quarta-feira, 25 de outubro de 2017

O Cérebro é Foda

Tenho medo de tocar-te 
(mão à tua mão). 
Medo de teus olorentos poros 
Serem ventosas exatamente complementares aos meus. 
Tenho medo de abraçar-te 
(braço a braço, perna à perna). 
Medo dos teus painosos pêlos 
Se encantarem dos meus em persa tapeçaria. 
Tenho medo da tua óptica, 
Da tua mira olhos-laser vagalumeando em meu peito. 
Medo quando tão próxima respiras, 
Quando arfas e deslizas, escorrendo do leito. 
Mas medo mesmo tenho – medo de verdade – ,
Quando falas, 
Quando explicita tuas idéias, quando dizes do teu mundo, 
Num sem-fim de combinações e jogos de palavras 
Tais e quais aos que eu faria 
Caso tivesse coragem de interromper-te 
(nunca faço : sou apenas eu falando por uma boca mais bela). 
É do que tenho mais medo: 
Nossos pensamentos em unidirecional fluxo, 
Nossos rios de serotonina em caudalosa confluência. 
Dos poros, dos pêlos, do leito, 
O paladar, o olfato e o pau logo esquecem. 
O cérebro, não! 
O cérebro é foda!

7 comentários:

  1. Um dos textos mais bonitos que eu pude ler. Sério mesmo.
    "J"

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  2. Seu texto ficou muito bom. "Persa tapeçaria" foi uma sacada absolutamente genial. Mas não resisto a um comentário de caipira careta: o texto é muito bonito, muito elegante, ótimas imagens, mas o pau no final faz lembrar alguém vestindo terno fino mas calçado com tênis ou chinelo. Pode? Claro que pode, o texto é seu e você põe o pau onde quiser (mas longe de mim!), mas fica estranho. Mesmo assim, fica o registro: ficou muito bom.

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  3. De novo, a teoria do poeta sórdido, do inigualável Manuel Bandeira. Quando li "“Vou lançar a teoria do poeta sórdido.
    Poeta sórdido:
    Aquele em cuja poesia há a marca suja da vida.
    Vai um sujeito,
    Saí um sujeito de casa com a roupa de brim branco muito bem engomada, e na primeira esquina passa um caminhão, salpica-lhe o paletó ou a calça de uma nódoa de lama:
    É a vida

    O poema deve ser como a nódoa no brim:
    Fazer o leitor satisfeito de si dar o desespero.

    Sei que a poesia é também orvalho.
    Mas este fica para as menininhas, as estrelas alfas, as virgens cem por cento e as amadas que envelheceram sem maldade.”, deu um estalo : é isso, eu também posso me arriscar em versos, não é preciso, para fazer poesia, falar de florzinhas, de borboletas, de virgens intocáveis.
    Uma provocação : se a J não reclamou ( e até gostou) do pau, acha que vou ligar para a sua estranheza?
    Em tempo e pra finalizar : o que destoa, o tênis ou o terno fino?

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    Respostas
    1. Falando em meu santo nome em vão?! Ou no diabo? Eu acho que o JB ficou sentido que você botou o pau com tudo no final. Eu tô acostumada, gosto do seu pau mesmo. Mexe não, deixa o pau como tá. -É assim, JB, pode causar alguma estranheza, um desconforto, mas acostuma, por fim você acaba gostando, sentindo uma faltaaa.
      "J"

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    2. se você ligasse para a minha estranheza eu ficaria surpreso. O que destoa é o que é incomum em determinado ambiente. pensando bem, meu comentário é que é destoante no seu blog. Quanto à observação da "J", apesar de rolar de rir, mas jamais me acostumaria com a terceira pessoa do presente do indicativo do verbo rolar. Sem chance!

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    3. Nesse caso, nada de estranheza, concordo totalmente com você, Jotabê.
      em tempo : é o destoante que faz a diferença, que dá o tempero, a força (ainda que pouca) pra gente continuar.

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