domingo, 31 de outubro de 2010

Carta Ao Chico

(de José Danon)
"Chico, você foi, é e será sempre meu herói. Pelo que você foi, pelo que você é e pelo que creio que continuará sendo.
Por isso mesmo, ao ver você declarar que vai votar na Dilma “por falta de opção”, tomei a liberdade de lhe apresentar o que, na opinião do seu mais devoto e incondicional admirador, pode ser uma opção.Eu também votei no Lula contra o Collor. Tanto pelo que representava o Lula como pelo que representava o Collor. Eu também acreditava no Lula. E até aprendi várias coisas com ele, como citar ditos da mãe.
Minha mãe costumava lembrar a piada do bêbado que contava como se tinha machucado tanto. Cambaleante, ele explicava: “Eu vi dois touros e duas árvores, os que eram e os que não eram. Corri e subi na árvore que não era ,aí veio o touro que era e me pegou.” Acho que nós votamos no Lula que não era, aí veio o Lula que era e nos pegou.
Chico, meu mestre, acho que nós, na nossa idade, fizemos a nossa parte. Se a fizemos bem feita ou mal feita, já é uma outra história. Quando a fizemos, acreditávamos que era a correta. Mas desconfio que nossa geração não foi tão bem-sucedida, afinal.
Menos em função dos valores que temos defendido e mais em razão dos resultados que temos obtido. Creio que hoje nossa principal função será a de disseminar a mensagem adequada aos jovens que vão gerenciar o mundo a partir de agora. Eles que façam mais e melhor do que fizemos, principalmente porque o que deixamos para eles não foi grande coisa. Deixamos um governo que tem o cinismo de olimpicamente perdoar os “companheiros que erraram” quando a corrupção é descoberta.Desculpe, senhor, acho que não entendi. Como é mesmo? Erraram?
Ora, Chico. O erro é uma falha acidental, involuntária, uma tentativa frustrada ou malsucedida de acertar. Podemos dizer que errou o Parreira na estratégia de jogo, que erramos nós ao votarmos no Lula, mas não que tenham errado os zésdirceus, os marcosvalérios, os genoinos, dudas, gushikens, waldomiros, delúbios, paloccis, okamottos, adalbertos das cuecas, lulinhas, beneditasdasilva, burattis, professoresluizinhos, silvinhos, joãopaulocunhas, berzoinis, hamiltonlacerdas, lorenzettis, bargas, expeditovelosos, vedoins, freuds e mais uma centena de exemplares dessa espécie tão abundante,desafortunadamente tão preservada do risco de extinção por seu tratador.
Esses não erraram. Cometeram crimes. Não são desatentos ou equivocados. São criminosos. Não merecem carinho e consolo, merecem cadeia. Obviamente, não perguntarei se você se lembra da ditadura militar. Mas perguntarei se você não tem uma sensação de déjà vu nos rompantes de nosso presidente, na prepotência dos companheiros, na irritação com a imprensa quando a notícia não é a favor. Não é exagero, pergunte ao Larry Rother do New York Times, que, a propósito, não havia publicado nenhuma mentira. Nem mesmo o Bush, com sua peculiar e texana soberba, tem ousado ameaçar jornalistas por publicarem o que quer que seja. Pergunte ao Michael Moore. E olhe que, no caso do Bush, fazem mais que simples e despretensiosas alusões aos seus hábitos ou preferências alcoólicas no happy hour do expediente. Mas devo concordar plenamente com o Lula ao menos numa questão em especial: quando acusa a elite de ameaçá-lo, ele tem razão. Explica o Aurélio Buarque de Hollanda, seu tio, que elite, do francês élite, significa “o que há de melhor em uma sociedade, minoria prestigiada, constituída pelos indivíduos mais aptos”.
Poxa!
Na mosca. Ele sabe que seus inimigos são as pessoas do povo mais informadas, com capacidade de análise, com condições de avaliar a eficiência e honestidade de suas ações. E não seria a primeira vez que essa mesma elite faz esse serviço.
Essa elite lutou pela independência do Brasil, pela República, pelo fim da ditadura, pelas diretas-já, pela defenestração do Collor e até mesmo para tirar o Lula das grades da ditadura em 1980, onde passou 31 dias.
Mas ela é a inimiga de hoje. E eu acho que é justamente aí que nós entramos. Nós, que neste país tivemos o privilégio de aprender a ler, de comer diariamente, de ter pais dispostos a se sacrificar para que pudéssemos ser capazes de pensar com independência, como é próprio das elites - o que, a propósito, não considero uma ofensa -, não deveríamos deixar como herança para os mais jovens presentes de grego como Lula, Chávez, Evo Morales, Fidel - herói do Lula, que fuzila os insatisfeitos que tentam desesperadamente escapar de sua “democracia”. Nossa herança deveria ser a experiência que acumulamos como justo castigo por admitirmos passivamente ser governados pelo Lula, pelo Chávez, pelo Evo e pelo Fidel, juntamente com a sabedoria de poder fazer dessa experiência um antídoto para esse globalizado veneno. Nossa melhor herança será o sinal que deixaremos para quem vem depois, um claro sinal de que permanentemente apoiaremos a ética e a honestidade e repudiaremos o contrário disto. Da mesma forma que elegemos o bom, destronamos o ruim, mesmo que o bom e o ruim sejam representados pela mesma pessoa em tempos distintos.
Assim como o maior mal que a inflação causa é o da supressão da referência dos parâmetros do valor material das coisas, o maior mal que a impunidade causa é o da perda de referência dos parâmetros de justiça social. Aceitar passivamente a livre ação do desonesto é ser cúmplice do bandido, condenando a vítima a pagar pelo malfeito. Temos opção. A opção é destronar o ruim. Se o oposto será bom, veremos depois. Se o oposto tampouco servir, também o destronaremos. A nossa tolerância zero contra a sacanagem evitará que as passagens importantes de nossa História, nesse sanatório geral, terminem por desbotarem na memória de nossas novas gerações. Aí, sim, Chico, acho que cada paralelepípedo da velha cidade, no dia 3 de outubro, vai se arrepiar.
Seu admirador número 1, Zé Danon, José Danon é economista econsultor de empresas. "Há tantos burros mandando em homens de inteligência que, às vezes, fico pensando se a burrice não é uma ciência?"(Rui Barbosa).

