segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Anderson Silva, R.I.P. (Ou, a Aranha Tem Mais Pernas Que o Gato, Vidas)

Só fui assistir ao vídeo da fatídica revanche Anderson Silva x Chris Weidman agora.
Quando da primeira derrota de Anderson "The Spider" Silva, eu escrevi aqui que ela havia sido proposital. Anderson Silva teria planejado sua queda para se livrar do peso de ser campeão - ser campeão num mundo de merdas é uma merda, ninguém descansa até que o campeão fraqueje, ninguém sossega até ver o campeão reduzido ao comum, o apetite dos parasitas só é saciado quando não restar mais sangue e pele sobre os ossos, quando não restar nem mais os ossos.
Disse e reafirmo minha impressão : a primeira derrota de The Spider para Weidman não foi para Weidman, foi para Anderson Silva. O homem Anderson Silva derrotou o campeão The Spider, perdeu propositalmente para Weidman, sorte de Weidman, poderia ter sido para qualquer outro.
A auto-humilhação, no entanto, não deu a Anderson o descanso esperado, o esquecimento planejado - o esquecimento é o maior dos troféus. Fãs e, principalmente, empresários e patrocinadores ainda farejavam resquícios de sangue no cadáver de The Spider. Pressão contratual daqui, pressão publicitária de lá, pressão, digamos assim, patriótica acolá, de fãs que queriam tornar Anderson uma vergonha para o esporte nacional, e Anderson Silva capitulou. Aceitou envergar mais uma vez o manto e a máscara de The Spider.
Com a mesma intensidade que acredito na premeditação da primeira derrota, acredito que Silva quis vencer a revanche. Quis, de fato. Treinou duro. Resgataria seu orgulho e anunciaria, num suspiro de alívio, o encerramento de sua carreira. Sua tão ansiada aposentadoria.
O Destino, esse velho safado e escroto, talvez tivesse para Anderson Silva os mesmos planos que o próprio lutador, o de aposentá-lo. Mas por outros meios. Através de um chute descuidado, um chute mal dado, chute indigno para qualquer campeão, chute de que só os amadores mais inabilodosos seriam capazes.
The Spider chutou a canela de Weidman e sua perna se colocou numa posição anatômica nada recomendável, fraturou-se, estilhaçou-se. A luta estava terminada. The Spider derrotado. Simples e doloroso assim. A aposentadoria, agora, é certa.
The Spider - o Aranha - quebrou uma de suas pernas, do total de seus oito apêndices articulados, como também são oito os lados do ringue no qual se consagrou, o óctogono, e o qual tornou mais sagrado para os admiradores do esporte.
The Spider perdeu uma perna. Sete sobraram para Anderson Silva, tantos fôlegos quanto possui um gato, o que, convenhamos, não é nada mau. Será uma longa vida para Anderson Silva.
Não sou aficcionado por vale-tudo, MMA, ou qualquer que seja o nome que se dê, tampouco acompanhei a carreira de Anderson Silva antes da primeira luta com Weidman. Aliás, não acompanho a carreira de quem quer que seja, lutadores, atores, músicos, escritores etc. Muito a contragosto, por falta de opção, acompanho muito mal a minha.
De qualquer forma, deixo aqui minha reverência a The Spider, campeão é campeão, e fim de papo. E declaro minha imensa inveja a Anderson Silva : poucos - e agraciados - são os que, feito ele, têm a chance de morrer e continuarem com suas vidas. Para a maioria de nós, a morte é literal, implacável, definitiva.
Para os verdadeiros campeões, a vida dá uma segunda chance, concede-lhes uma revanche.

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Florbela Espanca, o Crisântemo Roxo que Descora

Em conceito, gosto de poesia. Na prática, tenho pouca paciência para ela. Poucos são os poetas sobre cujas obras consigo deitar os olhos mais atentamente, mais demoradamente. Manuel Bandeira, Augusto dos Anjos, Álvares de Azevedo, Álvaro de Campos, e mais uns três ou quatro.
E tem Florbela Espanca. Geralmente, não gosto de poetisas. Homem faz poesia muito melhor que mulher.
Antes que alguma feminista suvacuda e de peitos caídos resolva botar meu nome na boca do sapo, direi duas coisas : a primeira é que é verdade, e a segunda é que tenho uma hipótese para a superioridade poética masculina.
Mulher pode até ser mais sensível e coisa e tal, mas suporta bem mais e melhor a dor que o homem, talvez até por sua natureza de parir. Mulher aguenta a dor calada, não costuma reclamar por coisa pequena.
E o que é a poesia se não o choramingar por qualquer dorzinha, a autopiedade por qualquer revés, o fingir dor? Por isso, poetas homens são melhores, muito melhores que as mulheres. Homem chora e reclama por qualquer porcaria, e de tanto ficarem chorando as pitangas, óbvio, acabam se tornando melhores em tal ofício, mestres do exagero. O poeta é um exagerado.
Pois Florbela escreve como homem. Publicou duas obras em vida : Livro de Mágoas (1919) e Livro de Sóror Saudade (1923). O que, cronologicamente, a colocaria no Modernismo Português, cronologicamente...
Não tenho formação específica em letras nem em literatura, mas me parece que Florbela é muito mais segunda geração do romantismo - a geração do Mal do Século - do que Modernismo. Todos os elementos dos ultrarromânticos estão em Florbela : individualismo (o EU é tema recorrente em seus sonetos), dúvida, desilusão, melancolia, solidão, fuga, tédio, certa morbidez e atração pela morte, ou seja, o genuíno spleen byroniano. 
E mais : Florbela tentara o suicídio por duas vezes antes de ser diagnosticada com edema pulmonar, em 1930, o que a levou a uma terceira e exitosa tentativa, morreu aos 36 anos por overdose de barbitúricos. Não foi de tuberculose nem aos 21 anos, mas impulsionada por um edema pulmonar e aos 36. Puro mal de século.
Curiosidade : Fagner, que não é bobo nem nada, musicou dois poemas de Florbela Espanca, Fumo e Fanatismo.
Abaixo, dois sonetos de Florbela.

Eu
Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada ... a dolorida ...

Sombra de névoa ténue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida! ...

Sou aquela que passa e ninguém vê ...
Sou a que chamam triste sem o ser ...
Sou a que chora sem saber porquê ...

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver
E que nunca na vida me encontrou!

Dizeres íntimos
É tão triste morrer na minha idade!
E vou ver os meus olhos, penitentes
Vestidinhos de roxo, como crentes
Do soturno convento da Saudade!

E logo vou olhar (com que ansiedade! ...)
As minhas mãos esguias, languescentes,
De brancos dedos, uns bebês doentes
Que hão-de morrer em plena mocidade!

E ser-se novo é ter-se o Paraíso,
É ter-se a estrada larga, ao sol, florida,
Aonde tudo é luz e graça e riso!

E os meus vinte e três anos ... (Sou tão nova!)
Dizem baixinho a rir: “Que linda a vida! ...”
Responde a minha Dor: “Que linda a cova!”

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

Então É Natal...

