Uso a internet, diariamente. Salvo quando viajo, quando fico três, quatro dias fora de casa; aí faço questão de não só não carregar computador e similares comigo como também de não me aproximar de nenhum desses aparelhos caso os haja por perto.
Uso a internet, diariamente. Para checar meu cada vez mais vazio e-mail, para me inteirar das principais notícias do triste cenário nacional, conferir a previsão do tempo em dias que parecem anunciar chuva - dado essencial para que anda a pé -, eventualmente, uma pornografia salutar e básica - aquela coisa de duas gostosas se engalfinhando e colando velcro, e, principalmente, para tentar manter alimentado este meu frugal blog.
O Marreta do Azarão é o meu bichinho virtual, a quem tenho que alimentar com a maior frequência possível; quando o número de acessos diários ao blog começa a cair, significa que o bichinho está a entrar em um quadro de desnutrição e desidratação. E lá vou eu, hidratá-lo e nutri-lo com qualquer besteira, disparate ou desatino que me passar pela cabeça. O Marreta do Azarão é o meu tomagotchi.
Uso a internet, diariamente. Contudo, não adiro, tampouco compartilho o mínimo entusiasmo por seus modismos-relâmpago. Não tenho facebook. Nunca tive o tal do orkut; há por lá algumas comunidades a meu respeito, todas mui "respeitosas", e mesmo uma página falsa montada por um safado de um aluno, que conseguiu, sorrateiramente, obter uma foto minha com seu celular, mas minha, nunca tive. Fotos e vídeos virais? Faço o trajeto inverso do típico internauta, corro deles, evito, recuso-me mesmo em assisti-los; aliás, corro para mais longe e mais rápido ainda do sujeito que orgulhosamente se declara um internauta. Fui bem escolarizado, meninos, falou que é viral, mantenhamos distância. Instagram e WhatsApp (esse eu tive que ver no Google como se escrevia)? Sinceramente, não faço ideia do que se tratam.
Assim posto, não é de se estranhar que até ontem, apesar de muito já ter ouvido dizer, eu não soubesse o que era o tal do "Balde de Gelo", e poderia ter morrido tranquilamente sem essa valiosa informação.
Acontece que, inadvertidamente, mais por fastio de continuar a acionar o controle remoto do que por interesse no programa em questão - fim de domingão é foda, dá um leseira desgraçada -, acabei parando num desses dominicais da Tv aberta, o Domingão do Faustão.
E lá fiquei sabendo do balde de gelo. A ideia é das melhores, admito, das mais nobres. A campanha foi lançada por amigos do jogador de baseball Pete Frates, diagnosticado com esclerose lateral amiotrófica (ELA), como forma de despertar o interesse das pessoas para a doença e arrecadar fundos para pesquisa.
É uma espécie de uma corrente : uma pessoa toma banho de água gelada, divulga o vídeo na internet e desafia três outras pessoas - de preferência, nomes públicos, esportistas, políticos, celebridades - a cumprirem a prova. Inicialmente, quem não quisesse jogar o balde de água e gelo, deveria doar U$ 100,00 à ALS Association, órgão de sem fins lucrativos. No entanto, os adeptos da brincadeira passaram a fazer as duas coisas. No Brasil, as doações podem ser feitas para Associação Pró-Cura da ELA e para Abrela.
Se todo o dinheiro doado chegará de fato às mãos devidas, já é outra história. Se as pessoas que topam o desafio, fazem isso como forma de uma autopromoção eficiente e baratíssima - convenhamos, um artista ou um político estampar a capa de uma revista de grande circulação por meros 100 dólares é uma pechincha em termos publicitários -, também já é outra conversa. Nesses casos, eu ponho a marreta um pouco de molho : o pouco que ajudar, já se mostra de bom tamanho.
Aproveitando a campanha do Balde de Gelo e valendo-se da máxima de Antoine Lavoisier - "Na natureza, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma" -, o jornalista palestino, Ayman al-Aloul, iniciou no sábado passado o movimento do Balde de Escombros.
No vídeo, o palestino aparece sendo banhado pelos escombros de uma zona de guerra da Faixa de Gaza.
"Tinha que fazer alguma coisa e mandar uma mensagem para todo o mundo sobre Gaza", disse Ayman al-Aloul. "Pareceu-me uma boa ideia mostrar toda a realidade, como Gaza está agora, escombros, destruição, cimento, areia, pedras", acrescentou.
E agora, finalmente, entra a minha marreta, ou acharam que não iria sobrar chumbo pra ninguém?
Inspirado pela campanha do Balde de Gelo, agora pela do Balde de Escombros e valendo-me da máxima de Abelardo Barbosa, o Chacrinha, garoto levado da breca, que também verteu Lavoisier aos seus propósitos - "Na televisão, nada se cria, tudo se copia" -, lançarei neste momento, sem esperar, lógico, grandes êxitos, êxito algum, em verdade, a campanha do Balde de Bosta.
Pelos doentes de ELA, pelos palestinos, pelos sem-teto, pelos sem-terra, pelos indígenas sem-latifúndio? Porra nenhuma. Nada disso.
Lanço a campanha do Balde de Bosta em prol da educação brasileira. Como uma forma de chamar a atenção para a sua real situação. Metáfora mais precisa, eu não poderia querer, nem encontrar. Nem eu nem ninguém.
O procedimento é de simples execução. Cada nobre docente defeca em um balde e despeja sua própria merda sobre si. Não há a necessidade de doação monetária - querer que professor, com o salário que ganha, ainda doe alguma coisa, é contrariar a já citada Lei de Lavoisier, é querer criar matéria do nada. Embostear-se, nesse caso, é sacrifício suficiente.
E não é necessário, como se trata de um ato simbólico, encher plenamente o balde de bosta, se bem que eu conheço professores que comem o bastante para tal feito. Defeca-se um pouco, completa-se o volume com água, adiciona-se um tanto da velha, eficiente e quase esquecida creolina, para efeito de matar as bactérias fecais, e pronto, é só banhar-se na merda e lançar o desafio a mais três outros colegas de trabalho.
O ideal é que o Balde de Bosta não fique restrito à já naturalmente cagada categoria docente, professor cagado é normal, não sensibiliza mais ninguém. Quanto mais o desafio for subindo na hierarquia educacional, tanto mais efetivo ele poderá se mostrar. Os professores enviariam o desafio para seus coordenadores pedagógicos, que o repassariam para seus diretores, estes para seus supervisores, daí para os dirigentes de ensino, deste ponto para o Secretário da Educação do Estado de São Paulo e, finalmente, chegaria ao gabinete do governador Alckmin.
Aliás, aproveitando que é ano eleitoral, e sendo bem sabido que político em época de campanha topa tudo, o desafio do Balde de Bosta deveria ser proposto a todos os candidatos ao governo do Estado.
Eu voto naquele que topar! Não só voto, faço-lhe também uma aguerrida e favorável campanha.
Quem se habilita?