do cearense?

Travessuras de Menina Má (42)

E o Travessuras desse mês é temático!
Com elas, as renas do Papai Noel! Que ainda aparecerão mais por aqui, ao longo de dezembro, na citada seção, como acontece em todos os meses do aniversário de Jesus!!!!

segunda-feira, 13 de dezembro de 2021

Mimetismos (36)

Uma flor rara e exótica? Uma margarida de pétalas azuis e miolo rosa?
Nada disso. É o modelito primavera-verão 2021/2022 do vírus chinês. A variante ômicron.
E não é que o bichinho é bonito pra danar? Muito bem feitinho, literalmente.

domingo, 12 de dezembro de 2021

No Meio do Caminho Tem Uma Loja de Conveniência

No meio do caminho tem uma loja de conveniência
tem uma
loja de conveniência no meio do caminho
tem uma
loja de conveniência
no meio do caminho tem uma
loja de conveniência.

Traço meu caminho
para que tenha uma loja de conveniência no meio do caminho.
Para que no meio do caminho
tenha uma loja de conveniência.
 
Nunca me esquecerei desse estabelecimento
na vida de minhas manhãs de sobriedade tão fatigadas.

Nunca me esquecerei que no meio do caminho

tem uma
loja de conveniência
tem uma
loja de conveniência no meio do caminho
no meio do caminho tem uma
loja de conveniência.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2021

Gosto de Ti

O que eu mais gosto em ti?
Que gostas de mim.
 
O que mais me engraça em ti?
Que achas graça de mim,
Que ris do que falo,
Que sorris do que escrevo...
Logo de mim,
Que me acho tão triste.
 
O que mais gosto em ti?
Que sentes falta de mim
(Que mal me dou conta da minha presença),
Que corres afoita
E afogueada ao meu encontro.
Logo ao meu encontro...
Que tanto me evito,
Que vivo fugindo de mim.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

Foi Tudo Obra de Bolsonaro

Em seus dois, três anos de governo, Jair Messias Bolsonaro inventou :
- o desmatamento da Amazônia (um jardim do éden, antes dele);
- as queimadas no Pantanal;
- o garimpo ilegal;
- a grilagem de terras indígenas;
- a pobreza do povo e da nação (uma Suíça, antes dele);
- a Revolução Industrial e a consequente e desenfreada emissão de gás carbônico para a atmosfera que se seguiu a ela;
- as mudanças climáticas;
- o aquecimento global;
- o efeito estufa;
- o buraco na camada de ozônio;
- a desvalorização do Real frente ao Dólar.
 
E, principalmente, Bolsonaro inventou :
- o vírus chinês e a pandemia da Peste Amarela;
- a falta de educação e disciplina do povo brasileiro, o que colocou o Brasil na liderança dos países da América Latina que menos respeitaram o isolamento social e as regras de segurança contra a Gripe Chinesa, seguido, em segundo lugar, pelo México.
 
Bolsonaro só não inventou uma coisa :
- a vacina contra a Gripe Chinesa;
- essa, quem inventou foi o Doria Calcinha Apertada.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