Para o Leitinho, que sentiu falta de meus tradicionais cumprimentos natalinos...
 Então é Natal... O Natal do jeito que a Simone gosta. E nós, também!!!

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Pequeno Conto Noturno (37)

- Tô com aflição.
- Das brabas?
- Das brabas - confirma Rubens à Veridiana.
- Das que você aplacava andando pela madrugada? De quando você caminhava e caminhava sem parar?
- Pior.
- Pior?
- De quando eu voava.

Pequeno Conto Noturno (36)

- E ainda falta muito para se aposentar?
- Nem faço as contas. Mesmo que as soubesse fazer, não as faria. Não gostaria do resultado.
E Rubens vira o copo, toma um, dois, três goles consecutivos do gim trazido por Celina. Já tomara gim antes, algumas poucas vezes, há muito tempo, nunca foi de suas preferidas. Lembrou que o gim lhe parecia aquelas colônias pós-barba coloridas, que ficavam em enormes vidros nos antigos salões dos antigos barbeiros, ao lado da navalha e do gral em que se fazia a espuma de barba. Com a garganta em brasa e a lhe xingar de filho da puta, constatou que ainda lhe parece.
- Que pena - segue Celina - que você não se encontrou em sua profissão...
- Eu nunca me encontrei em nada. Na profissão, não seria diferente.
- Deixa de fazer tipo, Rubens. Duvido que você tenha sido sempre esse cara amargo, descrente, desesperançado. Você já deve ter gostado de algumas coisas na vida.
Diz isso, pensa Rubens, porque nunca viu as fotos de minha infância, sobretudo a de um pôster, quando de meus 7 ou 8 anos. Mas Rubens opta por não entrar em detalhes, encurtar a conversa de psicanalista da madrugada. Toda mulher tem quê de psicanalista. Sorte - delas - terem a buceta.
- Sim, já gostei.
- Tá vendo, só, você já encontrou em algo, ainda que temporariamente.
- Nunca me encontrei no que eu gostava. Me escondia atrás.
- ????
- Pode parecer uma sutil ou mesmo inexistente diferença, mas ela é gritante. O que eu gostei sempre me serviu de máscara, de escudo, nunca de ninho, de remanso, de lápide a proclamar um dever cumprido num túmulo à sombra de um cipreste. 
- Acho que o gim está forte demais para você...
- Sempre usei as poucas coisas de que gostei - o que é muito diferente de acreditar nelas, se identificar com elas, ou se dedicar a elas - para me conferir uma aparente normalidade, para evitar perguntas, para passar, tentar passar, despercebido pelas pessoas. As pessoas não gostam das pessoas que não se identificam com nada, que não põem uma coleira em si mesmos, que não se autopirografam com um ferro de marcar gado. Não pertencer a nada significa não poder ser manipulado, comprado, chantageado, significa que nada lhe pode ser tirado. Isso incomoda, dá medo nas pessoas.
- Não se encontrar é ser feliz? Dá aqui esse copo, que vou fazer um café forte pra você tomar, injetar na veia.
- Acho que não se encontrar é ser livre, inclusive para pensar que não é importante ser feliz, que a felicidade é uma merda, ou pelo menos sua busca a todo custo, descabida, que a felicidade não existe. As pessoas me viam fazendo coisas e pensavam que eu havia me encontrado, me identificado, me enquadrado, isso tirava suas atenções de sobre mim. Serviram para isso a escola, depois a faculdade, minhas coleções de livros, discos e gibis, meus amigos, o meu primeiro amor e os dois ou três outros subsequentes. Gostava deles, gostei deles, mas nunca me encontrei neles, sempre me escondi atrás, ou por sob. Acho que foi nisso que sempre me encontrei, a que sempre me dediquei, me esconder do mundo.
- E a bebida, Rubens? Gosta dela, se encontra ou se esconde atrás dela?
- Eu fujo, através da bebida eu fujo.
- E no dia em que você se cansar de fugir, de correr?
- Tenho boas pernas.
Celina ri, e desiste. Enche o copo de Rubens.
- Falando em boas pernas - Rubens mudando totalmente o rumo da conversa -, não acha que está na hora de você abrir as suas de novo?
As pernas de Celina se abrem, um vasto tufo de pelos revoltos se revela, despudorado. Ela os deixara de aparar a pedido dele.
Rubens se abaixa e mete o nariz por entre os pentelhos. Cheiro de secreção nova, a preparar terreno para a nova foda, e de secreção velha, seca, azeda, grudada, da foda anterior. Rubens sobe a língua, cu, períneo, uma navalha a fender e a separar os pequenos e grandes lábios de Celina.
- Você gosta dela, né? - Celina, em fala entrecortada.
- Me escondo nela.
Celina cruza as pernas em torno da cabeça de Rubens, à altura de suas orelhas, aperta-o e o puxa mais para si. Puxaria-o para dentro, para sempre, possível fosse. Rubens está absorvido, fagocitado pela buceta de Celina. Cego, surdo e mudo. Isolado do mundo. Como sempre gostou.

domingo, 22 de dezembro de 2013

Um Dia Se Dará a Verdadeira Evolução

Elas Fodem, Ops, Podem

Dilma comete infração de trânsito e pede desculpas pelo erro
Quando transportadas em veículos automotivos, crianças de 1 a 4 anos devem ir no banco traseiro e acomodadas no dispositivo de segurança conhecido como "cadeirinha".
De acordo com resolução do Contran (Conselho Nacional de Trânsito), o objetivo da "cadeirinha" é "estabelecer condições mínimas de segurança de forma a reduzir o risco ao usuário em casos de colisão ou de desaceleração repentina do veículo, limitando o deslocamento do corpo da criança". 
Desobedecer à essa resolução é considerada falta gravíssima, acarretando sete pontos na carteira de habilitação do condutor do carro, multa de R$ 191,54 e retenção do veículo até a resolução da irregularidade. 
Pois Dilma Rousseff cometeu essa falta gravíssima - mais essa falta gravíssima. Foi flagrada no banco traseiro de um automóvel com o neto de 3 anos no colo, no trajeto entre a casa de sua filha e a casa do avô do menino.
"Estive hoje na casa da minha filha e, de lá, levei meu neto à casa do avô, que fica no mesmo bairro. Meu neto foi abraçado comigo no banco de trás. Foi um erro. A legislação de trânsito é clara: criança tem que andar na cadeirinha. Peço desculpas pelo erro." 
Desculpas? Só isso? Desculpa é o caralho! E ainda por cima as desculpas foram pedidas via o abominável twitter. Comete uma infração gravíssima, entra no twitter, pede desculpas e fica por isso mesmo?
Dilma foi mais longe na cara de pau e na certeza da impunidade que seu antecessor, Lula, o ex-informante do Dops de Codinome Barba. Lula disse que não sabia de nada. Dilma admitiu que sabia da lei, infringiu-a em plena consciência, disse que foi um erro e desculpou-se. Fim de papo.
Tenho um colega que foi pego com a viseira do capacete erguida até a metade, foi multado e perderá sua carta por 90 dias ainda nesse mês. Ele tentou de tudo, recorreu da forma que foi possível, mas de nada adiantou. Ele só se esqueceu de uma coisa : abrir uma conta no twitter e pedir desculpas pelo erro.
Fica aqui a dica de Dilma Rousseff - a famosa companheira Estela da época das guerrilhas - para os infratores de trânsito : peçam desculpas ao guarda que lhes autuar.
Ela fode, ops, pode.