sábado, 30 de outubro de 2010

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Mui Amigo

Chester Ives e Matthew Brady, dois amigos australianos, como acontece a todos amigos, tiveram lá uma discussão, uma briga, e depois voltaram às "boas".
Matthew, tatuador de profissão, como prova de boa-fé e marco da rediviva amizade, ofereceu ao amigo uma tatuagem, que podia escolher a que fosse de seu agrado e ele a faria de graça. Chester optou pelo símbolo do Yin-Yang.
Para quem não conhece, o Yin-Yang é um diagrama que representa a dualidade no taoísmo, na filosofia chinesa, luz e escuridão, positivo e negativo, ativo e passivo, masculino e feminino, essas papagaiadas;  para melhor descrevê-lo, basta imaginar que o Yin-Yang muito se assemelha ao Caetano Veloso e ao Gilberto Gil fazendo um 69.
O amigo tatuador optou pelas costas do amigo como local de seu presente e começou o desenho. "Cara, está ficando muito bom", seguia dizendo o tatuador ao amigo, orgulhoso de sua obra, e também recomendou que ele não mostrasse a tatuagem a ninguém durante algumas semanas.
Chester, feliz com a gentileza do amigo, chegou em casa, mostrou a tatuagem para a garota com quem vive e veio a revelação : o amigo havia lhe tatuado um pinto, um cacete, um caralho de 40 cm nas costas; subscrita a inscrição, Eu sou gay.
O tatuador vai responder a processo e Chester terá que passar por 9 meses de tratamento com raio laser para tirar o pinto das costas, no que poderá desembolsar até 2000 doláres australianos (sei lá o câmbio dessa porra).
Mui amigo.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

O Corno Chileno

Vejam como são as coisas, o cara enterrado e a esposa enterrando, a mandioca, a brachola, o tarugo...
O cara chega em casa depois de 68 dias e encontra a esposa grávida. De cinco semanas.
O mineiro chileno Alberto Gallardo teve uma grata surpresa ao se reencontrar com a esposa no Hospital de Copiapó. 
A esposa contou ao mineiro que estava grávida de cinco semanas do primeiro filho do casal. Ainda abalado devido aos 68 dias que passou embaixo da terra, Gallardo ficou um pouco desconfiado com o tempo de gravidez, mas foi rapidamente tranquilizado por um médico, muito amigo da família.
O médico Alfonso De la Onza, que esteve o tempo todo ao lado da mulher de Gallardo, disse ser muito comum o espermatozoide sobreviver por muito tempo antes de fecundar o óvulo. “É um espermatozoide guerreiro, um sobrevivente como o pai”, declarou para os jornalistas presentes.
O que significa dizer que o espermatozoide do cara resistiu, no mínimo, supondo que o mineiro tivesse dado "umazinha" com sua digníssima no dia anterior ao acidente, por 33 dias  no útero,  antes de fecundar um óvulo
(33 + 5 semanas = 68 dias, correto?). Inclusive passado lá dentro por uma menstruação. Aquele fluxo todo, aquela sangreira toda descendo e o espermatozoide lá, firme, agarrado a sabe-se lá onde. Vai ser guerreiro assim na puta que o pariu!!!
E o cara, lógico, acreditou.

House - 7ª Temporada, Episódio 1

UMA MERDA !!!

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Rodeio Na Unesp

Como bem disse o saudoso Paulo Francis, universidade é para formar elites e não dar diplomas a pés-rapados.
Ele estava/está corretíssimo, tudo o que é popularizado perde a qualidade, ficou na mão do povão, já era.
E a Universidade Pública está passando por um processo de "democratização", de esculhambação, de sucateamento, para falar o claro português. E vai piorar, com esses absurdos de cotas, de acabar com vestibular, de aceitar nota de ENEM etc etc.
O caso abaixo é apenas um dos reflexos desse processo. Na Unesp - Araraquara, sede do InterUnesp 2010, foi criada uma nova modalidade olímpica, o rodeio de gordas. Alunas obesas foram agarradas, montadas e cavalgadas por nossos futuros médicos, dentistas, advogados, professores. O objetivo, da "brincadeira" segundo um deles, era cronometrar quem conseguia passar maior tempo em cima da gorda com um abadá e uma caneca.
Ainda nessa semana, na ECA/USP, um casal de homossexuais foi agredido a socos e pontapés em uma festa. Não concordo realmente, e inclusive sempre marreto isso aqui, que homossexuais tenham privilégios especiais garantidos por algum estatuto, mas, óbvio e inquestionável, eles têm que ter os mesmos direitos de qualquer outra pessoa, por exemplo, nesse caso, ir a uma festa acompanhado do namorado.
Esses acontecimentos, e outros tantos mais que encontraríamos se nos puséssemos a pesquisar, já são resultantes da popularização das universidades, entre outros fatores. A elite tem lá seus defeitos, como eu também os tenho, mas dar acesso indiscriminado às universidades para o populacho, para a patuleia, para a choldra, é municiar a barbárie.
Abaixo a reportagem, publicada na folha de são paulo :

"Um grupo de alunos da Universidade Estadual Paulista, uma das mais importantes do país, organizou uma "competição", batizada de "Rodeio das Gordas", cujo objetivo era agarrar suas colegas, de preferências as obesas, e tentar simular um rodeio --ficando o maior tempo possível sobre a presa. 
A agressão ocorreu no InterUnesp 2010, jogos universitários realizados em Araraquara, de 10 a 13 de outubro. Anunciado como o maior do país, o evento esportivo e cultural, que reuniu 15 mil universitários de 23 campi da Unesp, virou palco de agressão para alunas obesas.
Roberto Negrini, estudante do campus de Assis, um dos organizadores do "rodeio das gordas" e criador da comunidade do Orkut sobre o tema, diz que a prática era "só uma brincadeira".
Segundo ele, mais de 50 rapazes de diversos campi participavam. Conta que, primeiro, o jovem se aproximava da menina, jogando conversa fora --"onde você estuda?", entre outras perguntas típicas de paquera.
Em seguida, começava a agressão. "O rodeio consistia em pegar as garotas mais gordas que circulavam nas festas e agarrá-las como fazem os peões nas arenas", relata Mayara Curcio, 20, aluna do quarto ano de psicologia, que participa do grupo de 60 estudantes que se mobilizaram contra o bullying. 
No Orkut, os participantes estipulavam regras para futuras competições, entre elas cronometrar as performances dos "peões" e premiar quem ficasse mais tempo em cima das garotas com um abadá e uma caneca. Há relatos de gritos de incentivo: "Pula, gorda bandida".  "