Quem Não Tem Néctar, Caça com Chorume

Adaptação, o teu nome é Natureza.
Impressionantes são alguns dos caminhos evolutivos - antes insuspeitos e mesmo inverossímeis - trilhados por certas espécies quando postas frente à Extinção, o Ragnarok Darwiniano. Quando a água lhes bate às bundas. Quando as únicas opções são ou morrer, ou se virar nos trinta. Nos trinta mil anos de evolução; comparativamente, tempo mais irrisório que os nossos trinta segundos do relógio. 
Ao pensarmos nas abelhas, logo nos vêm à ideia aquele insetozinho faceiro e bucólico, amigo das plantinhas. Imaginamo-as a voar leves e alegres por entre as flores, numa eterna celebração à fecundidade, levando o pólen (a porra vegetal) de uma flor-macho ao gineceu no cio de uma flor-fêmea, num lascivo triângulo amoroso, num libidinoso ménage à trois.  
Quem poderia supô-las umas carniceiras? Quem as suporia fazendo da carne podre, néctar? Umas hienas de celofânicas asas? Uns doces urubus?
Pois estas abelhas existem. São as abelhas-abutre, como estão a ser chamadas por uma equipe de cientistas estadunidenses da Universidade da Califórnia, que estão a estudá-las e a tentar compreender as adaptações que as permitiram desfrutar de tão putrefato cardápio.
Entre as modificações sofridas por essas abelhas está o desenvolvimento de um "dente" a mais, tornando suas mandíbulas serrilhadas mais aptas a destrinchar a carne podre. Mas essa está longe de ser a principal e mais surpreendente adaptação das abelhas-abutre. A grande chave do sucesso evolutivo desta espécie se encontra em suas entranhas, em seus intestinos. A flora bacteriana da abelha-abutre, o seu microbioma intestinal, é composto por bactérias muito diferentes dos das abelhas convencionais, e muito semelhantes aos das hienas e outros carnívoros, que não só permitem que as abelhas-abutre digiram a carne podre como também as protege de possíveis agentes infecciosos na carne decomposta.
Os cientistas acreditam que tal adaptação tenha se dado a partir de um período de grande escassez de néctar, em que essas abelhas, pequenas e sem ferrão, teriam perdido a competição por alimento para abelhas maiores e mais bem armadas, o que as obrigou a repensarem a sua dieta, os seus hábitos alimentares.
E dá até para fazer melzinho do chorume dos cadáveres. Nas abelhas "normais", existe uma enzima, a invertase, que converte a sacarose do néctar em glicose e frutose, os principais componentes do mel. As abelhas-abutre desenvolveram uma enzima (a reportagem que li não cita o nome da tal) que faz o mesmo com o líquido mefítico que elas recolhem dos cadáveres. Na colmeia, a carne podre e o mel ficam reservados em compartimentos separados e isolados, não há a contaminação do mel.
Os cientistas acreditam que, inicialmente, um pequeno grupo dessas abelhas tenha se arriscado a consumir cadáveres. Tendo o experimento logrado êxito, esse grupo foi passando a informação para outras colmeias e para as gerações seguintes.
Intrigado com a questão, eu, um CSI da Natureza, saí em uma pesquisa de campo. E constatei que os cientistas estão certos, ou quase certos, parcialmente certos. Descobri que não foi um grupo pioneiro de abelhas a se arriscar em nova dieta, a se aventurar em decompostas carnes. Não foi um grupo. Foi UMA abelha. Uma única abelha, a responsável por salvar o seu povo da extinção.
Consegui encontrar e falar com essa abelha visionária. O acesso a ela não foi tarefa fácil. Hoje, ela é uma espécie de pop star, de celebridade da colmeia. Cheia de vontades, manias, cerimoniais e protocolos. Essa abelha, antes uma humilde proletária, de quem dizem, as açucaradas e más línguas da colmeia, até ter cortado propositalmente metade de sua asa esquerda para tentar se aposentar, foi a primeira operária a ser alçada à posição de abelha rainha, por salvar o seu povo da fome.
Tal ascensão, inclusive, deflagrou o início de um levante das massas, gerou o embrião de uma luta de classes, começou a se dizer de direitos trabalhistas, de folgas remuneradas, de invasão a colmeias improdutivas, da formação de sindicatos etc. Durou pouco, a insurreição. O Zangão-Mor, o único a possuir recursos e instrumentos para tal, bateu com o pau na mesa e acalmou os ânimos da turba. Distribuiu lá uns sanduichinhos de mortadela-real e conduziu a plebe rude de volta ao seu devido lugar.
Acertada a entrevista e o seu horário, a abelha me recebeu em seu confortável e opulento favo triplex, de frente para um mar de lírios e lavandas. Pediu que eu me sentasse e me serviu uma dose do mais puro melaço cubano. Perguntei-lhe, então, de onde viera a ideia de se alimentar de cadáveres, de carne podre. Respondeu-me:
 