Após 31 anos, Marina Silva é exonerada do quadro de professores da rede do Acre
Eu nem sabia disso, mas Marina Silva foi professora da rede pública do estado do Acre - e eu que reclamo das escolas públicas daqui. E foi "professora" até há muito pouco tempo. Para ser mais exato, até essa sexta-feira última, dia 20/12, quando da publicação de sua exoneração no Diário Oficial do Governo do Acre.
Marina Silva ingressou em 1982 no quadro professoral de seu estado e trabalhou muito pouco com o giz na mão. Logo, em 1990, elegeu-se deputada estadual, daí para frente, foi só vida mansa. Marina Silva se afastou das salas de aula para exercer suas funções legislativas, mas não largou do osso, continuou no cargo de professora.
Desde 1990 que Marina Silva não sabe o que é uma sala de aula, há 23 anos que ela ocupa um cargo que não exerce. E pelo qual, segundo a própria, também não recebe. Se assim for, menos mau. Diz que desde o início de sua carreira política, tem recorrido a afastamentos do cargo sem ônus aos cofres públicos. De qualquer forma, um cargo ficou impedido de ser ocupado por outro professor, mais disposto ao trabalho.
Eleita senadora em 1994, foi reeleita em 2002. Com o fim do mandato no início de 2011, após ficar em terceiro lugar na disputa pela Presidência, Marina solicitou um novo período de afastamento, desta vez recorrendo à "licença para tratar assuntos particulares".  
Não sei lá nos cafundós do Acre, mas um professor da rede pública do estado de SP pode se afastar sem remuneração de seu cargo por um período máximo de dois anos, ao fim do qual, ele tem que decidir se caga, ou se sai de trás da moita, se reassume o cargo, ou se exonera.
Será que a legislação do Acre é tão mais elástica assim? Mais de 20 anos de afastamento sem remuneração?
Um especialista opina sobre a questão:
Para o advogado Edinei Muniz, especialista em administração pública, a ex-ministra do Meio Ambiente deveria ter sido processada por abandono de emprego, pois não voltou a lecionar em fevereiro, quando expirou a licença.  Segundo ele, houve um crime contra a administração pública, ao Marina não ser notificada pela Secretaria de Educação por abandono de emprego. Além disso, Muniz afirma que a secretaria cometeu improbidade administrativa ao conceder a exoneração com efeito retroativo a fevereiro, o que não poderia ter ocorrido.
Marina se defende:
"Com a agenda que tenho, não me atentei quando isso [a licença] ia terminar. Mas eu tinha no meu radar de que eram apenas por dois anos. Mas obviamente eu não era funcionária renumerada e não estava dando nem prejuízo aos cofres públicos", afirmou."Quando me dei conta de que havia extrapolado o período de licença, entrei com o pedido de exoneração", completa. 
Ou seja, igualmente à Dilma Rousseff, Marina Silva simplesmente pediu desculpas.
Que pena, hein, Marina? Logo agora, tão perto de se aposentar como docente...
Ela também fode, ops, pode.

sábado, 21 de dezembro de 2013

Que Fossa, Hein, Reginaldo Rossi, Que Fossa...

Ontem, a autêntica música popular brasileira perdeu um de seus mais diletos e pitorescos representantes, Reginaldo Rossi, aos 69 anos, fraquezas lá dos pulmões.
Se Odair José é o cantor padroeiro das empregadas domésticas, Reginaldo Rossi o é dos garçons.
O garçom é figura onipresente em todos os casos de cornagem mal resolvida, de bebedeira para apaziguar a honra do chifre ferido. Contudo, comum e injustamente, o garçon é sempre aquela figura que passa ao fundo da cena, um mero figurante do drama diário dos que envergam a famosa peruca de touro.
Nada mais injusto. O garçom não é apenas o cara que carrega a bandeja. Ele presta um enorme e imprescíndivel serviço social, dar ouvidos ao corno desiludido. Sabe-se lá quantos e quantos cornos não teriam perdido a cabeça e matado suas traidoras e respectivos ricardões, ou mesmo posto fim à própria vida, se não fosse a certeza de encontrar o ombro amigo do garçom no bar mais próximo?
O garçom é o CVV do corno!
Todos cantam, cantaram e sempre cantarão o chifre, o inesgotável combustível de nossa música, o pré-sal de nosso cancioneiro. De Amado Batista a Chico Buarque, de Waldick Soriano a Tom Jobim, de Bartô Galeno a João Gilberto, de Diana a Dolores Duran, passando por Maísa e Ângela Ro Ro, todos já cantaram o chifre, mas ninguém cantara em honra aos garçons.
Pois Reginaldo Rossi lhes fez justiça. Trouxe os garçons para a frente da câmera, para o plano principal. Fê-los protagonistas de um dos episódios mais corriqueiros dessa nossa divina comédia humana.
A história da música nos chega pela boca do próprio Rossi, que tinha acabado de levar um baita de um chifre e ido ao bar beber, desabafar com o garçom :
"Eu saí pra o bar, comecei a beber, a chorar...  Aí o garçom chegou junto de mim e disse, Rossi, por que tão triste, por que chorando tanto? Eu disse, garçom, acabei de levar o maior chifre da minha vida. Ele disse, deixa pra lá, Rossi, faz uma música. Aí, eu disse, é mesmo. Aí peguei um papel e comecei a escrever a letra do Garçom, terminei, mostrei pra ele e ele disse, tá ótimo. Eu disse, tá boa, será que vai fazer sucesso? Ele olhou dentro dos meus olhos e disse, Rossi, vai ser o maior sucesso. Eu disse, por quê? Ele olhou pra mim outra vez e disse, porque você não é o único corno do Brasil."
Garçom
(Reginaldo Rossi)
Garçom
Aqui, nessa mesa de bar
Você já cansou de escutar
Centenas de casos de amor

Garçom
No bar todo mundo é igual
Meu caso é mais um, é banal
Mas preste atenção, por favor

Saiba que o meu grande amor
Hoje vai se casar
Mandou uma carta pra me avisar
Deixou em pedaços meu coração

E pra matar a tristeza
Só mesa de bar
Quero tomar todas
Vou me embriagar
Se eu pegar no sono
Me deite no chão

Garçom, eu sei
Eu estou enchendo o saco
Mas todo bebum fica chato
Valente, e tem toda a razão

Garçom, mas eu
Eu só quero chorar
Eu vou minha conta pagar
Por isso eu lhe peço atenção

Saiba que o meu grande amor
Hoje vai se casar
Mandou uma carta pra me avisar
Deixou em pedaços meu coração

E pra matar a tristeza
Só mesa de bar
Quero tomar todas
Vou me embriagar
Se eu pegar no sono
Me deite no chão

