Mais uma vez, O Brasil ocupa as últimas posições no ranking do PISA, sigla em inglês para Programa Internacional de Avaliação de Estudantes. As posições exatas do país do futebol nas três áreas de conhecimento avaliadas - Ciências, Leitura e Matemática -, entre setenta países de todos os continentes, revelarei mais ao final, para fechar com chave de bosta mais essa conquista nacional.
Trienalmente, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) coordena a avaliação entre países membros e parceiros e traça um perfil básico de conhecimentos e habilidades do estudantes de cada um deles.
Comparando os resultados obtidos pelo Brasil em 2012 com os divulgados hoje, relativos à prova do ano passado, 2015, despencamos algumas posições; não só em relação aos outros países, mas também em relação ao nosso rendimento anterior, ou seja, quando o assunto é Educação, perdemos até para nós mesmos.
E não pensem que as questões propostas pelo PISA sejam de altíssimo nível, complexas, intrincadas, insondáveis. Nada disso. O PISA não é concurso para cientista da Nasa. Cobra tão-somente os rudimentos de cada área. Em Matemática, por exemplo, a maior parte dos brasileiros errou problemas de aritmética básica, como o quanto de troco teriam que receber de uma compra.
A primeiríssima colocada nas três áreas foi Cingapura. As cinco primeiras posições de cada área, com exceção do Canadá e da Finlândia aparecendo entre elas no quesito Leitura, ficaram nas mãos de países asiáticos. Em Matemática, então, os olhinhos puxados são onipresentes.
Nos três ou quatro artigos que li sobre, os nossos "especialistas" em educação foram unânimes sobre a questão, para eles a principal causa de nosso fracasso acadêmico é a falta de investimento. Falta de investimento na estrutura e materiais das escolas e, sobretudo, investimento na formação e no plano de carreira do professor. Alguns ainda argumentam que o método utilizado nas escolas é o grande culpado, pois seria norteado pelo "conteúdismo". Esse último, eu nem discuto, afinal, se não for para ministrar conteúdos, de que serve a escola?
Quanto ao argumento da falta de investimentos, concordo que escolas com melhores instalações, salas com menos alunos, livros didáticos atualizados, acesso a laboratórios etc promovam um melhor aprendizado. Concordo ainda mais que salários mais justos atraiam os melhores da categoria, aumentando o nível do corpo docente bem como dos cursos de formação. Concordo com tudo isso. Se não estivéssemos falando do Brasil, do brasileiro.
No Brasil, o buraco é mais embaixo. É mais fundo. Se os governos dos estados e o federal dobrassem hoje o investimento na Educação, nada mudaria. Se triplicassem, decuplicassem, continuaríamos a cair posições e mais posições no cenário internacional
A principal razão de nosso acachapante fracasso educacional não passa pelo financeiro, o maior entrave é que o brasileiro não gosta de estudar! Você pode melhorar o ambiente escolar para ele, pode fornecer bons livros, bons professores : ele simplesmente se recusa a estudar. Digo isso do alto de vinte e dois anos de magistério, vinte e dois anos de ladeira abaixo.
O brasileiro não dá o mínimo valor ao conhecimento, à cultura; antes pelo contrário, gaba-se de sua ignorância, celebra sua burrice, gosta de falar e de escrever errado. Dado o interesse nacional pelo conhecimento, digo que os governos gastam até demais com as escolas.
À pouca ou nenhuma afeição do brasileiro pelas letras, junte-se ainda uma LDB (leis de diretrizes e bases) e um ECA (estatuto da criança e do adolescente) frouxos, permissivos e cheios de brechas legais para o vagabundo e está pronta a sopa de bosta.
O brasileiro não gosta de estudar e não há, atualmente, lei que o obrigue, como havia antigamente. Ou será que alguém pensa que o japonesinho já nasce educado e morrendo de vontade de estudar? Só que lá, não é dado a ele o direito de não estudar. Ninguém pergunta se ele quer estudar, ele tem quê, e pronto. Aqui, as leis que regulamentam o ensino desestimulam o bom aluno, privilegiam e premiam o vagabundo.