"Era o fim de um dia de pobre colheita de néctar, os campos todos secos, quase nenhuma flor nos pés, um estio danado... tudo culpa das mudanças climáticas e do agronegócio capitalista e opressor. Eu não tinha atingido nem metade da meta estabelecida pela Rainha-Dilma, que já prometera dobrá-la para o dia seguinte. Decidi, então, para cumprir com minha cota, procurar por um enterro, por um funeral, ambientes sempre fartos de flores. Dei azar. Caí num velório de pobre. Tudo flor de plástico. Tudo arranjo de R$ 1,99.
Já escurecia e não havia mais o que eu pudesse fazer. Dei-me por vencida. Já estava voltando de corbículas vazias para a colmeia. Foi quando veio a salvação. Foi quando ouvi uma pessoa a carpir e a se lamentar sobre o caixão do defunto : "que tragédia, tão moço, tanta vida pela frente, em plena flor da idade...". 
Flor? Eu ouvira flor? Aí, me deu o estalo, o insight! Não custava tentar. Provei o defunto, gostei, vi que dava para fazer um melzinho e espalhei a notícia para as outras abelhas. O resto, é história."
 
Pedi-lhe mais uma dose do melaço cubano e fiz uma última pergunta : - É verdade que esse dia, que essa data da epifania que a senhora teve, virou feriado nacional, que é o único dia do ano em que não se trabalha na colmeia? Que é comemorado com paradas militares e ganhou até um nome imponente?
- Sim, é verdade - começou ela -, essa data virou feriado nacional e recebeu o nome de O Dia do Apocalipse Zum-Zum-Zumbi.
Fim da entrevista.
Pããããããããta que o pariu!!!! 
Abaixo, abelhas-abutre a fazer um lanchinho, uma boquinha.

sábado, 4 de dezembro de 2021

Esse Papai Noel é Rena

E ainda dizem que  as minhas denúncias constantes de um complô para o embichamento planetário são pura teoria da conspiração.
A cooptação de personalidades ilustres, de figuras históricas e até de personagens de ficção para a causa gay é uma das estratégias mais comuns desse complô. Levar o máximo possível de grandes vultos para a irmandade é a tática mais corriqueira na tentativa de normatizar o tesão na argola. Já sobrou até para o Super-homem, kryptoniano das antigas.
Agora, chegou a vez do Papai Noel perder as pregas! Sim, meus amigos, embicharam também o Bom Velhinho! Uma propaganda natalina da Noruega, dantes mais varonil terra de vikings, exibe o Papai Noel dando um beijaço num outro cara. O que você vai dar para mim?, teria perguntado o sujeito, antes de ser surpreendido pelo beijo do Santa Klaus.
Para mim, não chegou a ser uma surpresa. Sempre achei o Papai Noel com pinta de biba velha. Sempre no meio daqueles viadinhos do nariz vermelho e daqueles elfos andróginos e saltitantes. Além do quê, é notório, Papai Noel vive levando o saco nas costas. 
Agora, depois de séculos de discrição, o Papai Noel resolveu assumir : saiu da chaminé! 
O único problema é que ele perdeu um pouco de moral entre os seus serviçais, perdeu um tanto de sua autoridade sobre os seus subalternos. Suas ordens e comandos não impõem mais respeito.
Agora, por exemplo, quando a produção de brinquedos para o Natal está atrasada e o velho Noel precisa ser mais incisivo com os seus relapsos lacaios de orelhas pontudas, precisa aplicar-lhes aquela bronca, os elfos olham pra ele e dizem : "tá boa, Santa?
Pããããããããta que o pariu!!!

O Piedoso, Não Obstante Implacável, Cronos

Minha esposa encontrou uma amiga no mercado.
 
Fizeram as contas :
Há nove anos sem se verem. 
 
Comentou ao chegar em casa :
Não parece que fazia tanto tempo que eu não via a fulana.
 