Reginaldo Rossi, 1944 - 2013

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Jesus Ama Astros Pornôs

O superaquecido mercado das igrejas evangélicas anda cada vez mais competitivo. Cada vez mais é preciso competência para se estabelecer no ramo da fé cristã. Iniciativas ousadas e criativas se fazem necessárias para os que quiserem se lançar à acirrada disputa pela fé - e, óbvio, dos dízimos - dos idiotas.
A questão é que há idiotas de todos os tipos dispostos a depositar uma grana nos bolsos dos pastores para obter benefícios de deus. É praticamente impossível umas poucas igrejas atenderem às necessidades de um público tão heterogeneamente tapado, com "pecados" tão diversos a serem perdoados - há muito peixe no barril, e muito poucos anzóis.
Mas todos crentes com algo em comum : predispostos a se desapegar de seus bens materiais, doá-los a um deus inexistente. Basta que se jogue o anzol certo, que se saiba a isca a ser usada.
Assim, independente de cor, credo, classe social, grau de instrução, nacionalidade, condição financeira, idade ou sexo, a ideia das igrejas é que não reste sobre o planeta um único humano não pagador de dízimo.
Para isso, as denominações evangélicas têm se multiplicado mais que os pães e peixes do Cristo. Multiplicado e se segmentado, para atender os mais variados anseios dos mais diferentes crentes. Segmentar para agrupar, bem podia ser o lema das atuais igrejas, dividir para conquistar.
E qual o maior anseio de um crente se não aplacar o seu já famoso e folclórico cu quente? Sim, quem acolhe em Cristo os crentes do cu quente? Quem oferece conforto e lenitivo espiritual para as suas pregas ardentes? Quem os aceita e os guia no caminho para Cristo e para luz?
A resposta é : a XXX Church. Em inglês, três letras X consecutivas, XXX, identifica filmes ou quaisquer outros produtos de teor sexual e explícito.
O crente-alvo da XXX Church são os profissionais ligados ao sexo, os dispostos a abandonar a luxúria e trilhar o insuportável caminho da abstemia que leva a Cristo - prostitutas, travestis, michês e, principalmente, atores da indústria do cinema pornô.
A XXX Church despontou em Michigan, nos Estados Unidos, há cinco anos, criada por um grupo de jovens pastores, que, tenho certeza, devem ser uns baitas duns punheteiros arrependidos. Empunhando a Bíblia, os pastores pornôs, como se autointitulam, invadem os sets de filmagem, na tentativa de tirar alguns atores da carreira. Mas garantem que recebem da mesma forma em suas igrejas aqueles que não desistem da profissão.
Bela desculpa para se assistir a uma foda de graça, a uma suruba sem ter que pagar locação de filme : invadir sets pornôs.
No Brasil, lógico, a ideia já pegou e possui propagadores. É o caso do pastor Giuliano Ferreira, 29 anos, ex-ator pornô com mais de 300 filmes no currículo. Ele comanda a Assembléia de Deus Ministério de Madureira, em Ribeirão Bonito, interior de São Paulo.
Giuliano entrou para a indústria pornô em 1999. Trabalhando "duro", conseguiu comprar três casas e ajudar a família. "Mas a angústia crescia junto com a prosperidade financeira", afirma. Largou tudo quando alguns colegas contraíram o vírus da Aids. "Era um sinal para eu parar."
Quer dizer que o deus de Giuliano tacou AIDS num monte de gente ao seu redor só para lhe dar o aviso de que estava na hora de pendurar a pistola? Bonzinho esse deus. Não seria mais fácil simplesmente aparecer e dizer?
O templo oficial da XXX Church fica em Las Vegas, uma das mecas do cinema pornô. A igreja não invade só sets pornôs : em feiras eróticas, pregam a conversão a Cristo e vendem camisetas em que se lê "Jesus ama astros pornôs". 
Jesus ama astros pornôs! E quem não os ama? Eu também os amo! As atrizes, ao menos. O Azarão também ama astros pornôs! Então, enviem os seus dízimos para o Marreta, ora porra!!!

Humanos Transgênicos

Obra de Liu Xue
"Doze vozes gritavam cheias de ódio e eram todas iguais. Não havia dúvida, agora, quanto ao que sucedera à fisionomia dos porcos. As criaturas de fora olhavam de um porco para um homem, de um homem para  um porco e de um porco para um homem outra vez, mas já se tornara impossível distinguir quem era homem, quem era porco." 
                                          George Orwell, A Revolução dos Bichos

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

E o Que Se Principiou Em Verde, Finou-se Em Roxo

Fundido ao sofá, 
Olho para o copo vazio, ressequido. 
E a um comando mental, 
Comando mental, não. 
Menos, bem menos disso, 
A um desejo 
Peixes-palhaço vêm da cozinha com garrafões 
E despejam bebida púrpura em minha taça. 
E correm, 
Escorregadios, vadios, mucosos, 
Para os entremeios peçonhentos 
Da samambaia pendente em meu teto 
(se teto da casa ou meu, dá no mesmo). 
Levo a púrpura aos lábios, à língua, ao palato nublado 
E saúdo os peixes-palhaço enredados, 
Porém livres, 
Na minha samambaia, 
Presos aos xaxins – bucetas vegetais 
(interlúdio para digressões, cochilares, ventos verdes de menta e atmosferas pesarosas de gloxínias). 
Ora o sofá reveste-se de minha epiderme, 
Áspero, seco, poros, pêlos e ácaros, 
Repleto de suores e imperfeições. 
Ora eu estou encapado de tecido azul, 
Tecido acelular, macio ao tato, resplandecente ao teto, 
Espumas que respiram, suspiram e, às vezes, riem. 
Somos líquen de um ser e um não-ser: 
Uma sinabiose proscrita. 
O copo de novo árido; 
Os garrafões, estéreis e atônitos. 
Lanço uns trocados, uns níqueis aos palhaços escamados, 
Que zarpam na cata de mais púrpura beberagem. 
Ao mercado mais próximo 
Ou a um que esteja em promoção 
Ou um que esteja aberto nessa hora de relógios distraídos. 
(interlúdio para lampejos de desmaios, alheamentos, flatos de fósforo branco, luares de Io e Titã). 
E os palhaços com guelras não retornam, 
Fugiram, embolsaram meus níqueis no cu. 
Sabe-se lá, afundaram-se abissalmente 
Na bebida púrpura da qual eram reles entregadores; 
Conspurcaram meus cobres em cinemas e pipocas de shopping centers; 
Ou – e aqui há uma possibilidade de perdão – 
Enfurnaram-se em puteiros de anêmonas-do-mar. 
Restamos, à espera, 
Eu, o sofá, o sofá-eu 
E minha samambaia, 
Estranhamente evoluída em salgueiro. 
A chorar, chorar, chorar. 
(e o que se principiou em verde, finou-se em roxo).