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Calmaria

Acordo.
Logo, existo.
Penso? Não sei.
Ainda é madrugada para a maioria dos galos da cidade.
O filho dorme tranquilo no berço,
A mulher, na cama, idem.
Deslizo pelo corredor sem acender as luzes,
Cumprimentando o escuro.
Porta do corredor fechada, começo a acordar a casa,
A sala, a sacada,
As duas gatinhas,
A cozinha.
Com um banho de água fervente, acordo o café,
Que, tragado, me devolve o gesto, imediatamente.
Fico a mirar o negro dessa hora,
Mais negro que o costume, já que horário de verão.
O intestino anuncia seus préstimos,
Vou e dou uma bela e retumbante cagada,
Dessas de romper o espelho d´água,
Dessas que nos deixa mais leves
E confiantes de que algo ainda funciona nesse mundo.
Mesmo que sejam nossas tripas.
Tenho um emprego,
Não uma função ou serventia,
Um emprego.
Estável, público, burro,
Que garante, contudo, o meu sustento
E a cerveja de todas as noites.
Um filho protegido e bem-cuidado,
Uma bela cagada pela manhã
E saber que terei cerveja à noite...
O que eu,
Um cara que nunca teve a ilusão de ser filho de algum deus,
Posso mais querer da vida?

domingo, 24 de outubro de 2010

Salvem Os Japoneses

Você pode achar muito bonito
Aquilo de preservar as baleias;
Pode achar muito bonitas, inclusive, as baleias.
Pode achar pura arte a coreografia da Jubarte,
Seu canto estereofônico,
Sua grande cauda a acenar para o céu
E, depois,
A chapinhar docemente na flor d´água plácida e espumosa.
Você pode mesmo se debulhar ante tanta beleza...

Isso se você não for um arenque, um atum ou uma garoupa.
Prestes a escorregar goela abaixo
E virar o sushi da baleia.

Os arenques, os atuns e as garoupas,
Esses, 
São pela preservação dos japoneses.

O BBB No 2º Turno

Acabei de fechar minha caixa de e-mails e, pela quarta vez nessa semana, recebi um texto creditado a Pedro Bial. Não sei se acredito. Um anônimo redigir um texto e atribuir a autoria a algum famoso é prática corriqueira na internet, como forma de dar maior credibilidade ao dito. Mas partirei do pressuposto de que o tal texto seja mesmo de Pedro Bial.
No texto, simplória e rasamente, o filósofo do Big Brother Brasil classifica em dois grupos as pessoas que tiveram lá seus entreveros com a ditadura militar.
Um grupo seria o daqueles que se autoexilaram em outros países,via de regra, mais aprazíveis e civilizados que o nosso, como o cara que sai de férias enquanto dura a visita da sogra; Bial chama a esses de fujões e covardes, e coloca José Serra e seu exílio no Chile nesse balaio.
Outro grupo se comporia daqueles que aqui permaneceram, lutando, segundo Bial, contra a ditadura, defendendo seus "ideais", a "liberdade" e a "pátria"; a esses, Bial chama de heróis, e obviamente coloca Dilma nessa categoria.
Para começar, a definição mais acertada e precisa de herói que eu conheço é : herói é aquele que não teve tempo de fugir. E depois, quem é Pedro Bial? Que relevância tem Pedro Bial dentro da conjuntura política do país ? Aliás, que relevância tem Pedro Bial em qualquer outro setor ou segmento da vida nacional? Nenhuma, absolutamente nenhuma.
Pedro Bial é só mais um idiota Global, a quem a crassa ignorância dos telespectadores acabou por conferir uma certa intelectualidade. Bial não é um intelectual, nem passa perto disso. Ele é um cara bonito, bem-apessoado, sabe se comunicar razoavelmente bem, deve comer muita bucetinha por aí se valendo disso, autointitula-se poeta e tem uma biografia do Roberto Marinho como expressão máxima de sua obra literária . Pouco pau-mandado da Globo, o rapaz. E a Globo é pró-Dilma, visivelmente, desavergonhadamente.
E tem mais, por que Bial não acrescentou os nomes de alguns dos queridinhos do folclore nacional à sua lista de fujões, Chico Buarque (exílio na Itália), Caetano e Gil (Inglaterra) ou Fernando Gabeira (Suécia, tadinho)? Folclore, sim. Nosso país não tem História, tem folclore.
Simples, o texto tenta unicamente glorificar Dilma Rousseff, e não a luta por ideais de liberdade; de quebra, tenta desmoralizar Serra, logo ele, o mais modesto e pobrezinho dos nossos fujões, nem teve como ir para a Europa, só chegou ao vizinho Chile.
Só mais uma coisa para terminar:
Foda-se o Pedro Bial!
Fodam-se vocês que me mandaram o texto!

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Bukowski, É Claro

Como Ser Um Grande Escritor
tens que foder muitas mulheres
mulheres bonitas
e escrever alguns bons poemas de amor.

e não tens que te preocupar com a idade
e/ou novos talentos.

apenas bebe mais cerveja
mais e mais cerveja

e vai às corridas pelo menos uma vez
por semana

e vence
se possível.

aprender a vencer é difícil –
qualquer imbecil pode ser um bom perdedor.

e não te esqueças de Brahams
nem de Bach nem
da cerveja.

não faças exercício a mais.

dorme até ao meio-dia.

evita cartões de crédito
ou pagar seja o que for a
tempo e horas.

lembra-te que não há nenhum cu
no mundo que valha mais de $50
(em 1977).

e se tens a capacidade de amar
ama-te primeiro
mas nunca te esqueças da possibilidade de
derrota total
mesmo que a razão para a derrota
seja justa ou injusta –

sentir cedo o bafo da morte não é
assim tão mau.