Para os que não são da área, cito agora umas poucas peculiaridades da legislação que rege nosso ensino:
- até a 7ª série do fundamental (atual 8º ano) é proibido por lei reprovar o aluno de série. Desde que ele tenha a frequência mínima, pode ter baixo rendimento em todas as disciplinas : irá ser promovido para a série seguinte. É a chamada Progressão Continuada. Ou seja, é dado o direito ao aluno, caso ele queira, de permanecer analfabeto até os seus 13, 14 anos de idade. E, frequentemente, ele o quer, comumente, ele exerce alegremente tal direito;
- quanto à frequência, ele tem o direito de faltar a 25% das aulas, ou seja, a cada quatro dias letivos, ele pode encanar um, dos quatro bimestres que compõem o ano letivo, ele pode se ausentar de um deles. Se, por acaso, ele conseguir exceder o permissivo limite, também não há enrosco : basta que ele procure a coordenação da escola e receberá uma lista mequetrefe de trabalhinhos para compensação de ausência. O cara copia lá meia dúzia de folhas e o seu excesso de faltas é retirado;
- Não é necessário um motivo sério e justo para que o aluno justifique suas faltas e tenha o direito de repor as atividades perdidas em sua ausência. Se, por exemplo, o aluno faltar num dia de prova e, no dia seguinte, o pai for à escola e disser que o filho faltou porque foram passear no shopping center, é o que basta, o professor é obrigado a dar uma prova substitutiva (não, não estou brincando);
- Não há mais horário de entrada. Não importa a hora em que ele chegue à escola. Desde que esteja acompanhado pelo responsável, mesmo que o motivo alegado seja o mais esfarrapado possível, ele tem o direito de ir para a sala de aula; ele pode chegar na segunda aula, na terceira, na quarta... E contra o pobre do diretor que se meter a barrar sua entrada cabe até um processo administrativo com risco de exoneração;
- Não existe mais obrigatoriedade do uniforme. O diretor pode até pegar no pé, pode tentar vencer o aluno pelo cansaço, mas proibir a entrada dele por conta do uniforme, não;
- A média para a aprovação é 5,0, o que corresponderia a uma pontuação mínima de vinte pontos em cada disciplina ao fim do quarto bimestre. Corresponderia... Não corresponde mais. Acabaram com a média. Mudaram a matemática básica e fundamental. Hoje, se o aluno tirar, por exemplo, zero no primeiro bimestre, dois no segundo, três no terceiro e conseguir um cinquinho raso no quarto e último, ele será aprovado. Zero mais dois mais três mais cinco, tudo dividido por quatro, nas minhas contas, dá 2,5. Reprovação inconteste, certo? Errado. Apesar de não ter atingido os vinte pontos, o aluno mostrou um progresso em seu desempenho, está num crescente de aprendizado, reprová-lo agora poderia lhe causar sérios traumas e complexos. Uma reprovação causaria um bloqueio definitivo no aluno. Portanto, o cara com média 2,5 é aprovado com honras e pompas;
- Se apesar de todas essas facilidades, e de muitas outras mais, o aluno ainda conseguir ser reprovado (sim, alguns conseguem tal feito), os seus responsáveis podem entrar com um recurso judicial contra a reprovação na Diretoria de Ensino de sua região. Via de regra, o parecer da Diretoria de Ensino é favorável ao aluno. Jogando na merda todo um ano de trabalho sério de um grupo de professores, pondo em xeque a competência dos mestres e minando de vez as suas já tão anêmicas autoridades.
Leis e parâmetros para criar uma geração de vagabundos e de indolentes, uma geração de frouxos e incapazes, de semianalfabetos felizes com a própria ignorância. O meu estranhamento é com o fato de ainda existirem bons alunos. Dependesse unicamente das leis do ensino, seriam todos delinquentes. E tudo isso embasado e avalizado pela tal Pedagogia, a pseudociência mais nociva e perniciosa de que eu já tive conhecimento.
Agora, me respondam, adiantaria investir milhões e milhões num cenário desses, sem antes mudar esse mal-intencionado pano de fundo? Será que o nosso problema principal é mesmo o financeiro, o da falta de recursos materiais? Não e não. Nosso nó górdio e cego e surdo e mudo não é a falta de recursos fnanceiros, sim de recursos humanos, morais. É a falta de vergonha na cara.
Não precisamos, somente, de mais dinheiro, precisamos de leis mais corretas, rígidas, fundamentadas em valores como a dedicação e o mérito, leis que enalteçam o bom e que eliminem o ruim das salas de aula.
Vamos, enfim, aos números : em Leitura, ocupamos a 59ª posição entre os 70 países avaliados; em Ciências, a 63ª; e em Matemática, a nossa especialidade, a 66ª.
Um resultado péssimo! Mas não, de forma alguma, surpreendente. Surpreso eu estaria se estivéssemos entre os melhores, ou ainda que entre os medianos.
Somos um país de merda. E de merdas. Definitivamente.