Presidenta Lula

Dilma Roussef, em atitude autoritária, sexista e, principalmente, inculta e iletrada, bem à imagem e semelhança de seu partido, sempre exigiu ser chamada de "presidenta", fazendo com o que o termo fosse adotado, inclusive, em documentos oficiais.
Quanto a isso, houve até aquele triste e patético episódio protagonizado por Marta Suplicy, outra mulherzinha do PT, outra feminista rídicula, encruada e fora de época. Em pleno pronunciamento de Sarney no Senado, a mãe do Supla tentou fazer com que o ex-presidente da república adotasse o termo "presidenta" ao se referir à Dilma Roussef, chegou-lhe às costas e cochichou-lhe aos ouvidos a "correção" a ser efetuada. 
Sarney não teve dúvidas, continuou a usar o vocábulo "presidente". A parlamentar do botox deveria ter ficado quieta, mas feministas são idiotas, chatíssimas, não sabem a  hora de parar. Marta Suplicy não se deu por vencida e saiu em defesa de sua classe : subiu ao púlpito do Senado, como se isso fosse o grande problema da nação, e corrigiu ao microfone, para todos ouvirem, a velha raposa José Sarney.
Tomou no cu, a Marta Suplicy. Perdeu uma grande oportunidade de ficar calada. José Sarney, em vários aspectos, é como todo político : safado, faz política para si e para os seus, se esbalda com dinheiro público etc; mas, diferente da grande maioria dos parlamentares, é homem culto, de letras, é membro da Academia Brasileira de Letras, sabe, literalmente, do que fala.
Respondeu polidamente à Marta Suplicy que sempre optou pelo uso da forma francesa, idioma do qual se deriva a palavra : "Muito obrigado a Vossa Excelência, mas sempre estou usando a fórmula francesa: ‘madame le président’. Todas as duas são corretas, senadora, gramaticalmente". Um risinho coletivo e abafado, daquele escondido pela mão, tomou conta do ambiente. Marta Suplicy ficou com cara de cu com botox e calou-se.
E Sarney, óbvio, está certíssimo. O principal argumento contra o uso de presidenta se baseia no fato de que na língua portuguesa existem os particípios ativos como derivativos verbais. Assim, quem ataca é “atacante” e não “atacanta”, mesmo em uma partida de futebol feminino. Dessa forma, o particípio ativo do verbo ser, que é “ente”, também não permitiria a flexão de gênero. Ela se daria apenas pelo artigo feminino que antecede a palavra. Portanto, a forma correta, segundo essa teoria, seria sempre a presidente, como é a estudante ou a gerente. 
A forma "presidenta" existe e é aceita por pura imposição, e por ser um cargo único e muito importante, ou seja, por lobby. Até na bela língua portuguesa cabe uma politicagem de vez em quando.
Alguém já viu algum médico exigir ser chamado de "ginecologisto"? Ou alguém dizer, vou ao "dentisto"? Ou, o Brasil é uma nação "emergenta"? Ou mesmo algum homem afiliado ao PT dizendo que é um "militanto petisto"? Não, né?  Só mesmo Dilma Roussef e sua defensora Marta Suplicy, repito, feministas rídiculas e despropositadas.
Mas enfim... Tanto Dilma fez que, finalmente, conseguiu ser chamada de presidenta. De Presidenta Lula. É isso mesmo.
Hoje, a petista viajou à capital paulista para participar da celebração de Natal dos catadores de material reciclável e de movimentos de população de rua, no Anhembi.
Antes de sua chegada, o apresentador do evento anunciou que "a presidenta Lula" estaria no ato. Depois de repetir isso duas vezes, deu pelo seu ato falho e tentou se corrigir dizendo que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva era um "mito" e um "gênio" para a categoria. 
Não tem nada do que se corrigir, meu caro catador de lixo, você acertou em cheio, a não pelo fato de ter chamado Lula de gênio. Se Dilma quer realmente dar nome aos bois, que eles sejam dados. Ela pode até ser a presidenta oficial do país,  mas os fios que a manipulam são puxados pelo ex-presidente Lula.
Um ato falho, como o desse catador de lixo, diz geralmente mais verdades que um discurso pensado. E o ato falho - não obstante, certeiro - do catador de lixo veio de sua experiência profissional, veio da familiaridade com o que estava a apresentar : lixo. Reciclagem de lixo. 
Ao anunciar a presença da Presidenta Lula, ele, de forma precisa, estava a anunciar a reciclagem do lixo petista, Lula que virou Dilma que virará Lula, o que nunca deixou de ser.
Ainda no mesmo evento, Paulo Maluf e Fernando Haddad foram vaiados fragorosamente. De novo, valeu a experiência dos profissionais envolvidos. Quem é do métier (ou vocês acham que só o Sarney é que pode se valer do francês?) não se engana, reconhece e fareja o lixo à distância.
Para ver o vídeo de José Sarney dando um tapa com luva de pelica em Marta Suplicy, é só clicar aqui, no meu poderoso MARRETÃO.
Dilma Roussef, no referido evento. Será que iremos reconduzir essa senhora ao cargo político mais importante da nação? Iremos reciclar, mais uma vez, esse lixo?