afasta-te das igrejas e bares e museus,
e como a aranha sê
paciente –
o tempo é a nossa cruz,
mais o exílio
a derrota
a traição

tudo isso.

sê fiel à cerveja.

uma amante constante.

arranja uma grande máquina-de-escrever
e enquanto ouves os passos para cima e para baixo
lá fora

martela a coisa
martela com força

transforma-a num combate de pesos-pesados

transforma-a no touro na sua primeira investida

e lembra os velhos sacanas
que tão bem lutaram:
Hemingway, Céline, Dostoievsky, Hamsun.

se pensas que eles não enlouqueceram
em pequenos quartos
tal como tu agora

sem mulheres
sem comida
sem esperança

então não estás preparado.

bebe mais cerveja.
há tempo.
e se não houver
está tudo bem

na mesma.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Os Cansados de Guerra

Os cansados de guerra, à guisa de lenitivo, dizem que as habilidades combativas e a força nunca se acabam.
Acabam sim, de acordo com eles, os ideais que faziam rebentar a força, as causas justas pelas quais valia pôr o motor em funcionamento, a crença em uma aspiração que azeitava e erguia o valoroso gládio, é a descrença que os derreiam; a força continua lá, garantem eles, incubada feito uma bactéria.
Sou ainda bom, serei sempre bom - seguem em autoconsolo, os cansados de guerra -, só não há razão para sê-lo nos dias de hoje, rotineiramente.
Mentira.
A força acaba, sim !

Cala a Boca, Chico

Chico Buarque, até o álbum "Paratodos" (1993), é o maior compositor/letrista de toda a história da MPB. Morro de inveja de centenas de seus versos, sobretudo as letras feitas para teatro. Não há outro que sequer se equipare a uma "Construção", "Eu te amo", "Maninha", "Trocando em Miúdos", toda a "Ópera do Malandro", "Pedaço de Mim", "O Meu Guri", "Bastidores", "Deus lhe Pague" etc etc, músicas que até hoje, depois de ouvidas centenas de vezes, causam-me arrepios cerebrais, cutâneos e de alma. Viva o Chico letrista.
Chico ou se cansou da canção ou a canção, de Chico; as letras das músicas começaram talvez a se tornar insuficientes para a expressão de suas ideias, ou exigentes demais. E Chico pendeu para a literatura. Já escreveu quatro romances, "Budapeste" (o terceiro livro) é um bom romance com sacadas interessantes, não de gênio como era de seu feitio na música, mas interessantes; "Leite Derramado" também me parece ser um romance simpático, embora - e aí a culpa não é do Chico - eu tenha começado a lê-lo algumas vezes e empacado; os dois primeiros livros, "Estorvo" e "Benjamim", são dispensáveis. Chico faz um servicinho competente como literato, nem podia ser diferente com o conhecimento da língua que possui, mas não traz grande contribuição à literatura. Mantenha-se o Chico escritor.
Agora, o Chico político é um desastre. Foi alçado a um dos cânones da luta contra a ditadura sem nunca tê-lo sido, ficou um tempo autoexilado em Roma (lugarzinho ruim para um exílio, né?), defendia e glorificava o regime de Fidel Castro em Cuba, uma ditadura.
Diz que lutava contra uma ditadura, a brasileira, uma pseudoditadura - alguém já viu uma ditadura com vários "ditadores", uma ditadura que patrocinava a indústria nacional de cinema, EMBRAFILME, onde reinavam os esquerdistas? Ou uma ditadura que permitia eleições secretas para munícipio e deputância? -, e defendia uma real ditadura, a cubana.
A família de Chico tem histórico de desastres políticos, Sérgio Buarque de Holanda, seu pai e inigualável historiador de "Raízes do Brasil", foi um dos fundadores da quadrilha do PT junto a outros intelectuais como Hélio Bicudo e Eduardo Suplicy; o pai de Chico prestou esse grande desserviço político ao país. Cada vez mais chego à conclusão de que não há nada mais burro que um intelectual.
E agora vem Chico e declara seu apoio a Dilma Rousseff. Da candidata, Chico diz que é uma mulher que nunca teve medo de nada. Bom, se eu estiver empunhando uma metrallhadora de uso exclusivo das forças armadas, roubada de um armazém do exército, poucas coisas são capazes de me meter medo.
O que Chico sabe realmente da verdadeira luta de classes, dos trabalhadores? E mesmo Dilma, o que sabe? Os dois são e sempre foram elite, nasceram elite. Artistas deviam abrir a boca tão-somente para cantar. 

Cala a boca, Chico.
Morra o Chico político.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Virgem Maria Da Hortaliça

- A senhora está anêmica, anemia profunda - anunciou o Dr. Bustamante à Dona Emília -, comer muito ferro, feijão, carne vermelha.
O feijão, Dona Emília tinha como, sempre vinha um bom saco em sua cesta básica. A carne era a questão, o quilo pela hora da morte.
- Compra brócolis, couve, almeirão, verdura verde-escura, é mais baratinho e também tem ferro - recomendou-lhe Dona Espéria-vizinha-de-muro-de-Emília.
Dona Emília pinçou as derradeiras moedinhas de seu porta-níqueis - a aposentadoria só para a semana seguinte - e comprou um bom pé de brócolis, brócolis japonês.
Quase a pô-lo na fervura, Dona Emília notou um semblante familiar desenhado nas superfícies fractais do brócolis. O rosto da Virgem Maria, tal e qual aqueles adesivos de carros.
Correu afogueada à paróquia do Padre Bento-bolinador-de-fundilhos-de-beata, que prontamente atestou o milagre, categórico, mais precisada que estava sua igreja de um milagre que propriamente os fiéis.
A notícia correu. Foram confeccionados, e vendidos, chaveiros, camisetas, adesivos, pequenas réplicas em resina e até escapulários do milagroso vegetal. Padre Bento-chupador-de-tetas-de-devota encheu as burras. Veio até a reportagem do canal de TV local, a repórter-bonitinha-peituda-semianalfabeta a fazer perguntas cretinas.
O brócolis foi posto em redoma especial, climatizada, antifungo e antibactéria, para exposição em missa extraordinária, todos poderiam passar em procissão, tocar e beijar o vidro. 
Houve a presença do Monsenhor e do Arcebispo , que junto ao Padre Bento-dedilhador-de-grelo-de-carola compuseram a tríade clerical no púlpito, três nababos pançudos e corados.
À periferia deles, à esquerda do altar-mor, Dona Emilia, esquálida e descorada, a homenageada do evento, impregnada do pecado capital do Orgulho. De barriga vazia, sem o brócolis. Ainda mais anêmica. Pernas vergando de fraqueza, ameaçando ruir a qualquer momento.
E com um sorriso resplandecente. E parvo. E cheio de fé.