O tempo passa rápido,
Pensei eu.
Não menos sofrido e árido por isso,
Mas passa rápido.
Que me parece ser
O único ato de piedade
Que o Tempo é capaz de nos conceder.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2021

Cerveja-Feira (45)

O idoso, aquele a quem, antigamente, a gente chamava de velho, não perde apenas o tônus, a força muscular, os dentes e os cabelos. Não lhe debilitam apenas os reflexos, a memória, o pau, os cinco sentidos. Eu havia lido, há algum tempo, que a idade também tolda o discernimento e o julgamento que o idoso faz das pessoas e do mundo. Fica-lhe cada vez mais difícil diferenciar a verdade da mentira, enxergar o limite do plausível, reconhecer bons e maus caracteres, separar a boa vontade alheia do oportunismo de rapina.
Ao contrário do que diz a ignara sabedoria popular, velhos não ficam mais ranzinzas e azedos. Pelo contrário, tornam-se mais dóceis, mais facilmente influenciáveis. Tornam-se completos crédulos. Que é o mais vulnerável dos seres.
Não é à toa que os idosos são o alvo preferencial de golpes e de contos do vigário. Nem é tanto a falta de capacidade de reagir fisicamente, de sair na porrada se for o caso, que faz o idoso em presa fácil dos golpistas, mas, sim, a falta de capacidade de perceber o golpe, de distinguir o malandro do bom sujeito.
Não é à toa que a maioria dos consumidores de canais de televendas é composta por pessoas idosas. Não é à toa que o público massivo dos antigos bingos das décadas de 1990 e 2000 fosse também formado por aposentados. Não é à toa que velhinhos, não raro, se apaixonam por bucetinhas novas e as declaram suas herdeiras universais, deixam tudo para a buceta : casa, aposentadoria, seguro de vida. Estudos também mostram que os velhinhos estão entre os maiores replicadores de fake news; não por dolo, por acreditarem nelas de fato.
Devo estar a entrar nessa fase, da credulidade incondicional.
Na semana passada, caí em dois contos do vigário cervejeiro. No conto das puros maltes. A Spaten e a Itaipava 100% Malte. A primeira até com grandes outdoors pelas ruas da cidade. A segunda anunciada à exaustão em comerciais da TV. 
A Spaten, eu já estava a namorar há algum tempo, sempre que entrava na loja de conveniência para comprar a minha fiel Lokal. Então, aproveitando uma leve redução de seu preço, a comprei. R$ 3,46 a latinha de 350 ml. No rótulo, diz que é fabricada desde 1397, com a mais pura receita alemã. Comprei só uma latinha. Talvez eu ainda esteja no estágio de crédulo, porém, precavido. Foi a minha sorte. Uma bosta, a tal Spaten. Impossível, numa prova às cegas, diferenciá-la, por exemplo, de uma Sub Zero. Nem contei à minha esposa, tamanha vergonha que senti por cair em tal logro. E isso, já na quarta-feira.
No sábado, escarrapachei-me em uma segunda arapuca, a Itaipava 100% Malte. Já tinha tomado a Itaipava Premium Puro Malte, e gostado dela. Até cheguei a pensar : que diferença há entre puro malte e 100% malte? Nenhuma, muito provavelmente, eu mesmo concluí. Mesmo assim, comprei. Mesmo assim cai nessa maracutaia semântica. Como era sábado, comprei duas, uma para mim e outra para minha esposa, fora as nossas marcas rotineiras. R$ 2,99 a lata de 350 ml. Outra bosta! Pior que uma Glacial.
Em meu favor, no caso da Itaipava 100% Malte, talvez possa pesar o motivo que eu, inconscientemente, quisesse, feito um jogador de pôquer em maré de azar, recuperar a aposta malograda de quarta-feira, a Spaten, e me redimir aos meus próprios olhos. Mas caí em outro blefe.
Por isso, digo a esses moços, pobres moços, que acreditem em mim : passem longe da Spaten e da Itaipava 100% Malte, fujam delas.
E como não posso mais confiar em meus envelhecidos e enferrujados instintos, de hoje em diante, puro malte, só se me derem de graça.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