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Codinome Barba

Entre 1983 e 1985, eu residi em São José dos Campos, época em que se deu o fim do governo militar, a transição para o que se chamou de A Nova República, ou a república de Ribamar. Foi também o auge da expansão do Partido dos Trabalhadores, o PT. Expansão não só numérica das fileiras dos barbudos vermelhos como também da confiança depositada no novo partido pelo povo brasileiro; acredito que fosse mais a necessidade de uma esperança do que propriamente confiança, mas, de qualquer forma, em confiança, em votos, ela começou a se materializar.
Era um partido recém-nascido, tinha o frescor e a carinha risonha e inocente própria dos bebês, nada depunha contra ele, parecia-nos que o PT fosse, ao menos, uma alternativa moral ao cenário político vigente. Considerávamos que os militares fossem os responsáveis por todos os males do Brasil, quiçá do universo. Demorou muito pouco tempo para que víssemos o quanto estávamos errados.
A esperança de uma nova política, de um novo país, tomava conta de todos os grandes meios de comunicação.
Mas por São José dos Campos ser uma cidade industrial, inclusive com algumas montadoras de automóveis, nos chegavam certos rumores, certos boatos - que muitas vezes são relatos mais confiáveis que as notícias oficiais das grandes mídias -, de que Lula não era um grevista legítimo porra nenhuma. Que o barbudo estava mancomunado com as próprias montadoras de automóveis, as greves eram organizadas de comum acordo entre o líder sindicalista Lula e os patrões. Os operários? Bucha de canhão, como sempre.
O esquema, diziam, era o seguinte : quando diminuíam as vendas de automóveis - era época de inflação galopante, 30%, 40% ou mais ao mês - e as montadoras não conseguiam escoar a produção, o patrão chamava o barbudo e decretava : que se faça a greve. Lula recebia uma grana e fazia a massa burra parar. Durante a greve, as montadoras economizavam nos salários dos funcionários e ganhavam tempo para esvaziar seus pátios. Quando os pátios esvaziavam, quando a produção já havia sido devidamente escoada, o patrão chamava Lula de novo e decretava : que se faça o fim da greve. E o barbudo ia lá e fazia a massa burra voltar ao batente. E se davam lá uns porcentinhos quaisquer de aumento para os operários, só para disfarçar.
De lá para cá, volta e meia, quando o assunto sai em uma roda de conversa, eu falo dessa história, e sempre tem um ou outro que também a conhece.
Consideremos, pois, que sejam verdade as greves combinadas entre patrões e o então sindicalista Lula : quem usa os "companheiros" operários como bucha de canhão, quem os entrega de bandeja aos patrões em troca de benefícios pessoais, pode muito bem entregar os companheiros de subversão a coisas piores, dependendo da necessidade, e proporcional ao benefício adquirido.
E parece que Lula fez mesmo isso. Para conseguir privilégios durante o seu tempo de xilindró no Dops, o barbudo entregou vários companheiros políticos ao regime militar. Lula não foi uma vítima do regime militar, foi um informante.
É o que afirma Romeu Tuma Jr. em seu livro O Assassino de Reputações, obra em parceria com Cláudio Tognoli, um dos maiores, se não o maior, repórteres investigativos do país.
Segundo Tuma Júnior, ao dar informações ao governo militar, Lula garantiu "privilégios" na prisão. O livro do delegado lista como privilégios noites de sono em um sofá do Dops e uma visita à mãe, dona Lindu, que estava gravemente doente. Ou seja, entregava todo mundo pro Dops. Era amigão de Tuma Pai.
Tuma Jr. em resposta a repórter da Revista Veja :
Veja - O senhor afirma no livro que o ex-presidente Lula foi informante da ditadura. É uma acusação muito grave.
Tuma Jr. - Não considero uma acusação. Quero deixar isso bem claro. O que conto no livro é o que vivi no Dops. Eu era investigador subordinado ao meu pai e vivi tudo isso. Eu e o Lula vivemos juntos nesse momento. Ninguém me contou. Eu vi o Lula dormir no sofá da sala do meu pai. Presenciei tudo. Conto esses fatos agora até para demonstrar que a confiança que o presidente tinha em mim no governo, quando me nomeu secretário nacional de Justiça, não veio do nada. Era de muito tempo. O Lula era informante do meu pai no Dops.
E o melhor ainda está por vir. Lula tinha um codinome, uma identificação de agente duplo, que era. Lula, ao passar informações de seus companheiros operários para o Dops, ocultava sua identidade sob o indecifrável codinome de Barba. Codinome Barba... Pããããta que o pariu!!!
Se até então a história de Tuma Jr. ainda tinha um quê de fantasiosa, agora ela se estabelece como a mais provável das verdades. Disfarçar Lula sob o codinome de Barba : é bem coisa dos autodenominados serviços brasileiros de inteligência, o SNI (Serviço Nacional de Informações), à época.
Fico a imaginar uma reunião sendo convocada pelos militares em caráter de urgência, para decidir sob qual disfarce o alcaguete Lula iria agir. Depois de muitas considerações, ponderações, depois de muitos codinomes sugeridos, depois de muitas brainstorms, um milico tem lá seu insight : Barba, o chamemos de Barba, escondamos o sindicalista Lula sob uma barba. Imagino-o sendo aplaudido e ovacionado, condecorado, até, ganhando mais uma estrela em suas dragonas, caso tenha sido um general.
O Dops e o SNI esconderam o Lula atrás de uma barba!!!! Lula, o Barba. Não tenho dúvidas : o relato de Tuma Jr. é a mais pura verdade!!!
Abaixo, autor e obra.

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Conselho Final de Classe e Série

Aumentar o índice de aprovação, e o fluxo, e o Idesp, e impedir o fechamento de salas de aula, garantindo o emprego do professor, e a autoestima dos alunos e de suas famílias, que, descompromissados que são muitas vezes, precisam crer na ilusão de estão a aprender algo sem o menor esforço, e as intenções de voto no governo da situação, e, principalmente, aumentar o BÔNUS do professores e gestores, a sua cesta de natal, o único raio de esperança de suas vidas, depois da aposentadoria, óbvio.
É uma cadeia alimentar de pequenos subornos : o governo suborna diretores, coordenadores e professores com o bônus - e mesmo aqueles que se dizem contra essa esmola esperam ansiosamente por ela, nunca vi um desses "idôneos" professores abrir mão de seu bônus, ou doá-lo -, os professores subornam os alunos com falsas notas e sensação de aprendizado para que eles continuem a frequentar a escola, não se evadam, e aumentem os índices do governo, índices que, uma vez divulgados em nas propagandas eleitorais, mantêm inalterado o jogo do poder.
Ou seja : é um esquema canalha no qual todos perdem e todos ganham. Por isso, o Sistema é inexorável, invencível, impossível de demolir.
E ai do quixote idiota que achar que pode derrotar o monstro morando no estômago da própria besta. Será moído a pancadas, triturado, pulverizado, dissolvido por suas engrenagens, para, logo em seguida, ser esquecido.
E ai do quixote idiota que achar que pode se opor verdadeira e efetivamente ao Sistema; para esse, o stress, a fadiga, a depressão, o infarto, o câncer e o pior : o psiquiatra.
Quixote ainda tinha lá sua lança torta, enferrujada e quebrada, os quixotes têm apenas seu giz branco, seus tristes sanchos panças. Mas a caneta é mais poderosa que a espada, diz o provérbio holandês. Por indução, o giz, mais poderoso que a lança.
Muito bonito. Bela frase de efeito. Mas, na prática, jamais ouvi uma besteira maior; na realidade, jamais uma irrealidade maior.

domingo, 15 de dezembro de 2013

O Mais Belo Suicídio

Quem disse que um suicídio não pode ser algo belo? Ou, pelo menos, narrado de forma bela? Chico Buarque, óbvio, insuperável como ele só, fez isso, magistralmente, em definitivo, em Construção. Ou você, fã de Chico como eu, que já cantarolou Construção um sem número de vezes, nunca percebeu se tratar de um suicídio? Pois é sobre o que a canção versa. O texto é todo de desprendimento e despedida.
O suicídio de um operário cansado do cotidiano tijolo com tijolo num desenho lógico, do sábado sem descanso, do feijão com arroz, de beijar sua mulher como se fosse a única.
O suicídio de um operário que, engenhosamente, disfarçou seu ato em um tropeço involuntário, fê-lo parecer um acidente de trabalho, para que ele próprio não fosse julgado covarde, para livrar sua família de qualquer sentimento de culpa por sua cabal decisão.
E, ao menos, por infinitesimais divisões de tempo, flutuar no céu, ser um náufrago, ser um bêbado princípe, não ser uma máquina, ser um pássaro. Dizem que nada explica o suicídio, menos ainda o suicida. Explica, sim : o desejo de ser pássaro.

Construção
(Chico Buarque)
Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego.

Amou daquela vez como se fosse o último
Beijou sua mulher como se fosse a única
E cada filho seu como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado
Subiu a construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego
Sentou pra descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo
Bebeu e soluçou como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo
E tropeçou no céu como se ouvisse música
E flutuou no ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público.

Amou daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contramão atrapalhando o sábado.