Estratégia Do Serra Para Vencer o 2º Turno

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Diário Da Corte De Paulo Francis

É um pequeno livro onde estão reunidas, de A a Z, as impressões e opiniões desse gênio do jornalismo acerca dos mais variados assuntos e personalidades.
No verbete "Educação", ele gira e faz ribombar a sua marreta (perto da qual a minha é um reles martelinho de plástico, desses de crianças) :

#1 - "A função das universidades é criar elites, e não dar diplomas a pés-rapados. (FSP, 24/11/90)";
#2 - "Tenho aproximadamente 40 assinaturas de publicações, sem falar das avulsas. Penso em cortar a assinatura do New York Times. Em sinal de protesto. Uma primeira página outro dia, sobre meninas que estão sendo segregadas dos meninos nas aulas de matemática porque são lerdinhas e os meninos riem quando elas cometem gafes. É um erro. Devemos ser humilhados publicamente no colégio, em nossas fraquezas. É só assim que nos fortalecemos para enfrentar as possíveis humilhações sérias da vida. Nos colégios onde estive os bobos eram tratados de maneira grosseiríssima e jocosa pelos mais inteligentes. Quando se errava a pronúncia de francês e inglês, gargalhadas dos que sabiam o certo. Me lembro que um colega disse um dia que ia explicar o que era eletricidade. O professor, um gozador, disse que lhe desse tempo de reunir todo o colégio, de 1200 alunos, para que ele comunicasse sua descoberta em público. Nós chorávamos de rir, e o pobre-coitado, vermelho como um pimentão, sem saber porque estava sendo gozado. Não tira pedaço. Personalidades são forjadas nesse tipo de fornallha, e não em fingir que a vida é uma fuga constante do que nos aflige. (OESP, 2/12/93)."

Puta que o pariu!!! Tem jeito de discordar do cara? Só se for alguma peidagoga mal-amada que usa os alunos para compensar suas carências de afeto, ou algum peidagogo viadinho, idem

sábado, 16 de outubro de 2010

O Casulo Do Cavalo Alado

"Parceria dos Viajantes" é o nome do CD de Zé Ramalho, de 2007, onde ele divide os vocais de algumas faixas do álbum. 
A melhor delas é "A Nave Interior", parceria dele com Chico César, cuja letra abriga um pouco de cada peculiaridade que tornaram Zé Ramalho um espécime único da música brasileira; tem um quê de oráculo, de profecias, de alquimia, de hermetismo, algumas felizes aliterações, e a voz de catacumba do Zé.
Ah! E tem também a Pitty por dueto. Ah, a Pitty, com sua vozinha rouca, voz de travesseiro, e suas pernocas grossas a alegrar o ambiente. Que, afinal, nem só de rock vive o homem!!!
Abaixo a letra e depois um link para o vídeo, a Pitty com um corpinho invejável, um tesãozinho
Obs: Aos saudosos do RPM (que o capeta os tenha), o vídeo conta com a participação de Paulo Ricardo no contrabaixo.

 A NAVE  INTERIOR (Zé Ramalho e Chico César)

Não é de fora que a nave vem
É de dentro do peito que a nave sai
É de dentro da gente que a nau inaudita
Habita, repousa, amor e hidrogênio

Silêncio, saudade, soluço, selênio
A nau permanece mesmo quando vai
Secreta se curva, dá a gota, se agita
Se eleva no ar, resplandece e cai

A nave que é mãe
que é filho e é pai
É tudo e é nada
o povo e ninguém

Não é de fora que a nave vem
É de dentro do peito que a nave sai
Não é de fora que a nave vem
É de dentro do peito que a nave sai

Respirar, navegar é coisíssima igual
O ar que ri é o fogo da nau
No vale profundo que geme em nós
Reside o casulo do cavalo alado

Na rainha-mãe ou no pobre coitado
Ali se espelha a centelha do gás
Se é moça ou rapaz, ancião ou criança
A chama não cansa de dançar a dança

A nave que é mãe (A nave que é mãe)
que é filho e é pai (que é filho e é pai)
É tudo e é nada (É tudo e é nada)
o povo e ninguém

Não é de fora que a nave vem
É de dentro do peito que a nave sai
Não é de fora que a nave vem
É de dentro do peito que a nave sai

Não é de fora que a nave vem
É de dentro do peito que a nave sai
Não é de fora que a nave vem
É de dentro do peito que a nave sai