Sim, Jotabê, a Terra é Plana (Ou, ao Menos, Muito Chata)

Essa é para o Jotabê, terraplanista juramentado! Ou, pelo menos, nascido na época em que a própria Ciência jurava de pés juntos - e perante a Inquisição - que a Terra era plana!

quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

Vale o Quanto é Bela

A Língua Portuguesa foi a mais preciosa herança nos legada por nossos "descobridores". Aliás, foi, não : é. É a maior herança nos legada por eles.
A Língua Portuguesa valeu cada tora de pau-brasil decepada e transformada em vestes vermelhas para os nobres e para os reis. Valeu cada grama de ouro e cada gema de esmeralda subtraídos do território de Pindorama.
Frente a ela, a Língua Portuguesa, qualquer ouro é pirita, o ouro dos tolos; qualquer esmeralda é turmalina, a esmeralda dos tolos. Ouro e esmeraldas para quê? Só valem o que valem porque algum louco instituiu que assim fosse. Per si, são minerais inertes; não se prestam nem a antepasto. Fora os valores atribuídos arbitrariamente a elas, não são de nenhuma valia. Ah, o arbitrário... o supremo árbitro das ações humanas.
O índio tinha o som associado aos objetos e aos seres vivos, mas não tinha a palavra, a necessária interface entre eles. A palavra é a materialização da ideia, o seu arcabouço físico, necessário para que a ideia se mova pelo nosso mundo, físico. A palavra é o obstetra que dá à luz a ideia, o pensamento. 
Não somos identificados e reconhecidos por uma palavra? Não nos identificamos e nos reconhecemos através de uma palavra, o nosso nome?
A palavra (que o português nos trouxe), em relação ao som (que o índio tinha), foi como se, de repente, a gostosa que você imagina ao tocar uma punheta, como que por mágica, se materializasse no seu banheiro, à sua disposição.
A herança portuguesa nos é uma herança tão valiosa que chega mesmo a compensar, a sobrepujar, a mais malditas das heranças lusitanas, a outra palavra, a Palavra do Senhor, o Cristianismo.
Mais ouro, madeira e pedras preciosas nos tivessem sido furtados, mais ela valeria. Pois ela vale o quanto é bela. E a Língua Portuguesa é a mais bela das Línguas. José Saramago disse isso. Ariano Suassuna disse isso. Miguel de Cervantes, que falava espanhol, e por isso insuspeito, disse isso.
A Língua Portuguesa é a Angelina Jolie das línguas-mães; é a Scarlett Johansson dos idiomas pátrios.
No entanto, de uns tempos para cá - de umas décadas para cá, inclusive e desgraçadamente - foram postos em prática e estão em franco andamento o desmonte e o sucateamento da sociedade de uma forma geral, seus costumes e valores morais básicos. E que maneira mais eficiente de demolir uma nação que demolindo a sua língua materna, o idioma através do qual ela se expressa, se comunica e entende o mundo?
Há décadas que, nas escolas de ensino fundamental e médio, está a ocorrer um verdadeiro estupro da Língua Portuguesa, a bela (e hoje inculta) última flor do Lácio. 
Há décadas, os cânones da sintaxe, da regência, da ortografia, enfim, da alma da Língua Portuguesa vem sendo minados e solapados. 
Há décadas, gerações de apedeutas vêm sendo “ensinadas” que não conhecer nem fazer uso das boas normas do idioma, que falar e escrever errado não só é aceitável como também tem de ser, obrigatoriamente, considerado como correto.
Não importa a forma culta e correta, garantem os linguistas. O que importa é se houve a transmissão e a compreensão da mensagem entre o emissor e o receptor. Para os tais linguistas, se o sujeito pedir dois "pão" e o que balconista lhe entregar coincidir com o que ele queria, está tudo certo, os dois "pão" estão valendo. Para o linguista, o "dois pão" vale nota 10 na prova bimestral. Supondo, é claro, que o analfa de pai e mãe peça os dois "pão" numa padaria, porque do jeito que as coisas vão, não seria difícil ele fazer o pedido numa farmácia. Ai é que eu queria ver a mensagem ser "entendida". 
