Há muitos autores de livros hoje em dia. Ainda mais depois do advento da autopublicação digital. Há muita estrela pra pouca constelação.
Porém, escritores da legítima literatura são mais raros que virgem em zona. Conquanto, eles ainda habitam entre nós.
Uma dessas gemas preciosas é o moçambicano Mia Couto. Se você é apreciador de uma leitura de altíssima qualidade, se gosta da realidade salpicada pelo onírico, do presente veiado pela memória, pela mais autêntica prosa em verso, e ainda não conhece Mia Couto, pare tudo agora! Pare com o almoço, com a faxina, com a maratona de séries, com a punheta. E vá atrás de um livro de Mia Couto.
Dele, em minha pequena biblioteca, tenho Terra Sonâmbula, O Último Voo do Flamingo e O Outro Pé da Sereia. Estou a ler agora Um Rio Chamado Tempo, Uma Casa Chamada Terra.
Fala de um sujeito que, tendo partido para a cidade grande em busca do que seu vilarejo não podia lhe oferecer, recebe a notícia da morte do avô e retorna ao seu torrão natal. Contudo, o avô não estava propriamente morto. Estava congelado na existência, com dificuldade de fazer a transição. Como que em animação suspensa, até o Céu e o Inferno decidirem qual lhe será de nova morada. Não estava morto, mas não dava sinais de vida.
O médico/Mia Couto que o assiste define brilhantemente o quadro do progenitor : Ele é um portador assintomático de vida.
Pããããããta que o pariu!!! Que belezura de frase! Só por ela, Mia Couto já merece o Nobel. Muito mais que o Bob Dylan! Cheguei a arrepiar. De verdade, não metaforicamente. Feito gato velho e castrado que eriça o pelo quando os linfócitos da alma cochilam e permitem a ele se lembrar de seus dias de telhados e de luas cheias.
Ler um livro do Mia Couto é como mergulhar na imensidão silenciosa e uterina do mar e, atento, ir catando aqui, ali e acolá essas pérolas verbais.
Mia Couto por Mia Couto : "sou um branco que é africano; um ateu não praticante; um poeta que escreve em prosa; um homem que tem nome de mulher; um cientista que tem poucas certezas na ciência; um escritor numa terra de oralidade".
Em tempo : Antônio Emílio Leite Couto, escritor e biólogo, quando pequeno pediu aos pais que o chamassem de Mia, por gostar muito de gatos.
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