Link para vídeo

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Vacinando o Raul

Sou analfabeto em teoria musical, não sei diferenciar uma nota dó de uma si e nem suspeito de como se elabora um arranjo, uma harmonia, etc etc; igualmente, o português é o único idioma no qual me comunico. Assim, nunca fez sentido que eu gostasse de música estrangeira, e não gosto mesmo. Sem nenhum exagero, posso me declarar xenófobo no concernente à música.
Só duas vozes alienígenas saem, vez em quando, de meu toca-CD : Frank "The Voice" Sinatra e The Doors. Não possuo LP, fita K-7 ou CD com nenhum outro material estrangeiro que não o Frank e o Jim.
Não obstante, abri uma exceção nessa semana. Vi uma propaganda do lançamento do "Classic Rock", uma caixa com 3 CDs, da Som Livre, reunindo os clássicos do rock, anos 70 e 80. Achei a coleção na internet e já baixei e gravei, por dois motivos.
Primeiro que clássico é clássico, e isso ainda é uma das poucas coisas que respeito, sobretudo que são rocks de uma época em que machos faziam rock. Não esses Emos de hoje, esses viadinhos de cabelo colorido, com cara de cu, cheios de piercing e alargadores de orelha - o cara começa a alargar o lóbulo da orelha e logo, logo, está alargando o cu.
O rock clássico, o verdadeiro rock - não importa o idioma em que é cantado - sempre foi feito com o único e nobre objetivo de arrebanhar bucetinhas, e são dessa saudosa época os rocks dessa coleção. Têm lá, Rush, Marillion, Twisted Sister, Peter Frampton, Scorpions, Yes, Whithsnake e outros.
Segundo motivo é que estou empenhado numa campanha diária de vacinação do meu filho contra as merdas musicais de hoje em dia, estou tentando imunizá-lo contra música baiana, emo, pop e do temível sertanejo universitário. E esses clássicos do rock serão parte importante dessa imunização.
Fui negligente nesse ponto com o Raul, achei que pelo simples fato dele ter meu código genético, estaria totalmente protegido contra essas porcarias todas. Enganei-me. Será necessário mais.
Dia desses, estava com ele na sala, televisão ligada, meio distraído, e passou lá uma propaganda dessas duplinhas metidas a sertanejas, viados country. E não é que o menino, inocente, levantou e agitou os bracinhos ao som daquela merda? Alarmei-me.
Minha esposa disse que talvez ele escute isso lá na escolinha em que fica meio período. Contou-me que, em certa ocasião, ligou para orientar as "tias" a respeito da administração de um remédio ao Raul e ouviu um hediondo sertanejo universitário ao fundo. Não soube dizer se aquilo estava sendo posto para a criançada escutar ou se era apenas na sala das professoras. Pouco importa, essas desgraças voam longe, contaminam todo o ambiente em redor.
Aliás, revoltam-me essas pessoas que se dizem professoras e educadoras, balzaquianas já com prazo de validade a vencer, ouvirem tais excrescências, muitas, inclusive, vão aos shows dar seus gritinhos histéricos quando esses afeminados entram em cena. Na minha época, os professores, grande parte deles ao menos, recomendavam-nos Chico Buarque, Milton Nascimento, MPB4... O nível das tais educadoras está um horror, praticamente  umas semianalfabetas sem a menor cultura. Antes a escola ajudava na educação; hoje, ela briga contra.
Voltando ao assunto, comecei imediatamente minha campanha de vacinação caseira do Raul. Todas as tardes, depois que ele acorda de seu soninho, eu ponho algum rock para tocar. Ira, Barão Vermelho, Titãs, Raul Seixas, já pus também Oswaldo Montenegro, Engenheiros do Hawaii e Ultraje a Rigor, de quem ele pareceu gostar mais. Toda tarde rola um rockzinho básico para protegê-lo, ativar lentamente seus anticorpos do bom gosto.  E hoje começarei a tocar para o Raul os clássicos dessa coleção da Som Livre.
Bobeei, sim, fui ingênuo, confiante demais, mas ele está com apenas um ano, ainda dá tempo dele ser imunizado. E será. Está sendo.
Viva o Rock.
E viva o Raul !!!

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Tropa De Elite De Cristo

Tropa de Louvor - ou Os Caveiras de Cristo, como são conhecidos no métier - é uma banda gospel/evangélica formada por sete policiais do BOPE. A banda está lançando um CD, mais uma preciosa contribuição para o nosso tão valoroso mercado musical atual, e o dinheiro será usado para as viagens da banda por todo o país.
O ideal da banda é propagar ideais de paz, mas adverte nas costas de suas camisetas : "se queres a paz, prepara-te para a guerra".
Pode parecer contraditório policiais de um grupo de repressão saírem por aí levando a palavra do "Senhor", pode parecer mais uma das incoerências desses tempos modernos, mas é perfeitamente lógico. Não há choque nenhum entre uma coisa e outra. E também nada tem de moderno nisso, é prática das mais antigas.
Muito mais que qualquer sacerdote, foram os guerreiros cruzados quem mais contribuíram para a "expansão da fé cristã" no Oriente, seus participantes se consideravam soldados de Cristo, marcados pelo sinal da cruz bordado em suas roupas.
Foram guerreiros, e não sacerdotes, que retomaram Constantinopla dos turcos e garantiram o acesso cristão ao Oriente, foram as espadas sangrentas e não as rezas.
Os tais Cavaleiros Templários nada mais eram que tropas de elite a serviço do Papa, grupos de extermínio feito o BOPE; mulheres grávidas eram varadas pelas espadas cristãs, crianças recém-nascidas eram giradas pelos pés e tinham suas cabeças espatifadas em muros de pedra. Assim a fé cristã se expandiu, e não pela oração ou caridade.
Não foi só a fé cristã a se expandir com as Cruzadas, também as rotas comerciais, a riqueza da Igreja e da burguesia europeia e a intolerância aos judeus.
O deus da bíblia cristã ocidental é iracundo, vingativo e sanguinolento; nada mais natural que integrantes do BOPE pregarem Sua palavra. Farão muito melhor serviço, inclusive, que esses padres cantores e queimadores de rosca que pululam por ai.
Um dos integrantes da banda diz que não sente conflito algum entre seu trabalho e a religião. E não foi justamente o que eu acabei de dizer? E por que teria algum conflito?
As duas ocupações estão a serviço do fanatismo.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Sessão Da Tarde

"A saudade
É um filme sem cor
Que meu coração quer ver colorido
A saudade É Brigitte Bardot
Acenando com a mão
Num filme muito antigo"

Brigitte Bardot, Zeca Baleiro

sábado, 9 de outubro de 2010

Querem Acabar Com Minha Infância

"Estudiosos" franceses, psiquiatras para variar, revelam das mais importantes descobertas de todos os tempos, chegaram à conclusão dos motivos que levaram Darth Vader, vilão da série Star Wars, a passar para o lado negro da Força.
Darth Vader, segundo eles, sofria de Transtorno de Personalidade Limítrofe. O chefe da pesquisa, o desocupado Eric Bui, diz que ele já mostrava os sintomas nos primeiros filmes da série : impulsividade, crise de identidade, ilusão de invencibilidade. 
Será que alguém pode dizer a esse francês filho de uma puta que Darth Vader não existe? Darth Vader é um vilão, não? Todo vilão é transtornado; só não mais que os mocinhos.
Tem mais, a atriz Carrie Fisher, canastrona que só ela, tentando voltar à mídia, não importa como, revela que passou a consumir cocaína durante a filmagem de "O Império Contra-Ataca", também da série Star Wars. E a manchete diz : 'Princesa Leia passou a consumir drogas nas filmagens de Guerras nas Estrelas'.
Porra, quem começou a cafungar violento foi a tal Carrie Fisher, a princesa Leia sempre continuará no nosso imaginário como a gostosa do biquini dourado e daqueles arranjos em forma de rosca no cabelo.
O que querem esses filhos da puta? Acabar com a infância dos adolescentes das décadas de 70/80?
Pois que vão todos tomar nos vossos cus.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Pequeno Conto Noturno (17)