E entendida, a mensagem, de uma forma ou de outra, sempre foi. Desde os tempos da pintura rupestre, desde os tempos do gutural, do AA UU. O fato de que as pessoas entendam uma linguagem truncada e mutilada só confirma o desprezo com que o idioma vem sendo tratado. Uma ignorância reconhece, abraça e acolhe a outra. Não significa - não pode significar - que ela seja correta.
O linguista é o fariseu da Língua Portuguesa, o cara que morde e cospe na língua que o nutre. O linguista está para a Língua Portuguesa assim como o pedagogo está para a educação. Um diz que qualquer forma de escrever é correta; o outro, que qualquer merda que o aluno apresentar tem que ser considerada. E, assim, os dois, linguistas e pedagogos, cada um na sua senda, vão trabalhando em sinergia para a dinamitação da Língua Portuguesa.
Hoje, se um professor corrigir a fala de um aluno, ele está sujeito a ser acusado e quiçá processado por constrangimento e "preconceito linguístico". Sim, essa expressão, "preconceito linguístico", existe. A maioria dos advogados, é bem verdade, a escreve com "s", preconseito, mas que ela existe, existe.
E o motivo desse desmanche da Língua Portuguesa, não obstante canalha, não tem nada de misterioso, de sub-reptício; antes pelo contrário, é dos mais evidentes : acabando-se com as palavras, extingue-se também com a estrutura do pensamento, com as mínimas organização e hierarquia das ideias. É puro George Orwell! Mais 1984, impossível.
Quando é que um povo com um vocabulário de música sertanejo universitário poderá, um dia, se organizar como nação? Nunca. Jamais. Em tempo algum. Como lutar por suas necessidades, prioridades e urgências se não consegue bem verbalizá-las, botá-las no papel? Como reivindicar seus reais direitos e não ser enganado pelas migalhas que lhe são jogadas para lhe apaziguar os ânimos, as eternas esmolas?
Sem a palavra, só sobra o som, desordenado e caótico, só resta o barulho; à manada, só resta  seguir em anuência o portador do berrante. Sem a palavra, à manada, só resta o mugido. E como gosta de mugir, a manada. Como fica feliz com isso.
O motivo de todo esse meu falatório é que, dia desses, eu, na sala dos professores, a cumprir uma "janela" entre a quarta e a quinta aula, peguei um livro que estava em cima da mesa, de Português, e passei a folheá-lo. Gosto de folhear livros de Português.
Ao abri-lo aleatoriamente, caí em capítulo que abordava justamente essa questão, a linguagem formal e culta versus a linguagem coloquial, que, desgraçadamente, nos últimos tempos, vem sendo consagrada pelo uso como correta.
Do meu "lado", também execrando essa avacalhação toda, estão ninguém mais ninguém menos que Ferreira Gullar, um dos maiores poetas, escritores e ensaístas brasileiros (falecido em 2016) e o filólogo, gramático e professor de português e latim Napoleão Mendes de Almeida, falecido em 1998, de quem recomendo demais, aos que gostam de bem falar e escrever, o Dicionário de Questões Vernáculas.
Ouçamos, primeiro, Ferreira Gullar, em um artigo escrito para o jornal Folha de São Paulo, em março de 2012:
 
 
 Agora, mais mordaz e visceral, Napoleão Mendes de Almeida :
 
Pois eu estou com eles e não abro.
Pra finalizar, um verso da canção Língua, do Caetano Veloso : "gosto de sentir a minha língua roçar a Língua de Luís de Camões".
E é isso. Como diria Pasquale Cipro Neto.