Por esse pão pra comer, por esse chão pra dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir
Deus lhe pague
Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça e a desgraça, que a gente tem que tossir
Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair
Deus lhe pague
Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir
E pelas moscas bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir
Deus lhe pague.

sábado, 14 de dezembro de 2013

Cerveja é a Base da Civilização

O desenvolvimento da agricultura pelo ser humano o livrou do jugo da sazonalidade com que a natureza lhe provinha com alimentos e víveres vegetais, permitiu-lhe, aos poucos, abandonar sua natureza nômade e coletora.
O advento da agricultura, há aproximadamente 11 mil anos, um pouquissimo só antes do Raul Seixas nascer, veio, portanto, da necessidade, a suposta mãe de toda invenção, do ser humano melhor fixar suas moradias e melhor abastecer de alimentos as seus bandos, as suas tribos, os seu clãs, certo?
Parece que sim. Pelo menos, é o mais lógico a se pensar e concluir. Mas há controvérsias no mundo científico quanto a isso. As técnicas de plantio e cultivo podem ter sido desenvolvidas com objetivo muito mais nobre do que simplesmente encher o pandu do povão : para fazer cerveja!!! É isso mesmo!!!
O ser humano sempre foi fisicamente muito mais fraco, mais lerdo, com sentidos menos apurados e com muito menos instintos do que a grande maioria das outras espécies com quem conviveu desde o seu surgimento. A sua permanência no planeta, o seu sucesso evolutivo, deveu-se sobretudo à sua capacidade de se organizar em sociedade, a sua habilidade de viver em grandes bandos, a força do ser humano vem do bando; a inteligência é individual e está ligada ao afastamento do bando, mas a força que garante o feijão com arroz vem do bando, viver em grandes sociedades foi um mal necessário à nossa fraca espécie.
E conviver em bando não é fácil, abrir mão muitas vezes de sua individualidade, tolerar as intoleráveis diferenças do outro  etc. Para garantir a coesão do bando, alguns elementos agregadores se fizeram necessários. A eles.
O desenvolvimento de uma linguagem mais elaborada, própria de cada bando (assim nasceram os diferentes idiomas), ao que tudo indica, foi o primeiro desses elementos. Não que os outros animais também não tenham suas linguagens, mas elas se restringem a sinais básicos, grunhidos e rosnados para sinalizar que estão com fome, com raiva, feridos, com vontade de acasalar. Em grandes bandos, uma melhor e mais detalhada comunicação se faz necessária, são precisos muita conversa e convencimento para se continuar num bando, é essencial, principalmente, mentir muito na convivência com o bando. E nenhum outro ato humano demanda uma linguagem mais elaborada que o de mentir. Mentir é complicadíssimo, boa parte da expansão de nossos códigos de comunicação veio da fundamental mentira. Além disso, falar a língua de um bando tornava difícil a migração de pessoas para outros bandos, nos quais não seriam compreendidas.
Outro fator agregador foi a criação de leis, a submissão do bando a um mesmo conjunto de normas de conduta; largar o bando por conta própria é decretar a extinção dele, sem rígidas diretrizes a norteá-lo, ele se autocomeria, afundaria-se na própria barbárie.
A religião. Desgraçadamente, a religião também foi forte elemento agregador da espécie. Todo bando possuía, obviamente, um líder, mas esse líder ainda era humano, podia ser constestado, ter suas decisões postas em xeque, ser combatido e deposto. E um "líder" imaterial, todo-poderoso, infalível e cuja base de existência fosse justamente a fé cega em sua bondade e sabedoria? Seria incontestável, certo? Daí, o surgimento dos deuses. Seres de ações e determinações incontestáveis. E que também fariam um papel complementar às leis : para ser punido pela lei, um criminoso tem que ser visto por alguém a praticar seu crime, se você comete um crime e ninguém é capaz de identificá-lo, você está livre. Deus vê tudo, quem escapa da justiça dos homens não escapa da justiça de deus, dizem. Além disso, cada bando considera seu deus melhor que o do outro, se necessário, briga, guerreia para provar isso, e a guerra fortalece a união do bando.
E a cerveja, onde entra nisso?
Nas festas, porra! O homem das cavernas também dava suas festas. As festas provavelmente eram mais do que simples encontros. Festas criam alianças, facções, vínculos entre as pessoas, poder político, redes de apoio, e tudo isto sempre foi fundamental para o desenvolvimento de tipos mais complexos de sociedade. E o que há de melhor para facilitar as relações e o entendimento dos convivas que não o bom e velho álcool, a sacrossanta cervejinha?
Algumas evidências apoiam as suspeitas dos arqueólogos de que os grãos eram mais transformados em cerveja que em alimento propriamente dito.
Cereais, como cevada e arroz, representavam um elemento menor na dieta do homem pré-histórico, provavelmente pela dificuldade em conseguir algo comestível a partir deles - é necessário reunir, peneirar, descascar, moer, tarefas muito demoradas em troca de pouco ganho energético e nutritivo. Estima-se que todo o processo para tornar os grãos palatáveis, àquela época, custava de 6 a 8 oito horas de trabalho da mulherada.
Apesar disso - muito trabalho para pouca energia -, as pessoas andavam grandes distâncias para obter os grãos. Evidências na Síria sugerem que, às vezes, as pessoas faziam um esforço incomum apenas para adquirir os grãos de cereais – andavam de 60 até 100 km. Andar 100 km para fazer uma papinha de arroz ou um pãozinho mixuruca? Vai nessa.
Não tenham dúvidas - eu, pelo menos, não as tenho em relação a esse respeito -, só por uma coisa o ser humano anda tanto : pela birita! E é assim até hoje. O sujeito fica na maior preguiça de atravessar a rua e comprar pão na padaria ou no supermercado, mas se aparece uma oferta de cerveja em tal lugar, ele atravessa a cidade.
Pelo tempo e esforço, o álcool era produzido quase que exclusivamente para ocasiões especiais, para impressionar os convidados, deixá-los felizes, e alterar sua atitude, favorável aos anfitriões. Ou seja, unir mais o bando. A cerveja, digamos assim, sempre lubrificou as ásperas relações humanas, e bem sabemos que sem lubrificação não há relações.
Muito mais que para matar a fome, o cultivo de grãos - e, portanto, o início da agricultura - se deu para fabricar cerveja. A velha loura gelada é um dos pilares da nossa civilização.
Um brinde à ela, à cerveja nossa de cada dia.
Eu acabei de abrir a minha aqui, para iniciar a noite.
Se nem com a cerveja, eu sou tão "civilizado" assim, imaginem sem ela. Vocês não me aguentariam.
Fonte : Live Science

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Paraninfo Azarado (Ou : Superbonder, Não Saia De Casa Sem Ela)