- Nossa, há quanto tempo eu não fazia isso...
- O quê, tomar café?
- Não o café em si, né, o café assim, numa padaria, às quatro da manhã, pão recém-saído do forno, depois de ouvir uma boa banda de blues, de umas cervejas bocks nesse friozinho.
- Para mim, só as bocks bastariam.
- Larga de fazer tipo, sei que você não é tão insensível assim. Sabe do que mais gosto em uma padaria, Rubens?
- Do pão?
- Palhaço. Do cheiro, do cheiro de padaria. Sabe aquele cheiro que a gente sente quando passa do lado de fora? Que a gente entra doida pra comprar e nunca acha de onde vem?
- Sei. Deve ser alguma substância química, algum odor artificial que eles espalham para atrair as pessoas.
- Nada disso - retruca Helga -, deixa de ser chato, a gente nunca acha porque é uma mistura de tudo e varia de padaria a padaria, dependendo do repertório do confeiteiro. Não existem duas padarias com o mesmo cheiro, é feito uma impressão digital.
- Impressionante - diz Rubens -, isso dá até uma tese.
-Vai brincando. Quando eu era criança, eu entrava na padaria perto de casa e pedia pro balconista o doce que tinha aquele cheiro lá de fora, ele apontava para todos os doces e dizia que cada um compunha um pouquinho daquele aroma. Eu gritava que ia levar todos, então. E eu sempre arrancava risos dele.
Rubens se inclina em direção à Helga, junta o seu cabelo com a mão e o joga todo por sobre o ombro direito dela, deixando desguarnecido e vulnerável o lado esquerdo. Aproxima o nariz do pescoço dela - mantendo-o a milímetros de tocá-lo, à justa distância da penugem que o reveste - e aspira, fundo e demoradamente.
- O teu cheiro também não é nada mau.
- Ah, é? E é cheiro de quê?
- Uma mistura. Perfume, antiperspirante, shampoo, maquiagem, bebida, suor, cigarro,  croissant, buceta.
- E que doce vai querer?
- Acho que vou levar todos, então.
E Rubens arranca risos de Helga.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Dia De Faxina

À noite,
A cidade fica mais radiante depois da chuva.
O céu negro fica azul-marinho,
O sódio das lâmpadas públicas, mais amarelinho.

As fisionomias dos prédios, dos carros,
Dos letreiros luminosos dos  hotéis,
Atravessam mais nítidas
- Em alta definição, HD (sic) -
O ar limpo da poeira, da fuligem da cana-de-açúcar,
Das vozes das pessoas,
Dos vírus, fungos e bactérias.

Ou será que, só e simplesmente,
Atravessam mais nítidas
As janelas do meu apartamento,
Apenas faxinadas em dias de forte chuva?

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Universo Dorminhoco

Eu sempre quis ser superalgumacoisa,
Voar,
Saltar prédios, ter punhos de granada,
Lançar raios,
Erguer toneladas.

Na madrugada, meu filho chora.
Medo, dor, fome, pesadelo?

Mais rápido que uma bala, eu acorro a seu berço.
Ergo-o e o trago ao meu peito raquítico,
Que a ele deve parecer mais forte que uma locomotiva.
Seu choro vai minguando,
Seus músculos vão se deixando esparramar sobre mim,
O coraçãozinho diminui a marcha,
E, daí a pouco, o pescocinho tá mole-mole,
A cabecinha a pender em meu ombro esquerdo,
Babando de tranquilidade.

Continuo sem lançar teias
Ou expelir garras de metal do dorso das mãos.

Só que todas as noites,
Eu socorro, apaziguo,
Recoloco em órbita
E ponho para dormir um Universo.

Jamais supus tamanho poder.

Viva Sapata !!!

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Tadinhos...

O adolescente em idade escolar é hostil aos muito magros (eu mesmo já tive vários apelidos em referência a isso, tripa seca, girafa, pepino, seco, magrilo, baguete, vara de cutucar estrela, perna de sabiá, etc etc), é hostil também aos muito gordos (rolha de poço, pudim de banha, gordo baleia, supositório de elefante e por aí vai), é hostil aos que usam óculos (quatro-olhos, fundo de garrafa...), hostil ao espinhento, hostil à menina que fica peituda muito cedo, à menina em quem não crescem os peitos, ao corintiano se ele for palmeirense e vice-versa, ao bom aluno, ao mau aluno, ou seja, o adolescente em idade escolar é hostil a tudo e a todos que ele considere diferente dele ou diferente da imagem que ele tem de si.
Isso é normal, é do bicho, é do ser humano. Hostilizar, ser hostilizado e aprender a lidar e superar isso é parte do crescimento e amadurecimento do indivíduo; resolver ou contornar vicissitudes é aprendizado fundamental.
Pois bem, uma ONG (ong é coletivo de canalhas), uma tal de Reprolatina, fez uma pesquisa em escolas de 11 capitais brasileiras e concluiu que os adolescentes são hostis aos homossexuais, chegando ao "absurdo" de não permitir que o travesti use o banheiro feminino, vejam só que dó.
Já disse, o adolescente é hostil a tudo o que se mexe e respira. Por que não seria hostil ao homossexual? Por que as ONGs não saem em defesa do magrelo, do gordo, do espinhento, do cdf? O magrelo, o gordo, o espinhento e o cdf não ficam chorando as pitangas por aí, eles se viram - como eu me virei -, dão o jeito deles, viram gente. É uma fase natural do desenvolvimento da personalidade e do brio do indivíduo
Essa reclamação do homossexual só tem um nome : viadagem, pura viadagem.

