segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Auto-Ostracismo

Outra idiotice dos tais gregos A.C. e sua abjeta democracia era o ostracismo, posto em prática, segundo eles, para combater a tirania e garantir o regime democrático - na verdade era para manter os privilégios de um pequeno grupo, quando ameaçados por outras classes.
O político que propusesse projetos e votações em benefício próprio, ou que assim parecesse aos manda-chuvas, era candidato ao ostracismo. A assembleia de Atenas se reunia e nomes eram escritos em fragmentos de cerâmica em forma de ostra; aquele que tivesse seu nome citado mais de seis mil vezes era condenado ao ostracismo, um exílio de dez anos. Fora da pólis, ele deixava de ser um cidadão. 
Isso, para mim, não é punição, é prêmio.
Outra estupidez muito grande é achar que o homem só existe na pólis, coisa de grego viado mesmo, que não suporta viver fora da "irmandade". Muito pelo contrário, é só fora da pólis que ele passa a ter chance de exercer sua verdadeira identidade. A pólis lhe imputa um trabalho, família para cuidar, casa para manter, amigos para cultivar, impostos para pagar e mais uma série de obrigações que esmagam o indivíduo, reduzem-no em ser tão-somente mais um dos edifícios, ruas e logradouros da pólis.
Para quem gosta de cheiro de curral e da merda alheia, a pólis é um paraíso. Não existir para a pólis, não ser notado, não ser comparado a nada, não ser invejado, não ser falado, é o sonho do verdadeiro cidadão, do indivíduo livre e pleno; para esses, um exílio para longe do coletivo é o maior presente que ele pode receber.
Funcionário público que sou, a cada cinco anos, se for bem comportado e pouco faltar, e eu sou um bom moço e pouco me ausento de minhas funções, tenho direito a uma licença-prêmio, um período de três meses de descanso. A licença-prêmio pode ser usufruída de várias maneiras, gozada em períodos alternados de quinze dias, um mês, parte em pecúnia, enfim, todas as combinações possíveis para inteirar os três meses.
Pela segunda vez, tirei os três meses de uma só tacada, noventa dias longe do coletivismo burro da pólis. Ainda mais burro nesse ano, já que um grupo de pessoas, sem ter o que fazer da vida, resolveu, oficial e declaradamente, trilhar o caminho da idiotia e levar todo mundo junto, é a ditadura dos idiotas.
No meu caso, nem é licença-prêmio, é licença-merecimento, licença-poética, até.
Far-me-á um bem imenso esse distanciamento da pólis, esse meu auto-ostracismo. Voltarei a ela, claro, paciência, fazer o quê?, mas de modo diferente. Esse meu afastamento fará findar um ciclo, retornarei à pólis mais distante e indiferente a ela do que já sou, esses três meses de vida de ostra servirão para eu romper em definitivo com os todos os vínculos e todos os resquícios de crença que eu ainda possa ter em seu funcionamento; retornarei a ela, e aos dela, como se nela nunca houvesse estado.
Será boa essa minha vida de ostra, caminharei de madrugada, visitarei os sebos da cidade e (re)ouvirei discos antigos. Amanhã, começo. Com o Chico, é claro, e todos os seus LPs da década de 70.

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