terça-feira, 17 de março de 2020

Pequeno Conto Noturno (78)

02:47 h. Rubens, acordado não por pesadelo, ou insônia, ou ansiedade existencial, sim pela velha bexiga a pedir por alívio, lê o e-mail de Selene :
"Rubens, posso passar sem me encontrar com você, sem tomarmos café, sem chocolate e sem cafuné, mas continue a escrever e a me mandar seus contos (como vai você? eu preciso saber da sua vida...). Envie-os para mim envelopados e selados em garrafas esvaziadas da sua bebida púrpura, em forma de recado dobrado em quatro e guardado no meio dos peitos de uma Valquíria, na ogiva de uma estrela cadente teleguiada".

03:13h. Rubens, sabendo que não voltará a pegar no sono, prepara uma dose tripla de vodka-tônica e responde ao e-mail de Selene :
"Doce e sempre túrgida Selene, também posso passar sem te ver, sem café, sem boiarmos à deriva nas bordas de nossa Atlântida, sem sobrevoarmos a velha praça num tapete voador, sem sábados de rock'n'roll, mas, ainda assim, continuar a escrever e a te enviar meus contos?
Achas mesmo que eram de dentro de mim que eles germinavam em rascunhos e supuravam para o papel? Minha adega de bebida púrpura, minhas revoadas de Valquírias, minhas chuvas de meteoros de kryptonita, nunca desconfiaste mesmo de onde vinham?
Achas mesmo que se construíam e zarpavam de dentro de mim?"

04:22 h. Uma chuva, iniciada fina, ganha corpo, relâmpagos e caudalosidade. Isto sim bem pode ter nascido aqui de dentro, pensa Rubens, com outra dose tripla na mão. Desta minha zona de baixa pressão.

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