Cerveja No Café da Manhã

"A Cervejaria Bamberg lançou a cerveja Helles, conhecida como o "pão líquido da Bavária". Lá em Bamberg (ALE), às 9h da matina o povo já vai pro pub 'tomar pão', ô coisa boa. Depois vai tudo pro trabalho andando em zigue-zague.
A cerveja tem 5,0% de teor alcoólico e harmoniza com pratos pouco temperados mas também vai bem com petiscos. A temperatura ideal de consumo é entre 4ºC e 6ºC e ela está disponível como chope e em garrafas de 355 ml e 600 ml."

Não chega a ser novidade. Praticamente todos os dias, por volta das seis da manhã, a caminho do serviço, eu cruzo com um cara que tem sempre uma latinha de cerveja na mão. E não é desses bêbados madrugadores que ficam pelas calçadas, maltrapilhos e fedorentos. É um cara até que bem vestido, calça e camisa sociais, bem barbeado, com uma valise de couro a tiracolo,  também a caminho de seu trabalho. Pelo vestuário, aparenta ser um desses profissionais liberais quaisquer, publicitário, jornalista, advogado, sei lá, são muitos os profissionais liberais que se vestem como idiotas. 
Só sei que o cara segue tranquilo seu passo, bebericando sua latinha, cagando e andando para as pessoas que passam por ele e o miram com vistas desconfiadas e reprovadoras, talvez mortas de vontade, elas próprias, de darem sua talagada matutina. Particularmente, têm dias que eu morro de  inveja. Vai ver é o café da manhã do cara. E daí?
Quem sabe, um dia desses, eu me muna de coragem e de uma latinha e, ao cruzar com o cara, o saúde com um brinde matinal.

domingo, 3 de outubro de 2010

Caça-Níqueis De Boteco De Chinês

Eu tinha planejado meu ato solitário, mudo e inútil de rebeldia para o dia de hoje, dia em que a democracia nos obriga a ir às urnas, sob pena de multa ou justificativa.
Visto que vigora uma "Lei Seca" que impede o consumo de bebidas alcoólicas até às 17 horas em locais públicos nos dias de eleição, decidi que iria tomando uma latinha de cerveja no percurso de minha casa até o local de votação, a latinha já estava a postos em minha geladeira desde ontem. 

Já me imaginava de latinha em punho, a pisar o asfalto com passos e ares de Al Capone, torcendo para que o Kevin Costner ousasse se interpor em meu caminho. Eu sacaria de minha arma e estouraria seus miolos; rapaz, como eu adoraria estourar os miolos do chato do Kevin Costner.
Aí, pouco antes de dormir, sem querer, vendo as últimas tendências das eleições, descobri que em alguns estados da federação, incluso o de SP, não haveria a tal Lei Seca nesse pleito, a bebida estava liberada.
Pronto, meu ato rebelde havia sido posto por terra, neutralizado. Essa é a merda de viver sob uma Constituição permissiva, aqui tudo pode, nem dá pra brincar, vez em quando, de fora-da-lei. Desanimei e fui votar a seco, mesmo.
Pelo menos, pensei eu ao chegar na porta de minha seção eleitoral, a coisa será rápida, havia apenas 4 pessoas na fila. Acontece que  meu azar costuma falar mais alto nessas horas e alterar todas as probabilidades aparentemente favoráveis. E hoje não foi diferente.
De repente, do nada, alguém deve ter aberto a porta de algum asilo geriátrico ali por perto, choveram idosos na minha seção, não está escrito em nenhum gibi o tanto de bengalas, orelhas peludas e cabelos roxos que passaram na minha frente. E o tempo que a velharada demora pra votar? Velho devia ficar em casa, já fizeram o que podiam pelo mundo, ou seja, nada; deviam ficar em casa e passar a vez para os mais jovens tentarem fazer o que puderem pelo mundo, ou seja, nada também.  
Quando eu for velho, quando for considerado legalmente velho, nem sairei de casa. Ou melhor, sairei apenas para ir ao mercado comprar minha cerveja, minha pouca ração e, ninguém é de ferro, para dar uma olhadinha de soslaio nos peitos das moças do caixa.
Enfim entrei e comecei a votar; anulei deputado estadual, Tiririca para deputado federal, nulos também para os dois senadores e o governador, e legenda 45 para presidente.
Um fenômeno paranormal ocorreu quando digitei 45 e apareceu lá a foto do José Serra, ao lado da foto do Serra, surgiu uma foto minha, de quando eu tinha meus 15, 16 anos, com cara de censura e reprovação ao meu voto.
Eu sou chato hoje, mas ninguém tem noção do quão mais chato eu era na adolescência, fui daqueles adolescentes tímidos, que só assistiam a cult movies, frequentava debates e mesas redondas na época das fraudulentas Diretas Já, fazia ares de politizado, toda essa merda que nunca serviu pra nada. E foi esse meu EU que apareceu lá ao lado do Serra quando meu dedo estava para confirmar o voto no Vampiro. 
Hesitei por uma fração de segundo, mas reagi, afinal quem é que paga as contas? Eu ou aquele fedelho que nunca fez nem pro papel com o qual limpava a bunda? Eu ou aquele idiotinha que nunca conseguia nem pegar mulher? Mandei-o mentalmente tomar no cu e sua foto desapareceu. Tasquei o dedo no "confirma".
Incrível como ando cada vez mais reacionário, mas talvez essa seja minha rebeldia. Em tempos de indefinições, imprecisões, de valores postos de ponta-cabeça ou simplesmente eliminados, de realidades cada vez mais confusas, mutáveis e efêmeras, ser rebelde é isso : atracar-se ao tradicional.
Se bem que tudo isso não muda em nada o já programado nas altas esferas, essa eleição já é da Dilma, candidata do governo, as urnas já estão manipuladas para a "casa" ganhar, já estão viciadas feito aqueles caça-níqueis de buteco de chinês, todo mundo joga sabendo que vai perder. Senti-me assim, votei contra a situação, mas sabendo da inutilidade, o chinês sempre ganha.
Quis sair de casa como um Al Capone, não deu. 
Voltei para casa orgulhoso de meu reacionarismo, voltei para casa com andar de Clint Eastwood, com minha magnum .44 no coldre sob o sovaco.