O apelido Azarão - que hoje considero uma honraria de batalha, uma condecoração de guerra - me foi dado pelo meu grande amigo Fernandão, que, sempre confuso das palavras, usou erroneamente o significado do termo com o qual me alcunhou.
Parecera-lhe, por ocasião do início de nossa longa amizade, nunca ter conhecido alguém tão azarado quanto eu, um azarado tão grande, um azarão; a seu ver, aumentativo de azarado. Na verdade, azarão tem significado praticamente oposto : no turfe, é aquele cavalo pelo qual ninguém dá nada, um pangaré, e que, de vez em quando, muito de vez em quando, surpreende e fatura o páreo. Azarão seria um azarado que, às vezes, dá sorte.
Mas gostei do apelido, afeiçoei-me a ele. Tanto que hoje, das quatro ou cinco que possuo, o Azarão é minha personalidade favorita. O Azarão, verdade seja dita, nunca foi para-raios de grandes azares, de grandes desgraças; sempre foi magneto daqueles pequenos azares cotidianos. O Azarão é aquele cara em cujo prato cai a pedra do feijão, em quem o carro joga a água empoçada da chuva, em cuja cabeça o passarinho acerta a bosta, essas pequenas adversidades.
O Azarão é um elemental zombeteiro que habita em mim, um Saci íntimo e pessoal.
Contudo, devo admitir que, dessa época de maior convivência com o Fernandão para cá, o Azarão tem me dado trégua, não tenho tido mais tantos azares, achei mesmo que ele houvesse se aposentado. Até ontem...
De tempos em tempos, sou escolhido como paraninfo por alguma turma de 3º ano do ensino médio; de tempos em tempos, mesmo, coisa equivalente ao intervalo entre uma passagem e outra do cometa Haley. Pois o cometa passou esse ano e lá fui eu, a pegar carona em sua cauda, ver a via-láctea, estrada tão bonita, brincar de esconde-esconde numa nebulosa.
A cerimônia foi ontem, e tudo corria bem. O coordenador passou para me pegar no horário previsto, o trânsito estava aceitável apesar da chuva que despencava; chuva que, diziam as más línguas já presentes no local do evento, era decorrente do fato de eu ter aceito o convite, me disposto a participar de um evento social.
É que sou, muitas vezes, classificado de antissocial. Não é verdade. Isso é coisa de umas e outras invejosas, despeitadas, recalcadas, de tesão recolhido e encruado etc. Não sou antissocial, nada tenho contra, só não tenho, também, nada a favor. Não é que eu não goste de pessoas, só me sinto melhor quando elas não estão por perto.
Voltando. Chegamos ao local do evento, um espaço localizado em um shopping da cidade, o West Shopping (morra de inveja, Leitinho), com sua imponente West Tower, o World Trade Center do interior paulista, isso segundo um primo meu, o Leitinho, para quem esse shopping é o maior emprendimento econômico e arquitetônico da cidade, uma figura impagável, o Leitinho.
Carro estacionado, saí. Meu primeiro passo já foi em falso, o pé virou. Torci o tornozelo? Pior, muito pior. A sola do sapato, a do pé direito, se soltou, despregou-se quase que por inteiro. Eu levantava o pé e a sola se abria feito uma boca desdentada a escarnecer de mim.
Não havia dúvidas : era o Azarão de volta à ativa. 
E não tinha como, era uma coisa patética de se ver, aquela sola balançando. Não havia como eu adentrar o recinto com aquela coisa mole. Estava mesmo prestes a desistir do evento, estava quase dizendo ao coordenador que outro professor me substituísse.
Foi nessa hora de agrura que me lembrei de outra máxima de meu amigo Fernandão, o maior filósofo moderno de todas as eras : "Só pode ser praga de biscate!", dizia ele quando algum infortúnio se abatia  sobre sua cabeça. E bem que poderia ser isso mesmo.
Quando da minha escolha para paraninfo, uma fulaninha, a evidenciar ainda mais a sua já pública e notória falta de ética, não só profissional como de qualquer outro tipo, questionou, junto à sala, o democrático pleito, tentou, mostrando que é puro discurso, puro vômito de papagaio de pirata, demover a sala de sua sábia decisão sobre a minha pessoa. Fulaninha quereria, talvez, uma vez que mendiga emocional das mais miseráveis que já conheci, o posto de paraninfo para si, ou para algum outro dos coleguinhas de sua turma, todos, igualmente a ela, falsos, dissimulados e insidiosos. Contaram-me que chegou até a dizer, escrota e mau-caráter até a medula, que eu daria uma de tratante, que aceitaria o convite e os deixaria na mão, na hora da cerimônia.
Acontece que sala que escolhe o Azarão para paraninfo não é qualquer coisa, não. É de especial estirpe, é de superior cepa, não cai em lábias canalhas de fulaninha. Mantiveram a escolha.
A lembrança do ensinamento de meu amigo Fernandão me deu novos ânimos. Era por essa e por outras que eu não poderia sucumbir. Ainda mais em tal cenário, ainda mais à sombra da West Tower, palco da definitiva e frankmillírica peleja entre um Bruce Wayne sexagenário e um Duas-Caras redivivo; bem a calhar, o Duas-Caras.
Decidi : capitular frente ao carma de Murphy, eu aceito, resigno-me em minha pequenez perante ao Universo, mas cair por praga de bisca, jamais. Alguma solução eu acharia, ou me seria apontada. Alguma luz me viria. E ela veio : na forma de uma voz grossa, muito mais que a minha, quase que de um barítono, tonitruante. E antes que digam que foi a voz de deus, já vos mando tomar no cu. Minha salvação se pronunciou na forma de uma mulher macho, paraíba sim senhor, uma sapatão de respeito - adoro as sapatas, depois disso, mais ainda.
Como disse, era um shopping, e a minha salvadora estava a fumar em frente a uma das lojas, só ouvi o vozeirão : - Ô, meu, vai ali no mercado e compra superbonder, ela cola tudo.
Sim, havia um grande mercado às minhas costas. Acredito que tenha titubeado um pouco em relação ao conselho da sapata. Foi a vez do meu coordenador me socorrer, vai lá, disse, sapata entende disso. E era verdade. Quem entende mais de 44 bico largo que uma sapata?
Comprei a superbonder, passei na sola do sapato, calcei para pressionar, esperei dois ou três minutos e presto : a sola estava de volta ao seu lugar, coladíssima. 
Observando a tudo que ficou, quando levantei e ensaiei os primeiros e tímidos passos, ainda temeroso de que a sola pudesse novamente se soltar, a sapata me chegou por trás, deu-me um tapinha nas costas (que quase me desloca o ombro, mas tudo bem) e perguntou : Colou? Pããããta que o pariu se colou. Salvou o meu rabo. Agradeci-lhe e fui para o recinto, pisando de leve, como quem pisa em ovos, como quem pisa nos próprios ovos, e tudo deu certo, transcorreu tudo nos conformes.
A sala teve o paraninfo que escolheu e eu, a satisfação de ter sido escolhido e honrado meu compromisso. Tive até uma grata surpresa ao final, que pretendo contar aqui numa continuação dessa postagem, talvez sob o título Paraninfo Sortudo (Ou : o Azarão Nessa Frescura).
Dar-se-á, amanhã, o baile de formatura, ao qual comparecerei na certa. E com o mesmo par de sapatos. O único que tenho. Diferente dos tênis, os quais possuo em profusão, em exagero : dois pares. Dessa vez, no entanto, macaco cada vez mais velho que sou, irei prevenido, carregarei ao bolso um milagroso e providencial tubo de superbonder; doravante, será mais um item indispensável em meu cinto de utilidades, um verdadeiro amuleto contra pragas de bisca e que tais. 
Obrigado, meninos, obrigado!